O banco dos mais pobres
Diversas compilações de dados concluem que o Estado chinês é responsável por um quarto do total de empréstimos financeiros direccionados para os países emergentes, facto que transformou a China no maior credor oficial superando facilmente o Fundo Monetário Internacional (FMI) ou o Banco Mundial (BM). Só com Angola os empréstimos chegam aos 23 mil milhões de dólares.
O financiamento chinês foi fundamental para o progresso de grandes projectos de infra-estruturas, incluindo os 6,4 mil milhões de dólares para o Novo Aeroporto de Luanda, os 4,5 mil milhões para o projecto da central hidroeléctrica de Caculo Cabaça e a reconstrução dos Caminhos-de-Ferro de Benguela, orçado em 1,8 mil milhões de dólares.
Os dados totais sobre os financiamentos chineses em África, que abrangem um total de 1.974 empréstimos e 2.947 doações para 152 países emergentes ou em desenvolvimento, de 1949 a 2017, foram compilados pelos pesquisadores Sebastian Horn, Carmen Reinhart e Christoph Trebesch, do Instituto para a Economia Mundial de Kiel, na Alemanha.
A China não divulga detalhes sobre a Nova Rota da Seda e os seus empréstimos directos. Nem mesmo às instituições multilaterais.
As regiões mais endividadas com a China são o Extremo Oriente e a Ásia Central, incluindo pequenas economias altamente expostas e próximas do território chinês, como Laos, Camboja e República do Quirguistão. Em seguida, vem a África Subsaariana e a América Latina, além de algumas partes da região MENA (Oriente Médio e Norte da África). Os fluxos de dívida para a Europa de Leste são menores, mas os montantes de crédito têm crescido substancialmente nos últimos cinco anos.
A dependência de Angola em relação aos empréstimos chineses provocou uma situação difícil na gestão da dívida externa: boa parte é paga com petróleo, facto que reduz a entrada de divisas na economia.
Por isso, Angola vai deixar de oferecer o crude como garantia das linhas de crédito negociadas com outros estados, nomeadamente a China, Brasil e Israel, disse João Lourenço à agência noticiosa russa TASS, em Março de 2019.
“O volume de aprovisionamento de petróleo tem sido elevado nos últimos anos, porque Angola negociou créditos com a China para a construção de estradas, pontes e outras infraestruturas.”, afirmou João Lourenço. O Presidente angolano assinalou que os anteriores acordos assinados com a China estão desactualizados e que Angola quer alterá-los.
Em Setembro do ano passado, a consultora Fitch Solutions alertou para os riscos do modelo de empréstimos pagos com petróleo, muito usado pela China no financiamento a África, nomeadamente a Angola.
“Enquanto os empréstimos pagos em petróleos reduzem os riscos de pagamento para os financiadores chineses, os altos níveis de endividamento vão limitar a capacidade para apoiar projectos de infra-estruturas e restringir o crescimento da indústria da construção nos próximos anos”, escreveram os analistas da Fitch.
Philani Mthembu, director executivo do Institute for Global Dialogue (IGD), acredita na possibilidade de maior triangulação entre os empréstimos chineses, as necessidades africanas e a possibilidade de outros actores internacionais assumirem papéis importantes.
“Por exemplo, na África do Sul, as pessoas pensam que a China está a ocupar o país. Mas se olharmos para a realidade, o Ocidente ainda tem uma grande influência em África. 70 por cento do investimento na África do Sul ainda vem da Europa, apesar de a China ser o principal parceiro comercial do país. Para África, é importante que possamos nos afastar das lutas entre as grandes superpotências. Na realidade, a maior parte dos países africanos não tem hipótese de escolher os seus parceiros. Precisamos, então, de desenhar estratégias para que o engajamento seja canalizado para as nossas agendas. Porque o debate não é sobre quem é bom ou mau. Precisamos de ter uma direcção concreta", explicou o académico sul-africano.