Privatizações vão pagar atrasados
Nesta primeira entrevista concedida à imprensa depois de investida no cargo, a titular do pelouro das Finanças fala das negociações que conduz com representantes da alta finança internacional em Washington, onde lidera a participação angolana nas reuniões
Está em Washington para chefiar uma delegação do Governo às reuniões anuais do Banco Mundial e FMI: qual é exactamente a vossa agenda e objectivos? Vamos participar num conjunto de reuniões estatutárias uma vez que Angola é membro do FMI e BM e, nesta conformidade, temos direito de voto em várias matérias. Como governador, Angola tem de participar e estamos aqui na qualidade de membros e, nessas reuniões, vamos apreciar os documentos que são submetidos à consideração dos membros. Paralelamente a isso, temo-nos desdobrado em outras reuniões com os nossos parceiros para analisar o andamento das carteiras de projectos e acordos de financiamento que estão assinados e por assinar com instituições como o Banco Mundial, o Banco Africano de Desenvolvimento e a Corporação Financeira Internacional (IFC).
Em que consiste essa cooperação com o IFC?
Ontem, por exemplo, realizamos uma reunião muito produtiva com o IFC que, como sabem, vai abrir escritórios em Luanda, em Novembro, e estamos muito entusiasmados com este facto, porque o IFC é o braço do Banco Mundial para o sector privado. De modo que, termos o IFC fisicamente presente em Angola, é mais uma ferramenta para potenciar a participação do sector privado na dinamização da economia e no crescimento económico. Já acertamos a agenda para, quando a delegação do IFC for inaugurar a representação, podermos fazer uma reunião longa de trabalho para rapidamente concretizarmos alguns projectos. Participamos em encontros que são, no fundo, um convite aos investidores privados não residentes para irem a Angola analisar as oportunidades de investimento e, por isso, partilhamos com eles o quadro macroeconómico, as conquistas que já tivemos, os desafios que ainda temos de enfrentar e temos que partilhar com eles um quadro transparente para que quando tomarem as decisões de investimento, tomem em sã consciência e estejam preparados para enfrentar estes desafios. As oportunidades são imensas, mas existem enormes desafios e vamos trabalhar para os remover. Podemos e devemos trabalhar em dupla velocidade: enquanto vamos trabalhando nas reformas necessárias para melhorar os indicadores macroeconómicos, temos também de identificar qual o espaço que existe para que o investimento privado entre e se consolide e vá contribuindo para o crescimento económico e conseguirmos assim almofadar os constrangimentos.
Os investidores norte-americanos continuam a mostrar grande preocupação em relação ao repatriamento de dividendos: como é que o Governo está a tratar essa questão?
O BNA, que é o organismo com responsabilidade directa nesta matéria, submeteu à apreciação da Comissão Económica do Conselho de Ministros uma proposta de aviso que visa flexibilizar parcialmente a conta capital, ou seja, tornar mais ágil o processo de entrada e saída de capitais de investidores não residentes. Essa proposta de aviso foi aprovada, de modo que, agora, a sua implementação dependerá da agenda do Banco Nacional de Angola, mas acredito que está para breve. Feito isso, eu acredito que essa preocupação diminui consideravelmente. Obviamente que a implementação da lei é sempre diferente do diploma idealizado. Depois do aviso estar publicado, iremos testar para ver o que acontecerá de facto. Se as medidas que estão a ser propostas irão permitir que o fluxo de entradas e saídas ocorra com maior facilidade, mas caso ainda haja obstáculos, iremos reavaliar e pensar noutras soluções.
Durante a sua intervenção no fórum económico sobre Angola falou sobre as privatizações. Masquebenefíciospoderáhaver?
Todas as oportunidades são boas para partilhar alguma informação sobre o programa de privatizações. É um programa ambicioso e acreditamos nós que vai trazer grandes vantagens para o país, uma vez que pretende mobilizar o sector privado para este crescimento. O grupo de 195 empresas está dividido basicamente em dois subgrupos: um subgrupo de empresas e activos que estão ociosas. Nalguns casos estão paradas. Noutros casos trabalham abaixo do seu óptimo e por isso não empregam muita gente, não produzem grande coisa e logo não geram lucros para elas próprias nem receita fiscal para o Estado. Para este grupo é inequívoco que concursos bem feitos, investidores bem escolhidos e tudo feito com transparência haverá benefícios, identificando-se as pessoas certas para operacionalizar estas empresas. Temos aqui um grande espaço.
E qual é o outro grupo?
Há um outro subgrupo que funciona. Algumas são de dimensão relevante, com mão de obra considerável e para estas iremos analisar caso a caso. Atenção que, constar no programa de privatizações, não significa que estas empresas vão ser alienadas integralmente. Pode ser 5,00, 10 ou 50 por cento. Essa decisão ainda não foi tomada. A decisão que foi tomada foi a de que, para algumas empresas, queremos mobilizar capital adicional e proveniente do sector privado. É natural que nalguns casos o Estado pretenda continuar a manter a maioria no capital dessas empresas e ai vai depender muito da visão estratégica para o sector, o papel social da empresa e um conjunto de critérios serão considerados para tomar-se a decisão final da percentagem que vai culminar com o plano de privatização para aquela empresa, que também terá de ser publicado em Diário da República. O programa foi aprovado no seu todo, mas agora terá de ser planificado e publicado no que tange a cada uma das empresas.
Comoserãoutilizadososrecursos arrecadados das privatizações?
São três principais objectivos: um é ajudar a financiar as infra-estruturas necessárias para que essas empresas que estão a ser privatizadas funcionem sem obstáculos em sectores como energia, transportes, águas. De tal sorte que possam ajudar a financiar infra-estruturas de suporte ao financiamento da actividade dessas empresas.
Um segundo objectivo que é o de ajudar a financiar a reestruturação da actividade dessas empresas, pois algumas delas não estão em condições de ser vendidas tal como estão hoje e, então, exigirão ainda um financiamento para a sua reestruturação como a legalização jurídica, avaliação patrimonial e organização contabilística, pois tudo isso tem os seus custos. Estamos a contar usar parte dos recursos das privatizações que forem ocorrendo para financiar as demais privatizações. Assim, o programa se torna auto-financiado. Um terceiro objectivo é o de regularizar dívidas do Governo central. Queremos, mais uma vez, transferir liquidez para o sector privado e assegurar que o mercado avance com um ambiente de concorrência, porque se privatizarmos sem assegurar que dívidas que o Estado tenha com as empresas ainda estejam pendentes de regularização, temos aqui um risco de ver o surgimento de monopólios. Então, temos que assegurar que todo o sector privado avança em igualdade de circunstâncias. Por isso é que esta da regularização dos atrasados do Estado é bastante importante.