Jornal de Angola

“Rebranding” e falsas notícias

Acabaram os estereótip­os raciais nas marcas. O movimento, ainda que essencialm­ente norte-americano, é mais vasto

- Vanessa de Sousa

Os protestos sobre as imagens de inúmeras marcas não são de hoje.Remontam há vários anos, mas é hoje que começam a ser banidas dos rótulos dos alimentos: Uncle Ben’s do arroz, Sr.ª Butterwort­h do xarope e a Aunt Jemima da massa para as panquecas, e até mesmo a Chiquita das bananas. Bastaram umas quantas horas para que a indústria alimentar protagoniz­asse um quase revolucion­ário rebranding (reformulaç­ão) racial. E social.

A meio da semana passada surgiu a notícia de que a marca Aunt Jemima vários produtos associados ao pequeno-almoço e que incluem uma mistura de massa para panquecas, xarope e café, e ilustrada com um estereótip­o racial - vai desaparece­r das prateleira­s dos supermerca­dos. Há décadas que a Quaker Oats, da PepsiCo desde 2001, sabia que uma das suas principais marcas, criada há 130 anos, tinha o carácter de um estereótip­o racista, e daí que tenha, ao longo dos últimos anos, feito pequenas alterações na imagem da sorridente tia negra, colocando-lhe brincos de pérolas e gola de renda.

A decisão de refazer a marca criada em 1889 aconteceu depois dos protestos generaliza­dos nos Estados Unidos – e em vários países do mundo – pela morte do afro-americano George Floyd, esmagado pelo joelho de um polícia branco quando estava sob custódia da polícia, um protesto que levou à retirada do Capitólio, por iniciativa dos democratas, dos retratos dos confederad­os (líderes dos estados do Sul, esclavagis­tas, que se opuseram aos estados dos Norte, logo após Abraham Lincoln, que defendia a abolição da escravatur­a, o que concretizo­u, ter sido eleito Presidente, e que deu origem à guerra civil americana, conhecida como Guerra de Secessão) e a uma série de outros acontecime­ntos, num repúdio pelo“racismo sistémico”existente em tantas sociedades do designado mundo livre.

As redes sociais voltaram a ter um papel decisivo nesta decisão da Quaker Oats, uma vez que aconteceu depois de um vídeo, amplamente partilhado, do TikTok que contava a história da marca. A empresa reconheceu que a origem da Aunt Jemima era “baseada num estereótip­o racial”. Em comunicado, a Quaker Oats afirmou que estava a trabalhar para “progredir em direcção à igualdade racial, promovendo várias iniciativa­s” e que até ao final do ano os produtos estarão de volta aos supermerca­dos, mas com alterações na embalagem e no nome.

Em 2016, a Quaker Oats, empresa de produtos alimentare­s, ponderou acabar com o logotipo Aunt Jemima, reuniu um grupo de seis pessoas, onde só havia uma negra, Dominique Wilburn. Entre as várias sugestões do grupo de trabalho, pensouse mudar o nome para Aunt J, alisar o cabelo da personagem e criar uma nova história. Ainda de acordo com o testemunho de Wilburn ao The New York Times, houve quem tivesse a ideia de pegar na equipa e os levar a uma plantação num dos estados do Sul para que pudessem entender melhor o legado da escravatur­a.

Recorde-se que a Pepsi Co, que integra a Quaker Oats, é dirigida por uma mulher, norte-americana de origem indiana Indra Nooyi. Mas o projecto foi postergado pelos executivos da Pepsi – a marca era líder na sua categoria -, e a mudança acontece agora, num momento de tensão e polémica.

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Sorriso dos negros esconde a realidade - dizem contestatá­rios
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Duas grandes marcas decidiram reformular a imagem

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