“Uma ideia não se prende”
“Eles não prenderam um homem, eles tentaram prender uma ideia, mas uma ideia não se prende”, acusou o ex-Presidente do Brasil. A reportagem é do “Diário de Notícias”
Lula da Silva, 74 anos, foi preso em Abril do ano passado, no âmbito da Operação Lava Jato, por causa de um apartamento tríplex em seu nome, numa praia do Estado de São Paulo. Era candidato às eleições para a presidência da República, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e as sondagens mostravam-selhe favoráveisi.
Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal votou favoravelmente (seis votos a favor e cinco contra) uma alteração à pena de prisão no Brasil, que passa a ser aplicada só depois dos processos transitarem para julgamento e não apenas na sequência de uma condenação em segunda instância. A excepção são os casos de flagrante delito ou de criminosos considerados perigosos para a sociedade. Esta decisão beneficiou cerca de cinco mil prisioneiros, entre eles, 12 condenados do processo Lava Jato.
Assim que deixou o estabelecimento prisional, Lula discursou perante milhares de apoiantes, que gritavam: “Lula, eu te amo”.
“O lado podre da política federal, da Receita Federal, do Ministério Público Federal tentaram criminalizar a esquerda brasileira. Eles não prenderem um homem, eles tentaram prender uma ideia, mas uma ideia não se prende”, acusou.
“Essa quadrilha e outros se os colocarem todos no liquidificador não dá 10 por cento da honestidade que eu represento”, acrescentou.
A seguir, Lula apresentou os mais próximos, usando provocações ao Presidente Jair Bolsonaro: “Quero apresentar o nosso quase Presidente, se não fosse roubado, Fernando Haddad” e “este amigo aqui que é capitão, não é um tenente que ao se aposentar virou capitão”.
Lula já deixou promessas: “vou lutar para melhorar a vida do brasileiro, que está uma desgraça, e não vou permitir que esta gente entregue o nosso país”. Para Lula, “o país vai melhorar quando tiver um presidente que não minta tanto como o Bolsonaro mente pelo twitter”.
O antigo Presidente, que seguiu para São Bernardo do Campo, sede do Sindicato dos Metalúrgicos, que presidiu, e de onde, em Abril de 2018, partiu para a prisão, quer agora aproveitar para viajar pelo Brasil e assumir-se como uma espécie de líder da oposição ao Governo de Bolsonaro, apesar de a sua actual situação jurídica não o permitir candidatar-se a cargos públicos, por enquanto.
“Estou com o sangue nos olhos”, disse o antigo Presidente, citado pela revista “Veja”, ao longo da tarde, numa demonstração de que pretende fazer política agressiva.
Dissonâncias
No Partido dos Trabalhadores, no entanto, há correntes dissonantes, que preferiam ver Lula resguardar-se neste momento. A colunista Denise Rothenburg, do jornal “Correio Braziliense”, escreve que “enquanto alguns defendem um acto no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, onde Lula foi preso, em 7 de Abril do ano passado, e que ele comece a percorrer o país na semana que vem”, outros têm “receio de que esse périplo acirre a divisão no país e sirva de justificativa para que os aliados do Presidente Jair Bolsonaro tentem classificar qualquer acto como “baderna” ou coisa que o valha, a fim de vir com medidas de restrição de liberdade”.
Decisão
O Supremo Tribunal Federal (STF) votou (seis contra cinco), a favor da prisão apenas após os processos transitarem em julgado e não logo depois da condenação em segunda instância, decisão que, além de Lula, beneficiou 11 condenados na Lava Jato, entre eles José Dirceu, e cerca de cinco mil presos.
As excepções, sublinhadas pelo tribunal, são em caso de prisão em flagrante delito ou de criminosos considerados perigosos para a sociedade. Mas o tribunal deixou no ar, como destacou Moro, a possibilidade de o Congresso, se assim o entender, alterar a carta constitucional e voltar ao ponto de partida.
Votaram a favor do entendimento que beneficiava Lula, dois juízes nomeados pelo próprio ex-metalúrgico, uma por Dilma Rousseff, um por José Sarney, um por Collor de Mello e um por Fernando Henrique Cardoso. E contra, uma nomeada por Lula, três por Dilma e um por Michel Temer.
Lula fora condenado por Moro em primeira instância, no caso chamado de “tríplex do Guarujá”, pela posse ilícita de um apartamento na praia paulista. Viu, posteriormente, o tribunal de segunda instância aumentar-lhe a pena, razão pela qual foi para a prisão. O Supremo Tribunal de Justiça, terceira instância, diminuiu essa pena. Com o novo entendimento, até ao STF julgar o processo e só após esgotados todos os recursos cabíveis, o antigo Presidente volta para a prisão. O político, porém, tem mais sete processos à perna. Num deles, conhecido como “Sítio de Atibaia”, já foi condenado em primeira instância.
Por outro lado, os seus advogados têm um trunfo na manga: solicitaram recurso ao STF, pedindo a suspeição de Moro por parcialidade, com base nas gravações reveladas nas reportagens do The Intercept - a Vaza Jato.
Uma vez aceite esse recurso, a condenação seria anulada e Lula poderia até candidatar-se a cargos públicos - para já não pode ao abrigo da Lei da Ficha limpa que impede condenados em segunda instância de o fazerem.