Jornal de Angola

Governar o Huambo

- SOUSA JAMBA

Karl Meier é um jornalista americano, que escreveu, talvez, um dos melhores livros sobre Angola intitulado “Promises and Lies.” Meier foi correspond­ente do jornal The Washington Post na África Ocidental, em Moçambique e depois em Angola. Numa conferênci­a sobre Angola em 1992, Meier afirmou que as mudanças profundas no país só seriam efectuadas por um “insider” — alguém que viria das estruturas do MPLA. Lembrei-me de Meier por causa de todo alarido causado pela nomeação de uma nova governador­a, Lotti Nolika.

No seu livro, Meier, que viajou para vários cantos da província do Huambo, disse que o Planalto Central (geografica­mente e culturalme­nte) aproximava-se muito à África Austral, enquanto que Luanda e o Norte de Angola, tinha muito em comum com a África Ocidental.

O Planalto Central tem particular­idades que permitem alguém enxergar o futuro assim como o passado. Com muita imaginação e disciplina, o Huambo poderia gerir recursos consideráv­eis através de impostos locais. Para isso, Huambo teria, com um input consideráv­el do sector privado, que desenvolve­r três sectores chave, nomeadamen­te o turismo, a agricultur­a, as pequenas indústrias, a exploração de minerais.

Há muita gente no Huambo que “vive no passado”, que não pára de falar sobre a Nova Lisboa de Norton de Matos. Há mais velhos que se lembram da vinda do grande cantor afroameric­ano, Percy Sledge, ao Huambo, das grandes corridas de carros à volta do Huambo, da casa York, do cinema Ruacaná, etc. Todos estes edifícios estão bem intactos no Huambo, o que falta é dar vida aos mesmos. O turismo de nostalgia produz rendimento e dizse que uma das atracções de Havana é que mudou muito pouco dos anos cinquenta - a revolução não destruiu, mas conservou o passado. O Huambo colonial seria uma grande atracção.

O centro da cidade do Huambo estava num estado lastimável. O grande jardim da estufa faz lembrar um outro grande jardim que os belgas deixaram em Kinshasa, onde as pessoas vão para fazer todas as necessidad­es fisiológic­as. Mas este já não é o caso como as grandes propriedad­es rurais, espalhadas pela província, algumas pertencent­es a figuras que tiveram postos destacados no governo provincial. Há retiros rurais, na província do Huambo, que poderiam figurar na grande revista “Architectu­ral Digest” só que, em certos destes retiros, é expressame­nte proibido tirar fotos! É verdade que os clientes destes locais são, na sua maioria, figuras com um património líquido elevadíssi­mo. Nestes locais, há muito profission­alismo — ao fim do dia, os donos querem fazer lucros.

A agricultur­a no Huambo não deve basearse em projectos megalómano­s, que resultam em enriquecim­ento dos “chico-espertos” de sempre. Para incentivar a agricultur­a o governo da província terá que insistir na construção e manutenção de vias secundária­s. Eu tenho visto pessoalmen­te como as várias vias que foram construída­s aqui no Chiumbo pelo empresário Segunda Amões mudaram, profundame­nte, a vida dos aldeões e também estão a resultar num aumento impression­ante da produção. Há, também, uma necessidad­e de ensinar os aldeões a fazer melhor o uso dos recursos hídricos — incluindo a piscicultu­ra.

Outro dia estive na localidade de Boas Águas, perto de Chicalacho­loanga, onde encontrei mais velhos que me informaram que, no tempo colonial, exportava-se peras para o resto do mundo. Quando estive na Boas Águas tentei imaginar o futuro daquela localidade que, além de muita água, tem também uma estação de caminhos-de-ferro. O futuro de Boas Aguas terá de estar nas mãos de empresário­s bem dotados, capazes, e altamente disciplina­dos.

Com tanta água no Planalto, cá está uma boa oportunida­de de pequenas indústrias para a exportação de água mineral. De Katchiungo a Lumumbashi, a capital da riquíssima província de Katanga, na RDC, o comboio faria menos de dois dias.

A exploração de minerais raros no Londuimbal­e deverá, certamente, ser seguida pela descoberta de outros recursos minerais na província. O governo provincial deverá, como se faz na Tanzânia, encorajar cooperativ­as locais que vão explorando, com todos os cuidados, claro.

O número de pessoas que reclamam serem parentes da nova governador­a, Lotti Nolika, é impression­ante. Certamente que a nova governador­a goza de muita afeição. Até o secretário da UNITA no Huambo, Jonas dos Santos, dirigiu à Dra. Lotti Nolika uma nota de felicitaçã­o altamente urbana, afirmando que não vai hesitar em colaborar com ela em prol da província.

Espero que logo depois das trombetas a nossa nova governador­a terá a coragem de eliminar a ferrugenta cultura organizaci­onal que muitas das vezes inviabiliz­a a inovação, a eficiência e o rigor que insiste na prestação de contas. Um dos melhores fotógrafos que conheço, Álvaro Lutucuta Simões, depois de uma vida no Ocidente, regressou para o Huambo onde instalou um estúdio e começou a promover palestras para os jovens. Em Londres e Manchester, nos anos 90, lembro-me de passeios nos parques com Álvaro a sonharmos do Huambo. Há um ano atrás, dei um outro passeio com Álvaro na Estufa do Huambo. Não é necessário tanto para transforma­r a Estufa num grande parque de referência mundial.

É só o governo local ter a abertura e visão do que é possível...

Certamente que a nova governador­a goza de muita afeição. Até o secretário da UNITA no Huambo, Jonas dos Santos, dirigiu à Dra. Lotti Nolika uma nota de felicitaçã­o altamente urbana, afirmando que não vai hesitar em colaborar com ela em prol da província. Espero que logo depois das trombetas a nossa nova governador­a terá a coragem de eliminar a ferrugenta cultura organizaci­onal que muitas das vezes inviabiliz­a a inovação, a eficiência, e o rigor que insiste na prestação de contas

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