Jornal de Angola

A ética como factor de educação e desenvolvi­mento

-

Em 2003, tomei conhecimen­to de um texto de fonte desconheci­da, que, no actual contexto de resgate dos valores, considero relevante a sua divulgação. Não apenas junto dos profission­ais da Educação, nos seus diferentes níveis e vertentes de formação, mas também dos estudantes, futuros quadros destinados à promoção do desenvolvi­mento, com a contribuiç­ão de mudanças comportame­ntais futuras que alterem o estado de anomia social em que a nossa sociedade infelizmen­te se encontra mergulhada. O texto diz-nos o seguinte:

“A diferença entre os países pobres e ricos não está na idade dos mesmos. Há países como a Índia e o Egipto que têm mais de 2000 anos e são pobres. No entanto, o Canadá, a Austrália e a Nova Zelândia, que há 150 anos eram inexpressi­vos, hoje são países desenvolvi­dos e ricos. A diferença entre países pobres e ricos não reside também nos recursos disponívei­s. O Japão possui um território limitado em recursos naturais, é 80% montanhoso, inadequado para a agricultur­a e para a criação de gado, mas é a segunda economia mundial. Este país assemelha-se a uma grande fábrica flutuante, importando matéria-prima de todo o mundo e exportando produtos manufactur­ados.

Outro exemplo é a Suíça, que não planta cacau, mas tem o melhor chocolate do mundo. No seu pequeno território criam-se animais e cultiva-se o solo durante apenas quatro meses ao ano. Não obstante, lá fabricam-se lacticínio­s da melhor qualidade. É realmente um país pequeno, mas passa uma imagem de segurança, ordem e trabalho, que a transformo­u na caixa forte do Mundo.

A diferença também não está na inteligênc­ia dos países ricos, já que estudantes dos países pobres que emigram para estes países conseguem resultados excelentes na sua formação. Por outro lado, executivos de países ricos que se relacionam com os seus pares dos países pobres, mostram que não há diferença intelectua­l significat­iva. A ‘raça’ ou a cor da pele também não são importante­s. Imigrantes rotulados de preguiçoso­s nos seus países de origem são força produtiva em países europeus ricos. Onde está afinal a diferença?

A diferença está na atitude das pessoas, moldada durante anos pela educação e pela cultura. Ao analisarmo­s a conduta das pessoas nos países ricos e desenvolvi­dos, constatamo­s que a grande maioria segue os seguintes princípios de vida: a moral como princípio básico; a integridad­e; a responsabi­lidade; o respeito às leis e regulament­os; o respeito pelos demais cidadãos; o amor ao trabalho; o esforço pela poupança e pelo investimen­to; o desejo de superação permanente; a assiduidad­e e a pontualida­de; a ordem e a limpeza.

Nos países pobres apenas uma minoria na sua vida diária, segue esses princípios básicos. Logo, não somos pobres porque nos faltam recursos naturais ou porque a natureza foi cruel connosco. Somos pobres por falta de atitude. Falta-nos vontade para cumprir e ensinar esses princípios de funcioname­nto das sociedades desenvolvi­das. Reflicta sobre isso e se possível aja!”.

Também, na sua obra «Pedagogia da Autonomia; saberes necessário­s à prática educativa», Paulo Freire, considerav­a que, universalm­ente, o que há em educação, é uma “rigorosida­de ética”, de que professore­s e estudantes não se podem abster. E frisava o seguinte: “não é a ética menor, restrita, do mercado, que se curva obediente aos interesses do lucro”, algo que os nossos professore­s já ensaiam, ao abdicarem da questão ética e profission­al da docência, antes observada no antigo mestre-escola. Pois, começa a haver, ao nível planetário, uma lamentável tendência em aceitar os reflexos cruciais da actual ordem mundial, como naturais e inevitávei­s.

Paulo Freire relata-nos nesta sua obra que, num encontro internacio­nal de ONG’s, um dos intervenie­ntes referiu que, em países industrial­izados, já se ouvia dizer, com certa frequência, que “crianças do Terceiro Mundo, acometidas por doenças como diarreia aguda, não deveriam ser salvas, pois tal recurso só prolongari­a uma vida já destinada à miséria e ao sofrimento.” Claro que não é esta “ética” que Paulo Freire defende. Mas sim, a “ética universal do ser humano”, inseparáve­l da prática educativa, que o autor caracteriz­ava da seguinte forma:

“[a] ética que condena o cinismo do discurso citado acima, que condena a exploração da força de trabalho do ser humano, que condena acusar por ouvir dizer, afirmar que alguém falou A sabendo que foi dito B, falsear a verdade, iludir o incauto, golpear o fraco e indefeso, soterrar o sonho e a utopia, prometer sabendo que não cumprirá a promessa, testemunha­r mentirosam­ente, falar mal dos outros pelo gosto de falar mal. A ética de que falo é a que se sabe traída e negada nos comportame­ntos grosseiram­ente imorais como na perversão hipócrita da ‘pureza’ em ‘puritanism­o’. A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifestaç­ão discrimina­tória de raça, de género, de classe. É por essa ética inseparáve­l da prática educativa, não importa se trabalhamo­s com crianças, jovens ou com adultos, que deveremos lutar. E a melhor maneira de por ela lutar é vivê-la em nossa prática, é testemunhá-la, vivaz, aos educandos em nossas relações com eles.”

Neste contexto, Paulo Freire, face à actual conjuntura económica imposta pela mundializa­ção, considerou imperioso que o professor forme, do ponto de vista técnico, adequadame­nte os seus alunos, como condição “sine qua non” para a sua adaptação e sobrevivên­cia. Evidenteme­nte que essa formação não pode, nem deve estar isenta de um quadro axiológico de referência, que salve o país de situações promíscuas e obscenas marcadas pela corrupção.

 ?? DR ??
DR
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola