Oeste-africanos dominam pequeno comércio a retalho
Emigrantes da África Ocidental e Oriental dominam o mercado das lojas de proximidade. Muitos deles estão, contudo, sujeitos a contingências ligadas à primeira dificuldade que encontram em Angola: a legalização
Noventa e cinco em cada cem africanos residentes em Luanda dedicam-se ao comércio a retalho em armazéns, cantinas e padarias, apesar das vicissitudes por que passam para a manutenção dos negócios, como consequência da baixa taxa de legalização migratória, titularidade precária das empresas, assaltos, entre outras situações.
A informação foi avançada ao Jornal de Angola pelo presidente da Acção para o Desenvolvimento dos Jovens Angolanos e Estrangeiros (ADJAE), Tounkara Saidou. A organização congrega representantes das comunidades africanas implantadas no país e tenta actuar como interlocutora junto das autoridades angolanas,
As comunidades mais representativas no país, de acordo com Tounkara Saidou, provêm da Guiné-Conacri, Costa do Marfim, Mali, Eritreia e Etiópia, com comerciantes em maior número dedicados ao negócio retalhista, enquanto uma parte menos significativa está ligada aos armazéns e padarias.
A ADJAE, fundada em 11 de Abril de 2007 e legalizada em 2010, tendo actualmente representações na Huíla, Lunda-Sul, Bengo e Huambo, procura tornar-se parceira de organismos institucionais angolanos, como o Serviço de Migração e Estrangeiros (SME), Governo Provincial de Luanda (GPL) e Delegação Provincial do Ministério do Interior, aos quais os comerciantes africanos oferecem o que chamam de “cooperação”.
Tounkara Saidou afirmou que a associação propõe-se solucionar, com as autoridades, as questões da concessão e actualização de residência migratória, na ausência da qual ficam inviabilizados todos os outros processos, incluindo a possibilidade de trabalhar.
De tão preocupante, a situação leva a que, com alguma frequência, a associação se reúna com as comunidades, para encontrar um consenso que leve à solução das questões da legalização migratória e da formalização dos negócios.
A oferta da ADJAE, já apresentada à Polícia Nacional, consiste no reforço da aproximação com os associados, obtendo maior capacidade na prevenção dos crimes praticados contra os estrangeiros residentes, como assaltos a cantinas e residências, bem como práticas destes que violem as leis angolanas e firam a imagem das comunidades, no que se inclui o desencorajamento das entradas ilegais e o incentivo à legalização.
“Como mantemos contacto com os representantes das comunidades, será mais fácil interagirmos e reforçar a cooperação com o SME”, frisou.
Uma primeira acção desse consenso é a constituição de um cadastro que a ADJAE pretende conduzir em todo o país e que já conseguiu determinar, em Luanda, mil cantinas geridas por africanos. A amostra levou a inferir a estatística mais geral de que 95 por cento dos residentes da África Ocidental e Oriental em Angola trabalha no comércio a retalho.
Trespasse de alvarás
Tounkara Saidou declarou que as consequências da ausência de processos de legalização são prejudiciais para estes comerciantes, que “contornam” essa dificuldade utilizando alvarás comerciais de angolanos que se dispõem a negociá-los, trespassandoos a estrangeiros.
Esta revelação do presidente da ADJAE explica, parcialmente, como estes comerciantes conseguem autorizações para abrir e a manter negócios, podendo levar à conclusão de que resulta mais do tráfico do alvará, do que da sua emissão indevida.
De acordo com Tounkara Saidou, a manutenção de negócios com alvarás trespassados gera uma exposição a custos adicionais, sobretudo quando, como é frequente, na altura da liquidação dos impostos, os titulares dos alvarás receberem os valores dos comerciantes africanos (receosos de frequentar serviços públicos para não denunciarem a permanência ilegal no país), mas não pagarem à Administração Geral Tributária.
Essa prática, lamentou, leva a que as cantinas geridas por comerciantes africanos sejam permanentemente “assediadas”, de forma legítima ou não, por representantes da Polícia Económi- ca e outros órgãos encarregues da conformidade legal nos negócios, gerando multas, altercações e outras indisposições.
Sucedâneos são mais baratos
A implantação bem sucedida das cantinas no mercado está ligada à proximidade das áreas residenciais, mas também aos preços mais acessíveis da oferta nesses estabelecimentos, segundo o presidente da ADJAE.
A estratégia, disse, reside em estabelecer uma oferta baseada em sucedâneos ou bens que produzem os mesmos níveis de satisfação entre os consumidores, mas de marcas menos reputadas que as disponíveis nos supermercados e superfícies comerciais de topo.
A oferta das cantinas, reconheceu Tounkara Saidou, envolve produtos de marcas em processo de afirmação e fidelização, para o que os fornecedores estabelecem preços inferiores aos dos mesmos bens de marcas que já conquistaram o mercado.
Ao invés da África do Sul, Brasil, Portugal, Espanha ou Reino Unido, onde a produção obedece a padrões mais rigorosos, os bens pelos quais optam os donos das cantinas podem ter origem na Guiné-Conacri, Ghana, China ou Indonésia, sendo muitas vezes produzidos com menos critérios, saindo também mais baratos.