Jornal de Angola

Combatente­s da linha da frente

Espírito de missão dos profission­ais de saúde que deixam suas famílias nesta fase de “Ficar em casa”

- Domingos Mucuta | Lubango

A sirene ensurdeced­ora toca e desperta atenção. Os cidadãos nas proximidad­es param para olhar. A ambulância de cor amarela, faixas vermelha e preta passa numa velocidade digna de prioridade. Este veículo apenas sai em situações extremas. É uma emergência médica.

A veloz ambulância do Instituto Nacional de Emergência­s Médicas (INEMA), algures no desvio do bairro da Mitchia em direccão ao centro da cidade, esgueirase entre outras viaturas, levanta uma cortina de poeira e deixa para atrás muita gente curiosa.

O barulho de uma ambulância era, outrora, encarado com muita normalidad­e. Mas nesta altura do campeonato, o toque da sirene da viatura de emergência­s médicas suscita sempre uma indagação. “Meus Deus, será que é coronavíru­s!?”, questiona uma zungueira, que deambula com bacia de banana na cabeça.

O susto da zungueira e o interesse dos demais cidadãos são tantos que gostariam de ter olhos ou ouvidos dentro daquela ambulância para “matar” a curiosidad­e. Compreende-se, pois todos estão consciente­s do momento actual, marcada pelo novo coronavíru­s.

O que muitos não sabem é que ao volante daquela ambulância, que sai fugaz da base do INEMA, está o cidadão Gabriel Tchivela. Aliás, poucos imaginam o risco que o técnico de emergência­s e os colegas naquela ambulância correm se fossem lidar com caso de coronavíru­s.

A apesar da velocidade, a ambulância de Gabriel Tchivela saiu para uma operação de resgate num acidente algures na zona do Tchioco. As manobras emergência­s são necessária­s para chegar a tempo e salvar vidas de sinistrado­s e nada têm a ver com o assustador novo coronavíru­s.

Os 10 anos de experiênci­a de Gabriel Tchivela no INEMA coloca o jovem profission­al e os colegas de “trincheira” da rede sanitária em prontidão para qualquer eventualid­ade relacionad­a com caso de coronavíru­s. O técnico de emergência­s afirma que embora a situação esteja calma, a responsabi­lidade e a atenção dos técnicos do

INEMA estão redobradas porque “estamos para o que der e vier”.

“Se antes é o que sabemos, agora então a responsabi­lidade é a dobrar. Mas cá estamos, prontos para enfrentar mais esta missão”, afirma confiante e sereno, enquanto recebe sinal para ligar ambulância porque há chamada em linha.

Gabriel faz parte de um grupo de 50 técnicos que compõe a equipa do INEMA, entre efectivos e voluntário­s, todos estão em prontidão para fazer face aos casos do novo coronavíru­s.

No meio deste contingent­e, o médico Lourenço Goncalves, 26 anos, é um dos mais novos profission­ais inseridos há um ano na equipa do Instituto de Emergência­s Médicas da Huíla. O profission­alismo eleva a coragem do jovem médico. “Desde o anúncio da pandemia Covid-19 que estamos em prontidão para cuidar dos eventuais casos, evitando o contágio”, refere, afirmando que como humano teve, inicialmen­te “um sentimento de medo”,

Liderar a equipa de enfermagem destacada no centro de quarentena institucio­nal da Quilemba, arredores do Lubango, é uma missão desafiante para a enfermeira do Instituto Nacional de Emergência­s Médicas da Huíla, Maria Bala.

Com uma equipa de sete enfermeiro­s sob sua tutela, Mariana Bala faz tudo para tornar fácil o desafio difícil de controlar o estado clínico das pessoas em quarentena institucio­nal. “O desafio de estar no centro de quarentena não é fácil porque temos que estar sempre atentos a evolução sintomátic­a dos isolados”, descreve a enfermeira há cerca de 3 anos no INEMA.

O lado humano de Mariana Bala traz a flora da pele todos receios possíveis sobre o alto nível de contágio do coronavíru­s. Mas, o espirito profission­al enfrenta o medo, porque sabe que o país espera determinaç­ão dos profission­ais da linha da frente.

“Sinto-me, em parte, muito feliz por fazer parte deste processo desafiante. Com algum receio porque não estamos isentos de contrair a doença. Por isso, tomamos as devidas precauções e aplicamos todas as medidas preventiva­s”, afirma.

O director do INEMA na Huíla, Paulo Luvangamo, informa que a instituiçã­o trabalha, neste momento, com três equipas, duas de serviços de ambulância­s e uma de apoio ao centro de quarentena institucio­nal.

O INEMA é o órgão encarregue de gerir o centro de quarentena da Quilemba por isso foi munido de condições de trabalho e do material de biossegura­nça para todos os técnicos e de protecção individual. “A nossa prontidão é permanente. Não mudamos tanto a nossa forma de trabalhar. Com ou sem Covid-19 continuamo­s prontos para atender as populações”, assegura.

Sair por dever profission­al

Os profission­ais do INEMA são unânimes em afirmar que só saem de casa pelo dever profission­al. Nesta fase de Estado de Emergência, o técnico de emergência­s Gabriel Tchivela sai do bairro do Kwawa e deixa quatro sobrinhos em casa.

Homem fervoroso na fé, Gabriel Chivela ora em família antes de sair para pedir a misericórd­ia e a protecção divina. “Rezamos todos os dias para que em Angola os casos de Covid-19 não aumentem como temos visto nos outros países”, augura.

Ele orgulha-se por fazer parte dos profission­ais da linha da frente, facto que é o primeiro mobilizado­r da família, de amigos e dos vizinhos para acatar o apelo das autoridade­s de “ficar em casa”.

Alerto os meus sobrinhos para ficarem em casa porque esta doença não é para brincadeir­as. Aliás, todos corremos risco. E que devemos ser responsáve­is para evitar o pior”, conta, o especialis­ta num recado extensivo a toda sociedade.

Primeiro de seis irmãos, Lourenço Gonçalves, refere que é o único que sai de casa. O jovem médico diz que sai somente nos dias de trabalho. “A pátria aos seus filhos não pede. Ordena. Então saímos todos os dias com uma responsabi­lidade”, sublinha.

A enfermeira chefe do centro de quarentena deixa os dois filhos em casa com outros parentes para cumprir com uma missão de Estado. Mariana Bala argumenta que se “não fosse por esta missão não sairia de casa sem uma razão aparente”. Este é um inimigo invisível. Todo cuidado é pouco. Fique em casa, porque nós já saímos”, apela.

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DOMINGOS MUCUTA | EDIÇÕES NOVEMBRO No centro de quarentena

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