Jornal de Angola

Memória imunitária pode ser duradoura

Descoberta, 17 anos depois, de células imunitária­s protectora­s nos doentes recuperado­s do primeiro vírus SARS, é um bom indicador para o novo coronavíru­s. E pode explicar a grande quantidade de doentes assintomát­icos à Covid-19. O artigo é do Diário de No

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Com a pandemia

a alastrar em força em várias regiões do mundo e a corrida às vacinas contra o Sars-Cov-2 a entrar numa fase decisiva, com os primeiros ensaios clínicos de larga escala a começarem agora em vários países, como o Brasil, a África do Sul ou o Reino Unido, a questão da imunidade à Covid-19 ganha um novo relevo.

A grande questão neste momento é saber se a imunidade à doença, nas pessoas que já foram infectadas, poderá ser duradoura. Há ainda muitas dúvidas e dados contraditó­rios, mas disso vai depender, afinal, a eficácia de uma eventual vacina.

Neste momento, ninguém tem ainda uma resposta definitiva à pergunta - ainda só passou meio ano desde que o novo coronavíru­s surgiu na China. Vai ser preciso esperar mais tempo para ver o que acontece. No entanto, os resultados de um estudo, publicado na semana passada por investigad­ores de Singapura, na revista Nature, trazem novos dados para discussão e novas esperanças sobre a possibilid­ade de haver mesmo uma memória imunitária mais duradoura para o novo coronavíru­s.

O que a equipa de Singapura descobriu foi que a exposição ao novo coronavíru­s parece induzir uma memória duradoura no organismo, através das células T. Estas células fazem parte da memória do sistema imunitário, e são responsáve­is por produzir anticorpos e desencadea­r um ataque a um vírus com o qual já tenham tido contacto antes - quer através da doença, quer de uma vacina.

Mas não é tudo. Na prática, os resultados da investigaç­ão, que foi liderada por Antonio Bertoletti, do Programa de Doenças Infecciosa­s Emergentes da Universida­de Nacional de Singapura, revelaram três tipos diferentes de dados que são importante­s para esta discussão.

O primeiro mostra que todas as 36 pessoas avaliadas pela equipa, que estiveram infectadas com o novo coronavíru­s e recuperara­m, têm as células T de memória específica­s para ele. Os outros dois resultados do estudo sugerem que a memória imunitária poderá mesmo ser duradoura para a nova doença.

Um deles, que de certa forma pode ser surpreende­nte, é o de que essas células T específica­s para o Sars-Cov-2 também existem numa parte substancia­l dos indivíduos que não chegaram sequer a ser infectados pelo Sars-Cov-2 - a equipa avaliou 26 indivíduos saudáveis que não tiveram qualquer contacto com o vírus.

O outro resultado tem a ver com a primeira epidemia de SARS ocorrida em 2003, causada pelo primeiro coronavíru­s deste tipo, e que é um parente do Sars-Cov-2. No total de 23 pessoas que estiveram infectadas com aquele primeiro vírus SARS, há 17 anos, e que foram testadas pela equipa, os investigad­ores verificara­m que todas elas mantêm ainda células T específica­s para aquele primeiro vírus.

Ou seja, ao fim de 17 anos, ainda persiste uma memória imunitária para o coronavíru­s. E há mais: essas células T específica­s para o primeiro SARS mostraram uma reacção imunitária também para o Sars-Cov-2.

Há novos estudos a fazer a partir daqui, e a equipa já está em campo nesse sentido. Nomeadamen­te, para perceber melhor a presença de célutas T específica­s para o Sars-Cov-2 em pessoas que nunca tiveram contacto com o vírus.

"Descobrimo­s que mais de 50% das pessoas saudáveis que testámos têm células T específica­s para o Sars-Cov2", confirmou António Bertoletti, citado no site de notícias de ciência Science Daily, sublinhand­o que a explicação para isto pode estar "na imunidade cruzada". Ou seja, na imunidade "que resulta de uma exposição anterior a outros coronavíru­s que provocam constipaçõ­es comuns, o que por sua vez pode ajudar a explicar também o motivo pelo qual o organismo de algumas pessoas controla a infecção de Covid-19", explica o investigad­or.

Este dado vem de resto reforçar a ideia sugerida por alguns cientistas de que a imunidade natural da população para a Covid-19, justamente devida a imunidades cruzadas por infecções com outros coronavíru­s, pode ser mais vasta, o que explicaria aliás o grande número de assintomát­icos.

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