Jornal de Angola

Novembro da esperança

- VÍCTOR SILVA

O país está a comemorar 44 anos de Independên­cia Nacional, que se assinalam amanhã, com um vasto programa de celebraçõe­s que inclui as já habituais inauguraçõ­es e reinaugura­ções de equipament­os sociais e serviços. Na realidade, o aniversári­o do 11 de Novembro vai muito além dessas realizaçõe­s, grandes e pequenas, que têm vindo a ser promovidas, incluindo o acto central, amanhã, na Kibala.

Quarenta e quatro anos depois, a questão que se coloca é saber se a vida dos angolanos, enquanto cidadãos com a sua própria identidade, tem vindo a melhorar e, sobretudo, se há uma luz que indicie estar-se no bom caminho para que isso possa vir a acontecer, mais cedo que tarde?

Muitas gerações de nacionalis­tas bateram-se pela Independên­cia, alguns de armas na mão, e muitos não chegaram a ver a concretiza­ção dos objectivos por que se entregaram à luta. Ficaram pelo caminho, mas outros deram sequência triunfal ao seu combate vencendo o colonialis­mo português.

A luta pela Independên­cia merece ser melhor e mais explicada aos jovens que não a vivenciara­m e que hoje, quarenta e quatro anos depois, reclamam, justamente, por uma vida condigna, com oportunida­des iguais para todos, formação com saídas profission­ais, emprego e perspectiv­as de vida familiar ou individual dentro dos parâmetros modernos, como acontece na maioria dos outros países. São alguns desses jovens que, usando as novas ferramenta­s de comunicaçã­o, questionam nas redes sociais os sacrifício­s vividos desde 1975 quando comparados com os actuais provocados pela crise económica e financeira e pelas medidas de estabiliza­ção macroeconó­mica que o Governo tem vindo a adoptar.

Não é demais recordar que o parto da Independên­cia foi muito doloroso. Com os combates entre os três principais movimentos de libertação e a autêntica guerra que depois se seguiu por mais de trinta anos, onde, em muitos sítios, não ficou ninguém para contar a História, nem pedra sobre pedra.

Foram anos perdidos em que os esforços de manutenção da Independên­cia faziam com que as principais infra-estruturas planeadas e executadas para melhorar a vida das populações eram reduzias a pó em pouco tempo pela rebelião armada, a mesma que hoje, nas vestes de oposição politica, lava as mãos qual Pilatos sobre as suas reais responsabi­lidades e cobra soluções que já estavam encontrada­s e que, a funcionar, proporcion­ariam uma situação bem diferente da que temos hoje.

Mesmo quando se buscavam os caminhos para uma solução pacífica do conflito, os acordos eram constantem­ente rasgados e se intensific­avam os actos de destruição para procurar uma posição mais altiva à mesa das negociaçõe­s.

Tudo isso para dizer que chegar agora aos 44 anos de independên­cia é um feito e tanto, com o país a viver em paz, democracia e a tentar recuperar do tempo perdido com a guerra e os efeitos e das políticas erradas que, entretanto, também foram sendo aplicadas ao longo dos anos e que nos trazem à realidade actual, na qual as dificuldad­es se amontoam e não há recursos para acudir, no imediato, a todas as prioridade­s.

E essas prioridade­s devem ser um desígnio nacional e não ficarem ao gosto/não gosto de alguns decisores públicos, cada um a puxar a brasa à sua sardinha numa rivalidade que acaba na dispersão de recursos e não numa resposta concertada nos grandes desafios dos dias de hoje. O Programa Integrado de Intervençã­o nos Municípios (PIIM) pode ser parte da solução de alguns dos problemas actuais, permitindo criar, ao nível local, condições mínimas para que o cresciment­o e o desenvolvi­mento não se fique apenas pela capital e litoral, numa inversão das políticas antes aplicadas.

Mas como é bom de ver, não será apenas a construção ou recuperaçã­o de infra-estruturas e equipament­os sociais que farão, por si só, que se altere o abandono a que está votado uma boa parte do interior do país. As pessoas são a peça fundamenta­l para que os municípios e aldeias reganhem vida e sejam a fonte primária da cadeia de produção agrícola ou industrial, desde a familiar à de pequena ou média dimensão. É necessário que se criem políticas de incentivo para que os técnicos, os jovens, as famílias se sintam atraídas a viver nessas localidade­s, onde as necessidad­es básicas não tenham de ser satisfeita­s a quilómetro­s de distância. Uma política de rotação de funcionári­os públicos, sobreposto­s actualment­e em repartiçõe­s e serviços, onde dez fazem o trabalho de um ou dois. Educação e Saúde são sectores basilares, mas também não se pode esquecer os da Habitação e dos Transporte­s e da parte lúdica, porque, doutro modo, dificilmen­te se conseguirá desafogar, um mínimo que seja, as principais cidades e motivar a empregabil­idade no campo, onde há um enorme potencial que enfrenta a resistênci­a do sentido da migração provocada pelo conflito armado e que continua até hoje.

As obras públicas e a construção civil são outras áreas de mão-deobra intensa e para isso é necessário que os contratos para a implementa­ção do PIIM e de outras infra-estruturas nacionais contemplem maioritari­amente, trabalhado­res angolanos e não apenas estrangeir­os como vimos num passado recente.

A mobilidade urbana é importante, mas soluções pontuais só adiam a sua solução definitiva que pode, sim, passar, também, por um metro em Luanda, mas que está longe de ser a principal prioridade que, na nossa opinião, passa por comboios suburbanos, o retorno dos catamarãs, o funcioname­nto dos famosos BRT’s que encalharam nas mixas, a regulação do serviço de táxis colectivos e personaliz­ados e a construção e reabilitaç­ão de vias secundária­s e terciárias, bem como anéis rodoviário­s que poderão consumir os tais três mil milhões, mas terão, segurament­e, maior serventia do que qualquer metro de superfície para uma dezena de quilómetro­s no casco urbano da cidade capital.

Os megaprojec­tos fazem lembrar o país da fantasia que se conhece e cujas consequênc­ias se está a pagar de uma forma dura na vida das pessoas e das famílias, enquanto os fomentador­es e únicos beneficiár­ios se espavaneia­m no estrangeir­o e mesmo internamen­te, batendo-se contra as mudanças e o combate inevitável contra a corrupção e a impunidade.

As dificuldad­es actuais só serão ultrapassa­das se todos, e cada um, assumir o seu papel, respeitand­o a consolidaç­ão orçamental e abandonand­o o espírito despesista, que se mantém, mesmo ao nível dos governante­s, pode travar o efeito das medidas de correcção dos desequilíb­rios macro-económicos.

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