Pensar na Covid-19
A pandemia da Covid-19 afecta transversalmente todas as facetas da existência humana - isolamento social, recessão económica, desemprego ou possibilidade de desemprego e a própria ansiedade em relação à contaminação, são alguns dos factores que acometem o nosso dia-a-dia nos últimos meses. De forma sistemática, questões como a extensão da quarentena, a abertura das actividades comerciais e respectivas regras são introduzidas na agenda e parecem perdurar, dada a incerteza do aparecimento de uma vacina. Assim, parecem ainda indispensáveis e actuais o conjunto de medidas a adoptar relativamente à abertura de espaços, controlo de temperatura e de capacidade, etc.
Dados da ONU (Organização das Nações Unidas) referem que a Pandemia de Covid-19 pode agravar a desnutrição no planeta e afectar cerca de 265 milhões de pessoas em países já em crise alimentar, como a República Democrática do Congo, Iémen, Afeganistão, Venezuela, Sudão do Sul, Etiópia, Síria, Haiti e Nigéria. A ONU alerta ainda que a comunidade internacional tem de agir rapidamente no sentido de se garantir o acesso a alimentos, evitar a interrupção dos financiamentos dos países, evitando os cortes das cadeias de fornecimento.
Decorridas duas décadas desde o início do milénio, está claro que o mundo não será o mesmo e que a pandemia do SARS Covid-19 vem acelerar a concretização de novas tendências, iniciadas, sobretudo, a partir da crise financeira mundial, como o surgimento dos nacionalismos, com Trump (“make America great again”), o retorno da proliferação de políticas proteccionistas dirigidas a sectores, o que se prefigura como preocupante para o desenvolvimento saudável do comércio internacional.
Por outro lado, assiste-se ao enfraquecimento do multilateralismo e à desmundialização/desregionalização da economia, em que as cadeias produtivas estabelecidas na China fazem agora o movimento contrário de retorno a casa (onshoring) ou de fixação noutras regiões do globo (reshoring), com o pretexto de melhorar o nível de segurança face à dependência excessiva do país asiático.
Ficou patente, com a pandemia, o nível de dependência (extrema) das economias ocidentais face à chinesa, bem como os constrangimentos ocorridos no período da crise, como o rompimento da cadeia de produção e a ineficácia dos sistemas logísticos chineses em relação ao fornecimento de bens e equipamentos para a economia mundial. Assim, o Japão abriu recentemente uma linha de crédito bilionária, dirigida às empresas japonesas, para que as mesmas retornem ao país ou deslocalizem parte da cadeia de produção para outras zonas.
Essas medidas reactivas visam não só a redução da exposição face à economia do “País do Sol Nascente”, mas, sobretudo, garantir a criação de novos postos de trabalho e a redução das taxas de desemprego existentes, para a melhoria da competitividade.
Nunca é demais referir que os períodos de crise são momentos ideais para recentrar as ideias, criar novos projectos, repensar e fazer melhor. O ministro da Economia francês afirmou, recentemente, que vê a epidemia como uma oportunidade de mudança da globalização, face à vulnerabilidade das cadeias de fornecimento demonstradas no início da epidemia, um acontecimento que expôs as fragilidades das práticas actuais, que, segundo o governante gaulês, revelam uma dependência “irresponsável e irracional” em relação à China.
Nunca é demais referir que os períodos de crise são momentos ideais para recentrar as ideias, criar novos projectos, repensar e fazer melhor