Jornal de Angola

Família do músico Bangão clama por apoios

- Manuel Albano

“Nem tudo que brilha é ouro”, diz o velho ditado. Desde que o cantor Bernardo Jorge “Bangão”partiu para a eternidade, há cinco anos, aos 53 anos, vítima de doença na África do Sul, a sua família tem enfrentado inúmeros problemas financeiro­s. Para trás ficou uma longa carreira dedicada ao Semba. Mas a vida recheada de sucessos artísticos do “Papá”, para os mais próximos,ou Bangão para os demais, lamentavel­mente foi construída sobre “castelos de areia”

No dia 17 de Maio de 2015 o país recebia, incrédulo, a notícia de que Bangão partia para nunca mais voltar. Se hoje estivesse em vida o cantor seria, segurament­e, presença obrigatóri­a nos principais espectácul­os, online ou não, realizados no país.

Cinco anos depois, a campa de Bangão, localizada no cemitério do Alto das Cruzes, em Luanda, ainda não é definitiva e está ao “abandono”, revelou ao Jornal de Angola, com profunda tristeza, uma das viúvas, Felipa João José, mãe dos primeiros filhos do cantor. “Bangão gostava de calulú com feijão de óleo de palma, mas o que aparecia na mesa ele comia”, disse tia Felipa, actualment­e desemprega­da.

Bangão não deixou património.Quando decidiu fazer alguma coisa pela família, segundo a viúva, já não teve tempo.

“Há quem pense que o Bangão deixou um império, que deixou a família bem, financeira­mente, mas não é verdade. Na percepção de muitos, Bangão deixou bens materiais, o que também não é verdade.Estamos a passar por inúmeras dificuldad­es financeira­s”, lamentou tia Felipa.

A casa onde actualment­e Felipa José vive com os filhos é herança dos pais de Bangão, situação que a preocupa bastante. Ela tem sobre si o fardo de cuidar dos seis órfãos.

Nos últimos anos da sua vida, recordou a viúva, Bangão pensava em mudar de bairro para dar outra qualidade de vida à família, mas isso ficou pela intenção. Apesar das dificuldad­es, dona Felipa nunca perdeu a fé. Ter casa própria para dar mais conforto à família é o seu principal sonho.

Dona Felipa acredita ainda existirem,no país,pessoas de boa-fé que lhe possam oferecer uma residência, mesmo que seja no Zango. Agradeceu o gesto solidário do cantor Puto Prata, que há dois anos ofereceu aos órfãos do cantor duas bolsas de estudo. Mas uma das filhas este ano, infelizmen­te, não se matriculou, por falta de condições financeira­s e pela longa distância a percorrer do Sambizanga até ao Prenda.

“Bangão gostava de plantas e animais, são esses os presentes que eu mais recebia. Oferecia-me passarinho­s, pombas-correio, rolas, porco índio e coelhos.

Ele tinha paciência de cuidar das plantas e dos animais”, contou a viúva. Dona Felipa diz que tem sabido conviver com a dor de não poder ter mais o Papá. “Bangão foi um pai e irmão, não tinha inimigos. Tratávamo-nos por Papá e Mamã”. Nos tempos livres, acrescento­u dona Felipa, “Bangão tirava sempre um tempo para o lazer e para transmitir conselhos aos filhos”.

Felipa José deu a conhecer que os fatos, chapéus e outros adereços exibidos por Bangão nos espectácul­osestão guardados, para, possivelme­nte, fazerem parte de uma casa-museu. “Há algumas iniciativa­s, de pessoas amigas, que pretendem criar uma casa-museu, mas até agora está tudo parado”.

Amigo dos filhos

Para Clemente José Martins

Correia, primogénit­o de Bangão, o seu pai era uma pessoa divertida e gostava de partilhar as suas vivências com a família. Sentindo-se privilegia­do por ter tido a oportunida­de de trabalhar com o pai, Clemente Correia conta que Bangão chegava a actuar sem cobrar caché nas festas dos amigos. “O pai não parecia, mas era acanhado e não gostava de mendigar ou pedir favores a ninguém. Ele sempre nos disse que devemos viver de acordo com aquilo que ganhamos”.

O cantor chegava a trabalhar por amor a camisola. Muitas vezes não lhe pagavam. “Bangão foi um patriota e não um mercenário que só trabalha por dinheiro”, defendeu o primogénit­o.

“Papá”, recordou Clemente, com nostalgia,“sempre disse que o pai do vizinho também é nosso pai e que deveríamos respeitar os mais velhos. Sempre que pudesse nos levava a passear e para irmos chupar gelado”.

Bangão nunca forçou os filhos a entrarem para o mundo da música.

Depois da sua morte, a família teve de se desfazer de alguns pertences seus. Os carros foram vendidos e alguns dos fatos menos relevantes distribuíd­os entre os familiares.

“O meu pai foi um exemplo de cantor de sucesso que despertou tarde para a vida”, lamentaram, amargament­e, o filho e a viúva. A viúva descreve Bangão como um “homem de discurso directo, simples e que brincava com todos. Era uma pessoa muito divertida e amiga dos filhos. Tinha sempre tempo para conversar e passear com eles”.

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