Não se pode fazer da Igreja uma fonte de enriquecimento
Temos o programa de acção virado para o combate à violência baseada no género. Abordamos também o “Clube de Paz” em determinadas escolas, sendo uma ideia que gostaríamos de desenvolver e acertar com o Ministério da Educação. Mas que não tem sido fácil. Temos ainda o programa de boa governação e monitoria social, onde elaboramos relatórios com a presença das entidades governamentais, sociedade civil e embaixadas. A nossa linha de actuação abrange alterações climáticas, acções de combate à malária, febre amarela e Sida, os quais são discutidos mensalmente entre os pastores e grupos de mulheres da Igreja. Trabalhamos também num programa de luta contra a corrupção. Cada pastor leva depois a mensagem às comunidades
Deolinda Dorcas Tecas, voz autorizada quando a abordagem é a religião em Angola, considerou de psicopatas pastores que se valem do cargo para assediar sexualmente as crentes. O caso mais recente aconteceu no Calemba 2, com um pastor de 43 anos, proveniente do Congo Democrático, agora solto pelo Ministério Público, que engravidou uma menor de 16 anos. A também secretária do Conselho de Igrejas Cristãs em Angola (CICA) considera que a falta ou insuficiente formação potencia comportamentos desviantes, como o uso da Bíblia para extorquir a população
Qual o posicionamento do CICA sobre os pastores que violam sexualmente as crentes, sobretudo menores de idade?
Temos conhecimento de que tal tem acontecido com supostos pastores. São situações que chocam a comunidade angolana e cristã, uma vez que esta figura só assume o protagonismo que tem em nome da própria comunidade cristã. É necessário olharmos primeiro para o chamado. Existem pastores que passam por uma formação teológica, bíblica e que são chamados por Deus para exercer uma função na Igreja. Mas é bem verdade que existem outros que não sentem e nem são chamados por Deus, mas exercem o ministério pastoral. Esses que não são chamados tendem a exercer a carreira pastoral sem dom, nem talento. É importante distinguirmos os que são chamados dos que não são. Infelizmente, estes últimos também exercem a actividade pastoral.
Se alguns não têm dom nem talento, como são consagrados para exercer a actividade?
Muitos não são consagrados na Igreja, em público, mas sim em casa, na companhia de amigos. As pessoas realmente consagradas para a actividade pastoral encaram este acto com responsabilidade, rigor e lealdade. No acto da consagração, sentem-se voltadas para o chamado. Muitas vezes é um amigo que consagra o dito pastor, porque o mesmo sabe orar, pregar ou interpretar um pouco a palavra de Deus. Há o entendimento de que com isso já deve ser pastor. Infelizmente, estamos a viver esta superficialidade de muitos sobre a consagração. O indivíduo consagrado para o serviço da Igreja é aquele que se sente entregue de corpo e alma para o Senhor, ao serviço das comunidades.
O que tem estado na base no desvio comportamental de pastores?
Muitos deles não são educados bíblica e teologicamente. A falta de formação tem provocado este tipo de desvio de comportamento. Isso acontece também quando, na base familiar, não existe o temor a Deus. Os filhos não obedecem aos pais e o indivíduo cresce e vive de forma livre, sem o sentimento do cordão umbilical com os membros da família. Nestes casos, ao assumir a responsabilidade de dirigir uma igreja, esse indivíduo não será temente a Deus.
Comoexplicaoscasosdeviolação de menores por pastores?
Lamentavelmente, são desvios comportamentais que merecem uma certa atenção de pastores iguais e de psicólogos ao nível do país, para se compreender as causas que levam ao cometimento de tais actos. É importante que se faça um estudo profundo sobre isso. O pastor ungido, consagrado e que recebe a unção do Espírito Santo, terá sempre o carácter orientado a primar para o bem das pessoas.
Entretanto são vários casos...
Podemos dizer que este pastor está doente; é um psicopata, é anormal. É um adulto que deve relacionar-se com alguém adulto, de forma convencional, conquistando a pessoa da sua idade e personalidade. Violar, drogar e abusar sexualmente de uma menor são práticas anormais.
Ao nível do CICA têm conhecimento de assuntos do género?
Graças a Deus, não. Recentemente, no nosso Comité Executivo, realizámos palestras onde abordámos a forma como o pastor deve encarar a ética cristã. Por via dos órgãos de Comunicação Social e das redes sociais, ficamos a saber que alguns pastores conseguem mesmo desfazer relações familiares, prometendo outro parceiro ou parceira. Nós não temos mandato para desfazermos os lares, mas sim para unir e incentivar ao amor e à cultura do diálogo, onde houver conflito.
Até que ponto a condenação de pastores por crimes sexuais mancha o bom nome da Igreja?
Infelizmente, quando um pastor comete adultério, rouba ou viola, apesar do acto ser cometido de forma individual, há sempre o poder de influenciar a mente e a personalidade dos outros. É lamentável e nos sentimos todos ofendidos, quando assim acontece, porque o pastor é a autoridade moral e espiritual que deve ter comportamento e atitude aceitáveis dentro e fora da igreja.
Também há o problema de pastores criarem igrejas para a obtenção do lucros?
É verdade e temos notado essa realidade nos últimos tempos, o que lamentamos. Fazer do ministério pastoral fonte de sustentabilidade é contrário aos nossos desígnios. A Igreja é o espaço onde os pastores, padres, bispos, evangelistas, diáconos são chamados para servir, segundo os mandamentos bíblicos. O próprio Jesus Cristo veio para servir e não para ser servido.
Diante desta realidade, o que aconselha aos pastores e fiéis?
É importante que exista a ordem dos pastores. Por exemplo, ao nível do CICA, existe a Associação Fraterna dos Pastores, onde há encontros mensais, nos quais se abordam determinados temas, reforçando o diálogo. Este espaço é para reflexão, permitindo voltar-nos para nós mesmos. Aqui, analisamos as funções do pastor e o seu comportamento na Igreja, na família e na sociedade, reforçando o diálogo