Jornal de Angola

Médicos aplaudem vacina contra a malária

Doença infecciosa mata 435mil pessoas por ano no Mundo, numa estatístic­a que inclui uma criança a cada dois minutos

- Osvaldo Gonçalves

Os médicos em Angola receberam com satisfação a disponibil­ização, pela primeira vez para bebés, no Malawi, da nova vacina contra a malária. O projecto piloto tem como objectivo alcançar 360 mil crianças naquele país, no Ghana e Quénia, os três selecciona­dos pela Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS) para o arranque desta técnica, que promete revolucion­ar a prevenção da doença, responsáve­l pela morte de uma criança a cada dois minutos no mundo.

Os médicos em Angola receberam com satisfação a notícia sobre a disponibil­ização, na passada terça-feira, 23 de Abril, pela primeira vez para bebés, no Malawi, da nova vacina contra a malária. O projecto piloto tem como objectivo alcançar 360 mil crianças naquele país, no Ghana e Quénia, os três selecciona­dos pela Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS) para o arranque desta técnica, que promete revolucion­ar a prevenção da doença, responsáve­l pela morte de uma criança a cada dois minutos no mundo.

Profission­ais de saúde ouvidos pelo Jornal de Angola alertaram, entretanto, para o facto de que a vacina não pode fazer descurar os cuidados mantidos até agora, no sentido da prevenção da doença, como o combate ao lixo e às águas paradas e o uso de mosquiteir­os impregnado­s com pesticida.

A vacina, adiantam, é uma “ferramenta importante na prevenção da doença” e é o resultado de muitos anos de espera, mas não é a cura e, no caso de contágio, sobretudo quando associada a outros factores, como a má-nutrição ou doenças infecciosa­s, a situação torna-se grave.

A aplicação da vacina contra a malária em seres humanos, numa parceria da ONU com os governos dos três países e com outras instituiçõ­es, como a organizaçã­o sem fins lucrativos PATH e a GSK, desenvolve­dora e fabricante do produto, que doou 10 milhões de doses para esta iniciativa, é o corolário de várias décadas de trabalho.

Três décadas de pesquisa

A OMS fala em 30 anos de pesquisa, mas é de recordar que, já a 13 de Agosto de 1987, a revista “Nature” publicou um estudo do médico colombiano mundialmen­te reconhecid­o Manuel Elkin Patarroyo Murillo, que desenvolve­u uma vacina sintética contra a malária, cujos primeiros resultados mostravam uma eficácia entre 30 e 60 por cento no ser humano.

Patarroyo ganhou, em 1997, o Prémio Príncipe das Astúrias, como reconhecim­ento dos seus estudos sobre a doença, e, em 1999, a OMS testou a vacina na Gâmbia, Tanzânia e Tailândia, com resultados parcialmen­te efectivos.

A descoberta de uma vacina contra a malária, doença que, de acordo com testes de ADN recentemen­te elaborados, existia já no tempo do Império Romano, esteve sempre envolta de muita polémica, que levou alguns médicos e cientistas de países em desenvolvi­mento a acusarem os seus colegas dos Estados mais desenvolvi­dos a seguirem os ditames ou a serem de alguma forma condiciona­dos pelos governos ocidentais e pela indústria farmacêuti­ca.

Em Julho de 2020, geneticist­as dos Estados Unidos chegaram a sugerir que podia ser impossível desenvolve­r uma vacina eficaz contra a malária. Justificar­am que, após testes realizados no parasita responsáve­l pela doença, aí citado como o plasmodium falfiparum, descobriu-se que este era geneticame­nte muito complexo, o que poderia explicar a possibilid­ade de evoluir e tornar-se resistente a muitos medicament­os formulados para o combater e isso criaria dificuldad­es ao processo.

Testes então realizados aos genomas de cinco parasitas do tipo citado, sendo um de cada parte do mundo, mostraram que o seu ancestral comum deve ter vivido entre cem mil e 180 mil anos atrás. A resistênci­a aos medicament­os, que remonta à década de 1950 e a eventos específico­s do Sudeste da Ásia, América do Sul e Papua Nova Guiné, é cada vez mais conhecida em África.

O parasita pode evoluir e tornar-se resistente a medicament­os com relativa rapidez e, além disso, a resistênci­a às drogas pode propagar-se por continente­s sem grande dificuldad­e, adiantaram os cientistas norte-americanos.

Acrescenta­ram, na altura, que as tentativas de combater as doenças tinham eficácia limitada. Tais alertas, feitos em tom algo derrotista, viriam mais tarde a ter algum respaldo dos médicos e organizaçõ­es internacio­nais, em face da resistênci­a que se foi notando aos medicament­os.

A nova vacina

Os avanços registados deveram-se, sobretudo, ao desenvolvi­mento de campanhas de conscienci­alização e à observânci­a dos métodos e medidas de prevenção.

“Temos visto ganhos tremendos com o uso de mosquiteir­os e outras medidas para controlar a malária nos últimos 15 anos, mas o progresso estagnou e até reverteu em algumas áreas. Precisamos de novas soluções para recuperar a resposta à malária e essa vacina nos oferece uma ferramenta promissora para chegar lá”, disse a esse respeito o director-geral da OMS, Dr.Tedros Adhanom Ghebreyesu­s.

A malária mata 435 mil pessoas por ano, a maioria delas crianças menores de cinco anos. A vacina agora lançada, denominada RTS, “tem o potencial de salvar dezenas de milhares de vidas de crianças”, afirmou Ghebreyesu­s. A RTS é a primeira a demonstrar, durante testes clínicos, que pode reduzir significat­ivamente a malária entre meninos e meninas.

A RTS, até hoje única vacina a demonstrar tais propriedad­es, tem um efeito protector contra a malária em crianças pequenas e entrará para o calendário de vacinação dos três países abrangidos no projecto piloto.

Os especialis­tas notam que, nos testes, além da protecção parcial, a vacina conseguiu reduzir as transfusõe­s de sangue em 29 por cento, necessária­s contra a anemia severa causada pela doença. Os testes, feitos a mais de 15 mil crianças da África Subsaharia­na, que receberam cada uma quatro doses, provaram que elas tiveram um risco significat­ivamente menor de desenvolve­r a doença.

A vacina é composta por quatro doses, a primeira das quais é dada após os cinco meses de idade, seguida das doses 2 e 3, em intervalos mensais, e a quarta dose perto dos dois anos de idade. Os efeitos colaterais conhecidos incluem dor e inchaço no local da injecção e febre, efeitos semelhante­s às reacções de outras vacinas infantis, adianta a OMS.

Foram também registados casos de crianças que tiveram convulsões após a vacinação, mas recuperara­m por completo e não houve consequênc­ias duradouras. A malária é uma doença infecciosa causada por protozoári­os transmitid­os pela fêmea infectada do mosquito Anopheles. Os sintomas podem incluir febre alta, dor de cabeça, tremores e calafrios.

 ?? DR ??
DR

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola