Professor de Português lavrou a terra desde criança
O jovem do Cunene nunca virou a cara à luta e no meio de dificuldades financeiras extremas obteve uma licenciatura
Albino Hitototnanye, filho de Lucas Vataleni e de Isabel Ondili, camponeses, nasceu em 1990, há 29 anos, na aldeia de Outokelo Wakasidulika, Cunene.
A infância de Albino Hitototnanye foi marcada, desde muito cedo, pelo trabalho agrícola, suportando todas as tempestades. Com sol ou chuva tinha de tomar conta dos animais e de cuidar da lavra.
“Foi muito duro para mim, porque logo aos sete anos comecei a seguir as viagens de transumância, muitas vezes percorrendo mais de 40 quilómetros na procura da sobrevivência para o gado.”
Albino Hitototnanye iniciou os estudos apenas aos dez anos, porque teve de migrar com o pai para uma localidade onde havia condições para a sobrevivência do gado, mas lá não havia escolas, a primeira escola surgiu três anos depois e com problemas de falta de professores.
“A primeira escola surgiu por iniciativa da comunidade quando a vontade de ver os filhos aprenderem a ler e a escrever falou mais alto, confeccionaram com o material local uma barraca de paua-pique que funcionava como nossa sala de aula, o professor era pago pelos pais, que davam um valor mensal, quem não tinha valores convertia-os em quilos de sangou e pagava.”
O professor era dedicado pois queria ver aldeia desenvolvida, ministrava aulas para um universo de 90 a 100 alunos e fazia um grande esforço para ver todos a lerem e a escreverem.
“À medida que o tempo foi passando também fui passando de classe e como na altura só havia até à 4ª classe, com a vontade de dar continuidade aos meus estudos mudei para outra localidade onde tinha da 5ª classe em diante.”
Albino Hitototnanye tem uma paixão forte pelo jornalismo, desde muito cedo começou a desenvolver uma capacidade de comunicação, mas infelizmente na aldeia ele não via como fazer para tornar o sonho realidade.
Albino Hitototnanye, quando em 2008 foi para a cidade dar continuidade aos estudos, procurou de imediato um centro que oferecesse um curso de comunicação, mas sem êxito porque não tinha dinheiro para pagar.
“Vi cada vez mais o sonho tornar-se impossível, mesmo assim não desisti até que dois anos depois um dos meus irmãos me pagou o curso que na altura custava 2.500.00 Kz, era muito dinheiro, 6 meses depois terminei o curso, comecei a frequentar a emissora local apesar de muitas dificuldades de pronúncia da Língua Portuguesa, pois só aprendi a falar o português aos 15 anos de idade, não foi fácil.”
Ainda assim Albino Hitototnanye continuou a lutar. Depois de concluir o ensino médio do curso de formação de professor na especialidade de Língua Portuguesa, em 2013, no Magistério de Ondjiva, em 2014 Albino Hitototnanye segue para a cidade do Lubango com o objectivo de obter uma licenciatura.
Albino Hitototnanye não hesitou e inscreveuse no Curso de Ciências da Comunicação no Instituto Superior Politécnico Independente do Lubango, onde, no meio de enormes dificuldades financeiras, quatro anos depois concluiu a licenciatura.
Albino Hitototnanye passou por muitas dificuldades durante a formação, desde o ensino de base até ao superior. “Tinha apenas um par de sapatos que usava diariamente”, recorda. “Muitas vezes ia descalço, eram dez quilómetros, um dia ferime num caco, tinha deixado os sapatos em casa para os poupar, quase reprovei, fiquei três meses em casa, o ferimento era grande.” Não foi fácil terminar, diz Albino Hitototnanye, chegava da escola, deixava logo os cadernos e seguia para o pasto. “Levantávamo-nos às duas horas da manhã para ir à lavra charruar.”
As dificuldades arrastaram-se até ao termo da formação, no Lubango. “Sem dinheiro para pagar o transporte, comida ou material escolar, fui obrigado a passar páginas e páginas de livros e fascículos para o caderno.”
Em 2003, com 13 anos, Albino Hitototnanye perde a mãe. “Ela era tudo, sempre deu o melhor de si para não nos faltar o sustento diário, senti-me perdido.”
Albino Hitototnanye passa a ser criado pela irmã mais velha, ela era professora mas o que ganhava não cobria as despesas da casa, porque o marido estava desempregado e Albino Hitototnanye dá explicações aos meninos do bairro, cobrava trezentos kwanzas.
Hoje, Albino Hitototnanye é professor de Língua Portuguesa na escola do I ciclo do ensino secundário de Okapangu, município de Cuanhama, e trabalha como jornalista no Gabinete de Comunicação Social do Governo Provincial do Cunene. “Tenho o jornalismo e a docência como grandes escolas pois aprendo em cada dia que passa, gosto de comunicar e de escrever para informar.”