Jornal de Angola

Queremos construir com África parcerias justas

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Vladimir Putin considera que a Cimeira Rússia-África, que se realiza hoje e amanhã, na cidade de Sochi, é um ponto de partida para a construção de parcerias justas, baseadas na igualdade de direitos e no interesse mútuo. "Pretendemo­s discutir ideias com os parceiros, sistematiz­á-las e, de forma concreta, incluí-las na declaração final", disse o Presidente russo em entrevista à agência TASS. Sublinhou que o seu país e os Estados africanos estão ligados por relações "tradiciona­lmente amigáveis" e lembrou o apoio soviético à luta de libertação do continente. A Cimeira de Sochi visa abrir um novo capítulo nas relações entre a Rússia e os países africanos. O que é que a Rússia pode oferecer aos Estados do continente? Qual é a principal vantagem competitiv­a que apresentar­á aos chefes das delegações?

A Rússia e os Estados africanos estão ligados por relações tradiciona­lmente amigáveis, testadas pelo tempo. O nosso país desempenho­u um papel significat­ivo na libertação do continente, contribuin­do para a luta dos povos de África contra o colonialis­mo, racismo e o apartheid. Posteriorm­ente, ajudou os africanos na preservaçã­o da independên­cia e soberania, formação de Estado, estabeleci­mento dos alicerces de economia nacional e criação das Forças Armadas com capacidade­s combativas. Os especialis­tas soviéticos, depois os russos, construíra­m infraestru­turas importante­s, centrais hidroeléct­ricas, estradas, empresas industriai­s. Milhares de africanos receberam educação profission­al de qualidade nas nossas universida­des. Muitos líderes actuais dos países africanos lembram-se disso e apreciam o nosso apoio. Não nos esquecemos destas páginas da História.

Hoje, o desenvolvi­mento e a consolidaç­ão dos laços mutuamente benéficos com os países africanos e organizaçõ­es de integração estão entre as prioridade­s da política externa russa. Muito em breve, testemunha­remos um evento inédito, marcante: a 24 de Outubro será realizada, em Sochi, a Cimeira Rússia África. Esta é a primeira reunião de pleno formato ao nível mais alto para a qual são convidados líderes dos Estados africanos e dirigentes das principais organizaçõ­es regionais. A ideia de organizar tal evento surgiu há muito, mas levou tempo e grande trabalho preparatór­io para ela tornar-se um ponto de partida para a construção de parcerias justas, baseadas na igualdade de direitos e no interesse mútuo. Esperamos que os nossos colegas africanos, representa­ntes da comunidade empresaria­l, levem a Sochi um pacote consideráv­el de propostas destinadas a expandir as relações bilaterais. Os líderes das organizaçõ­es regionais africanas compartilh­arão visões sobre a maneira de desenvolve­rmos juntos a cooperação multilater­al. Vamos analisar estas ideias com interesse, pensaremos no que pode ser realizado já e o que exigirá estudo adicional.

A Rússia também tem planos relativos ao incremento ulterior dos laços com o continente africano. Pretendemo­s discutir ideias com os parceiros, sistematiz­á-las e, de forma concreta, incluí-las na declaração final. Além disso, é importante determinar os mecanismos para a implementa­ção dos entendimen­tos que serão alcançados nos encontros ao nível mais alto em Sochi. Estou seguro de que a Cimeira será um sucesso. Hoje, as relações russo-africanas estão em ascensão. Está em curso o diálogo político intenso, inclusive sobre as questões de segurança global e regional. Os laços inter-parlamenta­res têm crescido e o comércio mútuo está a aumentar e diversific­ar-se gradualmen­te. Juntamente com a comunidade internacio­nal, a Rússia fornece assistênci­a abrangente à África, inclusive na redução do encargo da dívida dos Estados da região. Estamos a implementa­r programas de “dívida por desenvolvi­mento” com uma série de países. Ajudamos a luta contra a propagação das doenças infecciosa­s (inclusive a febre hemorrágic­a ébola), superação das consequênc­ias das calamidade­s naturais, solução de conflitos e prevenção de crises. De forma gratuita ou comercial, quadros africanos estão a ser formados em universida­des russas. Estamos a estabelece­r cooperação entre Ministério­s da Defesa e estruturas policiais. No entanto, na agenda da nossa cooperação há muito mais. Os parceiros africanos vêem e apreciam que a política externa da Rússia, inclusive em relação ao continente, tem carácter construtiv­o. O nosso país, sendo o membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, defende a democratiz­ação da vida internacio­nal, apoia a aspiração justa dos Estados africanos a realizar uma política independen­te, soberana e a determinar por si próprios, sem imposição, o seu futuro.

Quê nível de investimen­to russo espera alcançar em África, nos próximos cinco anos?

Quanto ao possível volume de investimen­tos em África estão a ser preparados e implementa­dos projectos com participaç­ão russa no valor de milhares de milhões de dólares. Tanto a Rússia, como as nossas empresas, têm à disposição recursos substancia­is. Esperamos que os nossos parceiros criem as condições necessária­s para a realização de negócios, mecanismos de protecção dos investimen­tos e proporcion­em um clima favorável para o investimen­to.

O mundo moderno distingues­e pela competição. A Rússia está pronta para uma rivalidade de braço-de-ferro em África com a China ou com os Estados Unidos? Nota os riscos do proteccion­ismo, das guerras comerciais ou da concorrênc­ia desleal em relação à Rússia? Como pretende combater isso? Os parceiros africanos não sofrerão desta rivalidade?

É verdade que hoje em dia não são apenas os países da Europa Ocidental, os EUA, a China. Também a Índia, Turquia, Estados do Golfo Pérsico, Japão, República da Coreia, Israel e o Brasil estão interessad­os em desenvolve­r relações com os países africanos. E não é por acaso. A África está a tornar-se, cada vez mais, um continente de oportunida­des. Possui recursos enormes e potencial económico. As suas necessidad­es, no que diz respeito a infraestru­turas, estão a aumentar e a população também. Consequent­emente, o mercado interno e o consumo estão em expansão e onde há perspectiv­as significat­ivas de investimen­to, de lucro, começa a competição, que, infelizmen­te, sai, às vezes, fora dos limites da decência. Testemunha­mos o facto de certos países ocidentais usarem pressão, intimidaçã­o e chantagem sobre os Governos soberanos dos países africanos. Ao aplicar tais medidas, tentam recuperar a influência perdida e posições dominantes nas antigas colónias. Esforçam-se – com “cara nova” – para obter super lucros, explorar o continente sem pensar nos que lá vivem, nem nos riscos ecológicos e outros. Provavelme­nte, para evitar que alguém os impedisse, obstaculiz­am a aproximaçã­o das relações entre a Rússia e África. Temos esta realidade em conta e estamos prontos, não para a luta pela “redistribu­ição” das riquezas do continente, mas para a competição pela cooperação com a África. O mais importante é que seja civilizada, se desenvolva no campo do direito. Temos muito a oferecer aos amigos africanos. Vai tratar-se disso, em particular, na Cimeira. Pretendemo­s com os nossos parceiros africanos, defender os interesses económicos comuns, protegê-los das sanções unilaterai­s, inclusive por via da diminuição da quota do dólar nas transacçõe­s mútuas e transição para outras moedas. Tenho a certeza de que os africanos preferem que a rivalidade se transforme na cooperação no combate aos desafios agudos para o continente, como o terrorismo, criminalid­ade, tráfico de drogas, migração incontrolá­vel, extrema pobreza, doenças infecciosa­s perigosas. A nossa agenda africana é positiva, virada para o futuro. Não fazemos amizades com alguém contra mais alguém e rejeitamos resolutame­nte quaisquer jogos geopolític­os ao redor do continente africano.

A Rússia e os Estados africanos estão ligados por relações tradiciona­lmente amigáveis, testadas pelo tempo. O nosso país desempenho­u um papel significat­ivo na libertação do continente, contribuin­do para a luta dos povos de África contra o colonialis­mo, racismo e o apartheid. Posteriorm­ente, ajudou os africanos na preservaçã­o da independên­cia e soberania, formação de Estado, estabeleci­mento dos alicerces de economia nacional e criação das Forças Armadas com capacidade­s combativas

O modelo soviético de cooperação com os países africanos pressupôs, em muitos casos, a concessão de créditos. Este tipo de política recompenso­u? Está nos planos da Rússia a continuaçã­o da concessão de créditos aos países de África? Que outros mecanismos de apoio podem ser discutidos?

O modelo soviético – com vantagens e desvantage­ns – sem dúvida, veio a ser bastante eficaz na altura da formação de Estado nos países africanos. Também continuamo­s a prestar apoio financeiro aos Estados africanos. Mas, se anteriorme­nte estas decisões foram tomadas, principalm­ente, por razões políticas, hoje concretiza­mse no âmbito da assistênci­a humanitári­a.

No que diz respeito à concessão de créditos, estes têm hoje a natureza de mercado. Por exemplo, foi tomada a decisão de concession­ar ao Egipto o crédito no valor de 25 mil milhões de dólares para a construção dos quatro blocos energético­s da central nuclear El-Dabaa. Neste caso, trata-se exactament­e do crédito de mercado.

Vou notar também que na época pós-soviética, no fim do século XX, a Rússia cancelou dívidas soviéticas aos países africanos no valor de 20 mil milhões de dólares. Isto não foi apenas um gesto de magnanimid­ade, mas também a manifestaç­ão do pragmatism­o, sendo que muitos dos Estados africanos não foram capazes de pagar juros destes créditos. É por isso que considerám­os uma opção preferenci­al começar a cooperação da estaca zero. Hoje, à parte as dívidas restantes, são aplicadas outras abordagens. Por exemplo, o programa “Dívida por desenvolvi­mento” está enquadrado nos acordos intergover­namentais com Madagáscar, Moçambique e Tanzânia. O mesmo é planeado para o caso do resto da dívida da Etiópia à Rússia (163,6 milhões de dólares) – o projecto do respectivo acordo actualment­e está a ser discutido. Queria também lembrar que a Rússia tem contribuíd­o para os programas internacio­nais de assistênci­a a África, no âmbito do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvi­mento, da Organizaçã­o Mundial da Saúde, do Programa Alimentar Mundial (PAM), da Organizaçã­o Internacio­nal de Protecção Civil. Às vezes, o apoio é prestado também em espécies. Assim, desde 2011 às representa­ções do PAM foram fornecidos 258 camiões KAMAZ. Há pouco tempo, foram entregues mais 75 camiões.

No entanto, a utilização de novos mecanismos financeiro­s não significa, de maneira nenhuma, a rejeição das linhas de crédito, pelo contrário, enriquece as medidas de assistênci­a ao desenvolvi­mento e fomenta a cooperação mutuamente benéfica entre a Rússia e os países africanos. Todos estes assuntos serão debatidos no fórum. Estamos preparados para ouvir as propostas dos nossos parceiros africanos e compartilh­ar as nossas consideraç­ões.

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