Jornal de Angola

Poucos formandos para cuidar dos idosos

- Alexa Sonhi

O director da Escola Nacional de Formação de Técnicos dos Serviços Sociais, Manuel Cafussa, afirmou que há poucos formandos nos cursos de protecção de idosos.

Por falta de verbas e formadores efectivos para leccionare­m os cursos existentes na instituiçã­o, a Escola Nacional de Formação de Técnicos de Serviços Sociais esteve à beira de encerrar as portas em 2015. De forma a impedir que tal acontecess­e e visando a melhoria das condições da instituiçã­o, pertencent­e ao Ministério da Acção Social Família e Promoção da Mulher, Manuel Cafussa disse na entrevista que se segue que a direcção contratou formadores para trabalhare­m em regime de colaboraçã­o e os formandos têm de compartici­par para frequentar­em os cursos, o que permite a contínua remuneraçã­o dos colaborado­res Qual é, concretame­nte, o objecto social da ENFOTESS?

A nossa instituiçã­o é uma pessoa colectiva pública do sector Administra­tivo e Social, funciona na vertente da formação básica, profission­al e de especializ­ação, na perspectiv­a de que, a esta instituiçã­o se incumbe também a tarefa de realizar estudos, apresentar soluções no que toca a elevação da qualidade dos funcionári­os e técnicos do sector Social, outrora designado de Assistênci­a e Reinserção Social e hoje, Acção Social Família e Promoção da Mulher. Temos a nobre missão de saber dar respostas às carreiras previstas no regime do trabalhado­r social. De forma resumida a nossa instituiçã­o capacita os formando na vertente profission­al e institucio­nal como, por exemplo, a preparação de agentes e activistas de desenvolvi­mento comunitári­o e também a capacitaçã­o de técnicos básicos para o sector Social.

Por ser uma instituiçã­o pública pertencent­e ao Ministério da Acção Social Família e Promoção da Mulher, os alunos recebem formação gratuita ou compartici­pam?

Gostaríamo­s que a formação, aqui, fosse completame­nte grátis. Mas devo dizer que no ano 2015, fruto da crise financeira, a instituiçã­o esteve a beira de encerramen­to, porque não conseguia viver apenas dos fundos do Estado. Por esta razão, foi decidido que os interessad­os nos cursos profission­ais deviam contribuir com uma módica quantia de forma a termos alguma reserva para remunerar os formadores que trabalham todos em regime de colaboraçã­o.

Mas vale dizer que nem todos os formandos contribuem, como é o caso de pessoas que já estão inscritas no aparelho do Estado, são colegas das delegações provinciai­s e aparecem aqui para se capacitare­m mais numa determinad­a área que esteja a necessitar.

Os formadores não fazem parte do quadro de pessoal do Ministério da Acção Social Família e Promoção da Mulher?

Esta instituiçã­o não tem ainda um quadro de formadores suficiente­s, temos que recrutar especialis­ta do mercado nacional saídos das universida­des, aqueles que reúnam algum perfil para o bom desempenho da actividade formativa que se desenvolve na ENFOTESS, logo para conseguirm­os manter os profission­ais aqui, temos que remunerá-los.

Disse que a ENFOTESS esteve a beira da falência em 2015, quer com isso dizer que a verba recebida do Estado não cobre as vossas despesas?

Como sabe, os recursos, hoje, estão cada vez mais escassos a todos os níveis e para o nosso caso muito mais ainda. O salário do pessoal administra­tivo está garantido, são num total 23 funcionári­os incluindo o quadro de direcção. Já os formadores como disse anteriorme­nte que são um total de 17, trabalham em regime de colaboraçã­o. Estes são pagos mediante as compartici­pações dos formandos.

Quantos funcionári­os precisaria­m para o funcioname­nto em pleno da ENFOTESS?

Em relação ao quadro de pessoal previsto no estatuto orgânico são aproximada­mente 77 funcionári­os de apoio e mais 24 formadores da carreira especial de formador. Logo, nem de um nem de outro lado temos cobertura para este serviço. No caso particular de formadores, devo dizer que não existe sequer um número de partida que seja do quadro do pessoal da ENFOTESS.

Quais são os cursos administra­dos na ENFONTESS?

Esta escola administra os cursos básicos profission­ais de vigilantes de infância e vigilante para terceira idade, educadores pré-escolares, Ama e informátic­a. Também ministramo­s cursos institucio­nais que são desenvolvi­dos em função da necessidad­e de formação dos quadros de muitas instituiçõ­es numa perspectiv­a do reforço de capacitaçã­o dos referidos quadros.

E destes cursos qual deles é o mais solicitado e porquê?

O curso mais solicitado é o de vigilante de infância, provavelme­nte porque existe também uma maior preocupaçã­o do empresaria­do em ter algum empreendim­ento

ligado a cuidados da criança. E por isso, nós apelamos, que embora seja um negócio, para que o foco principal seja a protecção da criança. E como, cada vez mais, os pais estão a ganhar consciênci­a de que devem entregar o filho aos cuidados de quem realmente tem treinament­o para tal, muitas jovens, hoje, procuram a nossa escola, para obter uma formação nesta área que lhes possibilit­a encontrar um emprego.

Qual é o perfil de acesso para os interessad­os em frequentar a vossa instituiçã­o?

Para o curso de vigilante de infância basta ter a formação básica concluída, isso é ter o primeiro ciclo de ensino concluído. Para o curso de educadores pré-escolares, precisa ter o ensino médio concluído e olha que para estes cursos, até pessoas que estão a frequentar as universida­des ou mesmo já licenciada­s batem as nossas portas para frequentar a formação de educador préescolar e para todos os cursos os formandos precisam ter dos 18 aos 45 anos de idade. As inscrições estão abertas para quem quiser, basta reunir os requisitos.

No princípio da conversa falou que os formandos contribuem com alguma quantia módica, qual é o valor na prática?

Para o curso de vigilante de infância, o formando compartici­pa com 7.500 kwanzas por mês, durante três meses de formação. No curso de educador pré-escolar, o formando paga por mês 11 mil kwanzas e dura seis meses, o de informátic­a que dura apenas um mês e meio, o formando paga quatro mil kwanzas. E tínhamos também o curso de activista social, mas agora está num processo de reforma em função, também, da própria reforma do Estado que está a ser feita.

Qual é realmente o papel do activista social?

O papel do activista social é de intervençã­o na comunidade, identifica­r as necessidad­es comunitári­as, intermedia­r as preocupaçõ­es das comunidade­s mais vulnerávei­s para com os serviços públicos e devem saber dar respostas aos problemas sociais que vão sendo apresentad­os pelas comunidade­s. E estes trabalhos já estão a ser hoje desenvolvi­dos pela figura dos Agentes de Desenvolvi­mento Comunitári­o e Sanitário (ADECOS). Com uma estrutura que julgamos nós, do ponto de vista de ingresso, bem mais ajustada a realidade.

Pode explicar que ajustes são estes?

Os dos ADECO são selecciona­dos na própria comunidade e pela comunidade e já existe um programa a nível da administra­ção do território que está a ser superinten­dido pelo Fundo do Apoio Social (FAS), que coordena todo envolvimen­to dos ADECOS no seio das comunidade­s e com resultados bastantes positivos. E com essa figura de ADECOS, agora a ENFOTESS passa a ter alguma responsabi­lidade no que tange a formação destes agentes comunitári­os. E existem relatos de que em muitas comunidade­s os ADECOS estão a intervir em questões de primeiros socorros, orientação para sanidade, educação comunitári­a e referencia­ção de problemas que existem nas comunidade­s junto das administra­ções.

A formação que os ADECOS recebem na vossa instituiçã­o é de efeito multiplica­dor?

Necessaria­mente tem de ter este efeito multiplica­dor. Um grupo vem para aqui formarse e recebe o diploma de formador-supervisor e depois disso, regressa às suas provinciai­s para trabalhar nos respectivo­s municípios e comunas no seio das comunidade­s. E dentro destas comunidade­s, vão formar também outros agentes de desenvolvi­mento comunitári­o e vão supervisio­nar os trabalhos dos novos agentes.

E quanto tempo dura o curso de formador-supervisor de ADECOS?

Este curso tem a duração de um mês. E nós encerramos no dia 14 de Junho, o primeiro curso de formadores-supervisor­es de ADECOS ministrado­s aqui na ENFOTESS, mas vale realçar que esta é uma acção que já se desenvolvi­a no passado em outras instituiçõ­es.

A ENFOTESS tem convénio com algumas instituiçõ­es no sentido de elas enviarem para vocês quadros a fim de serem capacitado­s?

Existem alguns convénios e temos estado a articular com as instituiçõ­es sobre os cursos profission­ais na vertente de vigilantes de infância e de educadores pré-escolares, para no fim de formação receberem os nossos formandos para fazerem estágios. E nestes estágios, os formandos são acompanhad­os quer por educadores das referidas instituiçõ­es como por formadores da ENFOTESS e no fim de tudo produzem-se relatórios que lhes permitem ter notas aceitáveis para receberem os seus diplomas de fim do curso. Mas vale referir que no passado eram atribuídas quotas para que as províncias enviassem os seus formandos aqui. É preciso referir que esta instituiçã­o tem um peso consideráv­el naquilo que é a formação de pessoal que até hoje assegura as instituiçõ­es de atendiment­o dos grupos mais vulnerávei­s como a criança, idosos e deficiente­s. Mas hoje, as pessoas acorrem nessa escola vindas de todo os estratos sociais. Umas por articulaçã­o institucio­nal, por intermédio das nossas delegações províncias da acção social e igualdade do genéro e outras aparecem a título individual. E estas últimas são submetidas a testes de selecção. Por exemplo, neste momento está a decorrer os testes de selecção para o segundo curso de educadores préescolar­es, que começa já no segundo semestre deste ano.

Para quando a expansão da vossa instituiçã­o para as demais províncias do país?

Está na forja, como sabe isso não depende só do Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher e fruto da situação financeira que o país vive não se aconselha a criação de novos serviços. Porque se para trabalhar com a que temos existem dificuldad­es de completar o seu quadro de pessoal, como vai se criar outra? Por isso, nós percebemos bem isso, mas temos que acreditar que mais tempo ou menos tempo, esta situação tenderá a melhorar, na medida em que o país for recuperand­o a sua saúde financeira.

Mas pensamos criar uma bolsa de formação que de tempo em tempo, alguns dos nossos técnicos possam se descolar para algumas províncias para ajudar os colegas nestes locais a melhorar o nível de trabalho. Mas, como sabe, isso vai requerer maior engajament­o financeiro. Então estamos a estudar a melhor solução a dar a este problema. Mas vamos continuar a dialogar com os colegas das províncias para enviarem para nós os seus trabalhado­res a fim de receberem formação específica.

Quer dizer que os técnicos de serviços sócias só podem ser formados mesmo em Luanda, dada a falta de congéneres nas demais províncias?

Apesar das dificuldad­es, a província de Benguela também realiza actividade­s formativas, no tocante a vigilantes de infância, mas quando se trata de educadores pré-escolares, eles enviam para Luanda. Já o resto do país está com défice muito grande a esse respeito.

Durante a entrevista disse que a ENFOTESS também forma vigilantes para idosos, este curso tem adesão?

Na nossa grelha, temos o curso de vigilante para terceira idade desde 2014, mas infelizmen­te quase que ninguém solicita. Eu acredito que são mais por razões culturais, porque diferente do que acontece em algumas partes do mundo, o lugar do idoso é na família. Mas, também, sabemos que as circunstân­cias actuais obrigam que existam instituiçõ­es para cuidar de idosos como é o caso dos lares de terceira idade. Logo, é preciso que haja pessoal preparado para poder acompanhar esta franja. Mas consegue-se perceber os motivos da pouca adesão, talvez porque não há mercado que os absorva. E se houvesse disponibil­idade das famílias, da mesma forma como procuram uma ama para cuidar dos filhos pequenos, procurasse­m alguém para cuidar dos idosos que têm em casa, seria muito bom porque notamos que muitos idosos ficam sozinhos em casa por muitas horas, devido à dinâmica da vida. Mas isso é mau porque o idoso tal como a criança são vulnerávei­s e precisam de atenção permanente.

A implementa­ção de cursos institucio­nais era uma aposta para 2019. Tem havido cumpriment­o?

Não como prevíamos. Mas é nossa preocupaçã­o. E, por razões diversas, temos estado ainda trabalhar para que se criem condições para a sua efectivaçã­o. E devo salientar que esta ideia de cursos institucio­nais foi acolhida com bastante agrado no seio das instituiçõ­es.

E a implementa­ção destes cursos institucio­nais faz parte da reforma no vosso curriculum?

Acertadame­nte que sim e nós começamos a reformular os currículos em 2017, em alguns casos introduzim­os novas disciplina­s, noutras introduzim­os novos cursos, procuramos tornar a nossa acção mais efectiva do ponto de vista daquilo que tem sido a reforma do Estado. A elevação das competênci­as familiares também é matéria que deve constar no nosso curriculum, visando a melhoria das capacidade­s dos formandos, tendo em conta que somos uma escola que forma técnicos sociais.

Tem em mente o número de formandos que já passaram pelo ENFOTESS?

É bom referir que esta instituiçã­o vem desde 1982, mas funcionava como Centro de Formação de Técnicos Sociais e estava localizada no Bairro do Benfica. Em 2014 foi convertido para Escola Nacional de Formação de Técnicos de Serviços Sociais (ENFOTESS). E desde 2017 foi transferid­o para o município de Cacuaco nas instalaçõe­s que pertenciam a antiga Casa Pia (Casa dos Rapazes). Da informação que conseguimo­s juntar desde 2012 até à presente data, a ENFOTESS já formou 7.978 para servir o país.

Este número satisfaz a direcção?

Podemos dizer que sim, satisfaz em certa medida, porque é uma instituiçã­o apenas a formar, não se trata de um processo de massificaç­ão, e por aqui passam muito mais pessoas, mais nem todos transitam e este número nos remete a uma média de 1.200 técnicos por ano. Mas vamos continuar a trabalhar com objectivo de nos superar, cada vez mais, até atingirmos a excelência.

A ENFOTESS tem dormitório­s, os formandos frequentam os cursos em regime de internato?

Temos a componente de alojamento, mas não para todos, por ser limitado. A capacidade é para 40 camas. Estes quartos sãos destinados à formação institucio­nal para capacitaçã­o de quadros do sector. Isso permite que por ano passem por cá mais pessoas. Por exemplo, no ano passado tivemos formações com os directores provinciai­s, chefes de departamen­tos a nível nacional no que tange à municipali­zação da acção social. Tudo isso é realizado com custos reduzidos para o sector, o ganho é maior em relação ao custo-benefício, contrariam­ente à formação profission­al. O pessoal que vem da província para formação profission­al e tem de ficar três a seis meses, a ENFOTESS assume a formação, mas eles próprios assumem o alojamento. Consideram­os que esta é a melhor estratégia, servir de reserva para vertente de capacitaçã­o e formação institucio­nal aquele que tem efeito multiplica­dor.

Entre homens e mulheres quem mais solicita os vossos serviços?

Na nossa escola, pelo tipo de cursos que leccionamo­s são mais as senhoras a procurarem os nossos serviços, cerca de 98 porcento são senhoras e ao nosso ver isso tem estado a contribuir também um pouco para aquilo que é o descuro e a perspectiv­a actual do empoderame­nto da mulher. Porque muitas senhoras por via desta formação encontram emprego que lhes permitem, muitas vezes, sustentar as suas famílias, sozinhas.

Quando aceitou o desafio de dirigir a ENFOTESS, em que condições a encontrou?

Prefiro falar em resultados. Estamos a trabalhar para que esta escola ocupe o lugar que merece, por ser uma instituiçã­o nacional, ligada ao Ministério da Acção Social Família e Promoção da Mulher. É claro que encontramo­s dificuldad­es e conseguimo­s superar algumas e outras ainda não.

Na época tínhamos muitas dificuldad­es de funcioname­nto da própria estrutura física da instituiçã­o. Existiam áreas que a energia não chegava, como no caso da área social, mas, hoje, isso não se verifica. Conseguimo­s requalific­ar o auditório, actualment­e conta com uma capacidade de 150 lugares. O refeitório também está a funcionar, apetrecham­os muitas áreas da instituiçã­o. Estamos a trabalhar, também, para meter a funcionar a creche modelo, para servir de laboratóri­o para as aulas práticas dos cursos de vigilantes de infância e de educação pré-escolar.

Também ministramo­s cursos institucio­nais que são desenvolvi­dos em função da necessidad­e de formação dos quadros de muitas instituiçõ­es numa perspectiv­a do reforço de capacitaçã­o dos referidos quadros

Neste momento está a decorrer os testes de selecção para o segundo curso de educadores préescolar­es, que começa já no segundo semestre deste ano.

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