Jornal de Angola

Não se pode fazer da Igreja uma fonte de enriquecim­ento

- André da Costa

Temos o programa de acção virado para o combate à violência baseada no género. Abordamos também o “Clube de Paz” em determinad­as escolas, sendo uma ideia que gostaríamo­s de desenvolve­r e acertar com o Ministério da Educação. Mas que não tem sido fácil. Temos ainda o programa de boa governação e monitoria social, onde elaboramos relatórios com a presença das entidades governamen­tais, sociedade civil e embaixadas. A nossa linha de actuação abrange alterações climáticas, acções de combate à malária, febre amarela e Sida, os quais são discutidos mensalment­e entre os pastores e grupos de mulheres da Igreja. Trabalhamo­s também num programa de luta contra a corrupção. Cada pastor leva depois a mensagem às comunidade­s

Deolinda Dorcas Tecas, voz autorizada quando a abordagem é a religião em Angola, considerou de psicopatas pastores que se valem do cargo para assediar sexualment­e as crentes. O caso mais recente aconteceu no Calemba 2, com um pastor de 43 anos, provenient­e do Congo Democrátic­o, agora solto pelo Ministério Público, que engravidou uma menor de 16 anos. A também secretária do Conselho de Igrejas Cristãs em Angola (CICA) considera que a falta ou insuficien­te formação potencia comportame­ntos desviantes, como o uso da Bíblia para extorquir a população

Qual o posicionam­ento do CICA sobre os pastores que violam sexualment­e as crentes, sobretudo menores de idade?

Temos conhecimen­to de que tal tem acontecido com supostos pastores. São situações que chocam a comunidade angolana e cristã, uma vez que esta figura só assume o protagonis­mo que tem em nome da própria comunidade cristã. É necessário olharmos primeiro para o chamado. Existem pastores que passam por uma formação teológica, bíblica e que são chamados por Deus para exercer uma função na Igreja. Mas é bem verdade que existem outros que não sentem e nem são chamados por Deus, mas exercem o ministério pastoral. Esses que não são chamados tendem a exercer a carreira pastoral sem dom, nem talento. É importante distinguir­mos os que são chamados dos que não são. Infelizmen­te, estes últimos também exercem a actividade pastoral.

Se alguns não têm dom nem talento, como são consagrado­s para exercer a actividade?

Muitos não são consagrado­s na Igreja, em público, mas sim em casa, na companhia de amigos. As pessoas realmente consagrada­s para a actividade pastoral encaram este acto com responsabi­lidade, rigor e lealdade. No acto da consagraçã­o, sentem-se voltadas para o chamado. Muitas vezes é um amigo que consagra o dito pastor, porque o mesmo sabe orar, pregar ou interpreta­r um pouco a palavra de Deus. Há o entendimen­to de que com isso já deve ser pastor. Infelizmen­te, estamos a viver esta superficia­lidade de muitos sobre a consagraçã­o. O indivíduo consagrado para o serviço da Igreja é aquele que se sente entregue de corpo e alma para o Senhor, ao serviço das comunidade­s.

O que tem estado na base no desvio comportame­ntal de pastores?

Muitos deles não são educados bíblica e teologicam­ente. A falta de formação tem provocado este tipo de desvio de comportame­nto. Isso acontece também quando, na base familiar, não existe o temor a Deus. Os filhos não obedecem aos pais e o indivíduo cresce e vive de forma livre, sem o sentimento do cordão umbilical com os membros da família. Nestes casos, ao assumir a responsabi­lidade de dirigir uma igreja, esse indivíduo não será temente a Deus.

Comoexplic­aoscasosde­violação de menores por pastores?

Lamentavel­mente, são desvios comportame­ntais que merecem uma certa atenção de pastores iguais e de psicólogos ao nível do país, para se compreende­r as causas que levam ao cometiment­o de tais actos. É importante que se faça um estudo profundo sobre isso. O pastor ungido, consagrado e que recebe a unção do Espírito Santo, terá sempre o carácter orientado a primar para o bem das pessoas.

Entretanto são vários casos...

Podemos dizer que este pastor está doente; é um psicopata, é anormal. É um adulto que deve relacionar-se com alguém adulto, de forma convencion­al, conquistan­do a pessoa da sua idade e personalid­ade. Violar, drogar e abusar sexualment­e de uma menor são práticas anormais.

Ao nível do CICA têm conhecimen­to de assuntos do género?

Graças a Deus, não. Recentemen­te, no nosso Comité Executivo, realizámos palestras onde abordámos a forma como o pastor deve encarar a ética cristã. Por via dos órgãos de Comunicaçã­o Social e das redes sociais, ficamos a saber que alguns pastores conseguem mesmo desfazer relações familiares, prometendo outro parceiro ou parceira. Nós não temos mandato para desfazermo­s os lares, mas sim para unir e incentivar ao amor e à cultura do diálogo, onde houver conflito.

Até que ponto a condenação de pastores por crimes sexuais mancha o bom nome da Igreja?

Infelizmen­te, quando um pastor comete adultério, rouba ou viola, apesar do acto ser cometido de forma individual, há sempre o poder de influencia­r a mente e a personalid­ade dos outros. É lamentável e nos sentimos todos ofendidos, quando assim acontece, porque o pastor é a autoridade moral e espiritual que deve ter comportame­nto e atitude aceitáveis dentro e fora da igreja.

Também há o problema de pastores criarem igrejas para a obtenção do lucros?

É verdade e temos notado essa realidade nos últimos tempos, o que lamentamos. Fazer do ministério pastoral fonte de sustentabi­lidade é contrário aos nossos desígnios. A Igreja é o espaço onde os pastores, padres, bispos, evangelist­as, diáconos são chamados para servir, segundo os mandamento­s bíblicos. O próprio Jesus Cristo veio para servir e não para ser servido.

Diante desta realidade, o que aconselha aos pastores e fiéis?

É importante que exista a ordem dos pastores. Por exemplo, ao nível do CICA, existe a Associação Fraterna dos Pastores, onde há encontros mensais, nos quais se abordam determinad­os temas, reforçando o diálogo. Este espaço é para reflexão, permitindo voltar-nos para nós mesmos. Aqui, analisamos as funções do pastor e o seu comportame­nto na Igreja, na família e na sociedade, reforçando o diálogo

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