Invasão turca ameaça provocar crise na NATO
A ofensiva militar na Síria, a terceira desde 2016, iniciada a 9 de Outubro, coincide com as tensões sobre a compra pela Turquia do sofisticado sistema de mísseis russos S400
A invasão turca do norte da Síria e as subsequentes críticas dirigidas a Ancara por parceiros da NATO ameaçam provocar uma crise na maior aliança militar do mundo, mas é improvável que resultem numa expulsão da Turquia, defendem analistas.
Citados pela agência noticiosa Associated Press, os especialistas recordam que a aliança, de 29 Estados-membros, já atravessou outros momentos de tensão sem se desintegrar, como a crise do Canal do Suez em 1956, a decisão da França abandonar a estrutura de comando militar em 1967 ou a fractura entre os aliados durante a invasão do Iraque em 2003.
No entanto, nenhum país abandonou a organização ou foi forçado a sair.
Para mais, a Turquia é de enorme importância estratégica para a NATO, e os dirigentes de Ancara estão conscientes disso. O grande país muçulmano é o guardião do estreito do Bósforo, uma ligação vital entre a Europa, o Médio Oriente e a Ásia central, e constitui a única via de entrada e saída para o mar Negro, onde está estacionada uma frota naval da Rússia.
A Turquia é o segundo maior exército da NATO, após os Estados Unidos, e a permanência do país no interior da organização tem contribuído para apaziguar as tensões históricas com a vizinha e “aliada” Grécia.
Os aliados da NATO também consideram a base de Incirlik, no sudeste da Turquia, decisiva como ponto de partida para alcançar o Médio Oriente.
“Para ser honesta, penso que é melhor ter a Turquia dentro da NATO do que fora da NATO. Penso que é importante mantê-la na nossa família e nas discussões , mas não nos podemos comportar como se nada tivesse acontecido”, considerou, na terça-feira, a primeira-ministra norueguesa, Erna Solberg.
Desde há algum tempo que a Turquia tem vindo a testar a paciência dos parceiros ocidentais. A ofensiva militar na Síria, a terceira desde 2016, iniciada a 9 de Outubro, coincide com as tensões sobre a compra pela Turquia do sofisticado sistema de mísseis russos S400, que, segundo os comandos aliados, ameaça a segurança da organização e a eficácia dos novos aviões de combate norteamericanos F-35.
O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ordenou a detenção ou expulsão de milhares de oficiais das Forças Armadas na sequência do fracassado golpe de Julho de 2016 e alguns procuraram, e foilhes concedido, asilo em países da NATO. “Até ao momento, trata-se do maior desafio político-militar enfrentado pela Aliança”, considerou ontem, Ian O. Lesser, vice-presidente do instituto norte-americano German Marshall Fund, citado pela Associated Press.
“Obviamente, trata-se de uma questão existencial. Não pode ser comparada com o processo de dissuadir a Rússia em locais como os Bálticos ou em redor do mar Negro. Mas, em termos de crise política no interior da Aliança, e potencialmente uma crise de segurança, está muito, muito elevada na agenda”, afirmou.
Até ao momento, o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, tem pedido contenção à Turquia e alertado para que evite um novo desastre humanitário, em particular após um milhão de sírios já ter entrado na Europa nos últimos anos.
Stoltenberg exortou Ancara a focalizar-se no inimigo comum da NATO, o grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico , quando existem informações sobre a fuga de prisões de alguns dos seus combatentes na sequência da ofensiva turca.
No entanto, pelo menos em público, o chefe dos aliados não apelou a um cessar-fogo.
Stoltenberg tem evitado qualquer crítica pública à Turquia ou a qualquer outro Estado-membro e recordou que a Aliança não desempenha qualquer função na Síria, à excepção da sua contribuição na vigilância, a partir do exterior, do tráfego aéreo sobre o país.