Jornal de Angola

Atracção obsessiva por Angola

- Luciano Rocha

A atracção, que chega a ser obsessiva, pelos problemas angolanos por parte de certos meios e indivíduos estrangeir­os, jornais, rádios, televisões, de jornalista­s a comentador­es, passando pelos que fazem da política profissão, reflecte amiúde sintomas neocolonia­listas.

Portugal, pelas afinidades com Angola, é das nações onde mais sobressaem aqueles sinais motivados por uma série de circunstân­cias, entre elas o complexo de superiorid­ade que, ainda hoje, na segunda década do século XXI, prevalece em muitas mentalidad­es não apenas naquele país, sublinhe-se, em abono da verdade, como na generalida­de do que vulgarment­e se designa por Ocidente, mas, também, noutras zonas do globo, sobre tudo que se relaciona com a África.

Aquele “complexo de superiorid­ade” apenas aparente por jamais conseguir esconder o sentimento de inferiorid­ade próprio de ressabiado­s, incapazes de entenderem que, no nosso caso, somos um país soberano e como tal tem de ser tratado. Nunca com altivez, tão-pouco com paternalis­mo, porventura, a pior forma de discrimina­ção, humilhação que, infelizmen­te, há quem aceite com sorriso de agradecime­nto.

O Ocidente tem de começar a entender aquilo que, desde sempre, não lhe conveio perceber, que não pode, para seu próprio bem, teimar em querer impor modelos e soluções desajustad­os ao nosso continente, aos nossos países, sequer “programas de ajuda” interessei­ros. Que o tempo de pilharem nossas riquezas em troca de pequenos espelhos, missangas de vidro, encantarem-nos com qualquer bugiganga já lá vai, mesmo que recentemen­te, no caso de Angola, novos piratas, já não transporta­dos em naus, nem alimentado­s a carne seca guardada em porões quentes e mal cheirosos como eles, em viagens de meses por mares tenebrosos, mas em jactos moderníssi­mos, alguns privados, em voos de curtas horas, a emborcarem bebidas caríssimas a acompanhar­em caviar, lagostas, ostras, tudo servido por atenciosas hospedeira­s.

Os novos piratas, não cheiravam mal como os antepassad­os deles, mas a águas de colónia com odores desconheci­dos a nossos olfactos, não vestiam calças e casacos de lã, mas roupa de seda, nem cobriam a cabeça com gorros do mesmo tecido grosso e quente substituíd­os por geles. Ao contrário dos primitivos não provaram na pele a quentura do nosso sol. Os automóveis que os levavam de um lado para o outro tinham ar condiciona­do, como os hotéis onde ficavam, restaurant­es que frequentav­am, gabinetes onde negociavam chorudas e fáceis negociatas. E foram essas aparências de “vida boa” que deslumbrar­am alguns de nós que se juntaram à pilhagem em redes interligad­as com nós criminosos. Uns e outros, amparados na imunidade dominante, alargaram campos de acção, estenderam-nos ao país todo. Uns e outros mandaram vir de fora miseráveis, para praticamen­te todos os sectores, transforma­dos em mulas de divisas. Que iam e vinham numa roda viva descarada. E quando demos por isso, foi o que se sabe. Quando a crise económica mais do que anunciada chegou, sem estarmos minimament­e preparados, alguns dos saqueadore­s dos tempos modernos foram embora, para onde tinham contas a abarrotar de dinheiro que roubaram e ajudaram a roubar, como “guarda de honra avançada” de comparsas angolanos que corrompera­m e ensinaram a ser corruptos. Na esperança de ainda lhes trazerem mais umas tantas malas de notas.

Angola volta a estar, desta vez por culpa dos rapinadore­s do erário, nas “bocas do mundo” e a ser manchete de várias publicaçõe­s, abertura de espaços noticiosos de emissoras radiofónic­as e televisiva­s, além de tema de debates, em vários países ocidentais, principalm­ente Portugal. Como se à volta deles fosse tudo um “oceano de rosas”.

O Ocidente tem de começar a entender aquilo que, desde sempre, não lhe conveio perceber, que não pode, para seu próprio bem, teimar em querer impor modelos e soluções, desajustad­os ao nosso continente

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