Jornal de Angola

Mulher fala das peripécias para ex-marido assumir a paternidad­e

O caso de fuga à paternidad­e está no Tribunal de Família e é do conhecimen­to da Provedoria de Justiça, desde 2015, mas até agora não há nenhum resultado

- Edivaldo Cristóvão

Celma Gomes, 36 anos, deslocou-se propositad­amente ao auditório do Liceu 14 de Abril, no Kilamba, onde decorria um encontro sobre “Os Mecanismos de Protecção da Criança na Família”, realizado pela Provedoria de Justiça, em parceria com o PNUD, para apresentar o seu testemunho sobre as agressões físicas de que foi vítima do ex-esposo, António Gonçalves, durante três anos, e das voltas que este tem dado para registar os próprios filhos.

Celma Gomes disse que foi obrigada a separar-se do pai dos filhos, com quem viveu seis anos, no bairro Uíge, na Petrangol, Distrito Urbano do Sambizanga, por causa de agressões físicas e ameaças de morte, numa altura em que se encontrava em estado de gestação e com uma criança ao colo, porque o homem “pegava sempre numa faca”.

“Ele parecia ser uma pessoa que agia sob efeito de drogas. Desde a nossa separação, não consigo registar os meus filhos, porque ele anda desapareci­do. Não sei nada da vida dele”, desabafou. Celma Gomes vive, neste momento, em casa da mãe, na Centralida­de do Kilamba, sem emprego e para garantir o sustento dos filhos procura fazer pequenos negócios de ocasião.

A jovem revelou que o caso de fuga à paternidad­e está no Tribunal de Família e com conhecimen­to da Provedoria de Justiça, desde 2015, mas até agora não obteve nenhum resultado. Naquele dia, Celma foi aconselhad­a a contratar um advogado para regulariza­r o processo, para dar maior dignidade às crianças, com idades compreendi­das entre os cinco e oito anos.

Segundo Celma, a falta de registo de nascimento pode condiciona­r o ingresso do mais pequeno na escola, no próximo ano lectivo.

Pais bem posicionad­os

O director-geral do INAC, Paulo Kalesi, presente no encontro, disse que os números de fuga à paternidad­e sobem, cada vez mais, no país, apontando que a maior parte dos casos é praticada por cidadãos que têm emprego e que estão bem posicionad­os socialment­e.

“Muitos deles chegam a abandonar o emprego para não sustentare­m os filhos”.

A fuga à paternidad­e constitui um dos principais factores de violência contra a criança no país, disse o director-geral do INAC, revelando que no primeiro semestre deste ano foram registados cerca de dois mil casos, dos quais mais de 700 estão ligados a este fenómeno.

Peulo Kalesi reconheceu que grande parte dos casos de violência contra a criança ocorre no seio da família, onde se têm registado cenas de maus-tratos, acusação de práticas de feitiçaria, trabalho infantil e abusos sexuais.

Paulo Kalesi apontou a negligênci­a dos familiares que as colocam em situações de risco com as próprias instituiçõ­es que concorrem para a protecção da criança, destacando pessoas ligadas a esses organismos, que também começam a maltratá-las. “Registamos o caso de uma criança que foi abusada por um agente da Polícia Nacional, já a contas com a justiça, bem como de pastores de igrejas que também abusam sexualment­e menores”, denunciou.

Papel da Provedoria

O provedor de Justiça, Carlos Alberto Ferreira Pinto, realçou, no encontro, que a família, como núcleo fundamenta­l da sociedade, deve ser objecto de protecção de qualquer Estado, seja qual for a natureza da sua Constituiç­ão, contribuin­do para a educação, ensino e a saúde da criança.

Como garante da salvaguard­a dos direitos, das liberdades e das garantias fundamenta­is, a Provedoria de Justiça tem um papel importante e, em primeira instância, constitui um mecanismo de protecção da criança, quer esteja em casa, na escola, na sociedade, quer esteja na família.

“Ele parecia de ser uma pessoa que agia sob efeito de drogas. Desde a nossa separação, não consigo registar os meus filhos, porque ele anda desapareci­do. Não sei nada da vida dele”

“Registámos o caso de uma criança que foi abusada por um agente da Polícia Nacional, já a contas com a Justiça, bem como de pastores de igrejas que também abusam sexualment­e de menores”

 ?? MARIA AUGUSTA | EDIÇÕES NOVEMBRO ?? A sociedade civil tem realizado várias manifestaç­ões a favor da protecção da criança contra todos os tipos de violência
MARIA AUGUSTA | EDIÇÕES NOVEMBRO A sociedade civil tem realizado várias manifestaç­ões a favor da protecção da criança contra todos os tipos de violência

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