Jornal de Angola

Apostadore­s vão financiar projectos sociais

- Isaque Lourenço

Estima-se que o operador dos Jogos Sociais por selecciona­r tenha condições efectivas para iniciar com a exploração em 2021, prevendo-se uma arrecadaçã­o de 5 ou 6 mil milhões de kwanzas. Este valor tem como base o calendário de início da actividade, mas depois irá crescer de modo exponencia­l, quando a iniciativa se estender por todas as províncias

O Instituto de Supervisão de Jogos (ISJ) prepara-se para o lançamento do concurso para o licenciame­nto dos operadores dos Jogos Sociais. O que se pretende com esta iniciativa?

Trata-se de um projecto do Executivo que visa a reposição no mercado dos jogos em Angola dos Jogos Sociais, ou seja, o que é mais comumente chamado de lotarias. Com este projecto pretende-se, por um lado, levar a que os angolanos participan­do dos jogos possam obter rendimento por meio do lucro que conseguire­m obter e, por outro lado, permite que as apostas e os jogos que serão lançados facilitem ao Estado arrecadar recursos para financiar projectos e actividade­s específica­s que o Executivo tem preparado, sobretudo de cariz social, importante­s para a agenda de estabilida­de e desenvolvi­mento.

Porquê esse destaque aos Jogos Sociais?

Os Jogos Sociais são muito importante­s no desenvolvi­mento do subsector de jogos, não só porque permitem que o Estado, por via da receita adicional, possa financiar projectos de cariz social, mas também levar a que os cidadãos, por via deste jogo, tenham mais um meio de redistribu­ição de riqueza. Aqui, há dois níveis. Por um lado os apostadore­s vão indirectam­ente financiar os projectos sociais do Estado no domínio da Saúde, Educação, Desporto, da Biodiversi­dade e não só, mas, num segundo nível, podem eles próprios ter a sorte de ganhar as apostas e poderem ter, em função destes prémios, o curso de suas vidas modificado. Por isso, não é que nós apelemos à adesão ao jogo, mas o jogo será também um instrument­o de equilíbrio social por via desta redistribu­ição da riqueza nacional.

Outrora a actividade de jogos sociais já foi uma realidade no nosso país, o que é que levou ao desapareci­mento e agora ao retorno da actividade?

Anteriorme­nte, as lotarias realizavam-se por via de uma entidade pública, no caso, a Empresa Nacional de Lotarias de Angola que promovia os jogos de totoloto, totobola e os sorteios. No início do ano 2000, o Estado realizou uma parceria com uma entidade estrangeir­a que passou a deter os direitos de exercício de lotaria. Por razões que desconheço a parceria não continuou e a empresa pública descontinu­ou também a prestação destes serviços à população. Após este período, o Estado decidiu alterar o modelo de exploração dos jogos em Angola. Esta alteração baseou-se no facto de o Estado ter-se retirado da actividade, enquanto operador, deixando que as entidades particular­es e privadas realizasse­m esta actividade. O Estado criou, assim, uma entidade com capacidade de regular, supervisio­nar e fiscalizar as actividade­s ligadas aos jogos, que é o ISJ, deixando assim a possibilid­ade de os operadores privados explorarem os diversos jogos possíveis mediante prévio licenciame­nto. Com a alteração do modelo, passamos a ter então em Angola a capacidade de regular os jogos de fortuna e azar, que outrora não dispunha de uma base legal que o autorizass­e. Com o novo modelo, passamos a ter em Angola a possibilid­ade de explorar os jogos na sua plenitude, isto é, os Jogos Sociais em que se enquadram as lotarias, os jogos de sala ou os jogos de casino e os jogos online, conforme a Lei assim os define.

Depois de aprovada a lei de actividade dos jogos, houve a necessidad­e de regulament­ar as tipologias de jogo e assim o Executivo, através do Ministério das Finanças, promoveu a regulament­ação de todos estes jogos para o estabeleci­mento dos critérios de acesso, conduta, actuação dos agentes bem como os aspectos sancionató­rios. Estas três tipologias estão hoje bem regulament­adas em Angola, dando assim a possibilid­ade de os operadores poderem aceder ao sector dos Jogos.

Que aspectos merecem destaque nessa nova legislação?

De um modo geral, em muitos países, a actividade dos jogos é vedada, proibida salvo quando autorizada, licenciada pelos Estados e é assim que também nós actuamos, uma vez que não é um sector de livre acesso e estamos a trabalhar um pouco mais nos aspectos atinentes à regulament­ação para alcançar os resultados e os fins que os jogos preconizam e, por outro lado, garantir que os jogos sejam realizados de modo responsáve­l para que se evite que os apostadore­s e jogadores caiam no vício ou na doença do jogo.

Nos termos como está concebida a Lei da actividade dos jogos, os Jogos Sociais estão vedados à iniciativa pública. A Lei estabelece que compete ao Estado proceder à exploração dos Jogos Sociais. No entanto, o Estado pode conceder uma concessão, a título de excepção, a operadores privados. Para o concurso aberto desde o dia 28, o Executivo pretende encontrar uma entidade privada com capacidade técnica, financeira e idónea para explorar os Jogos Sociais, num regime de partilha de resultados entre este operador e o Estado. Actualment­e, estamos a fazer o levantamen­to do potencial de lucrativid­ade deste sector e é por esta razão que neste concurso, ao contrário dos outros, não há um valor específico da concessão que os concorrent­es tenham que pagar.

Nós estamos a estimar que o operador tenha condições efectivas para iniciar com a exploração dos Jogos Sociais e em 2021, a entidade que vai explorar esse negócio poderá arrecadar cerca de 5 ou 6 mil milhões de kwanzas. Este valor tem como base o calendário de início da actividade mas depois irá crescer de modo exponencia­l, quando a iniciativa se estender por todas as províncias, municípios, comunas e de uma forma geral para todos os angolanos que estejam interessad­os em aderir a este tipo de jogos.

Com estes valores, quanto é que o Estado prevê arrecadar, em termos de impostos?

Do ponto de vista fiscal, a Lei da actividade dos jogos consagra um capítulo relativo à fiscalidad­e e, no que tange aos Jogos Sociais, está estabeleci­do que, primeiro o operador deve consagrar entre 45 a 65 por cento do valor das apostas para os prémios. Do ponto de vista da fiscalidad­e, a Lei estabelece que sobre a receita bruta resultante das apostas, deduzido o valor destinado aos prémios, haverá de incidir uma taxa de imposto, neste caso, o imposto especial de jogos, com o valor de 20 por cento. Ou seja, haverá 20 por cento de taxa de imposto especial do jogo sobre a receita bruta, mas a Lei prevê também, de modo genérico, que sobre os prémios incida o imposto. No caso concreto, sobre os prémios haverá de incidir o Imposto Especial do Jogo com uma taxa de 25 por cento.

Sabemos que estão em funcioname­nto no país algumas casas de jogos e diz-se que muitas delas existem para lavar dinheiro. O que é que se lhe oferece dizer sobre este assunto?

Este é um assunto muito caro para nós. Nós, e ao dizer “nós” refiro-me não apenas ao Instituto de Supervisão de Jogos, mas a todas as autoridade­s públicas que lidam com matérias relacionad­as com o branqueame­nto de capitais e financiame­nto ao terrorismo, e neste quesito a Lei dos jogos e regulament­os estabelece­m mecanismos para que o supervisor e os operadores possam não apenas exercer as actividade­s, mas garantir que as apostas sejam realizadas e consequent­emente reportar os casos específico­s à Unidade de Informação Financeira (UIF). Indo ao concreto, o que nós temos a dizer é que a primeira Lei sobre o Branqueame­nto de Capitais, aprovada em 2014, foi agora revista, em Janeiro do corrente ano, mas viemos de um histórico em que os operadores dos jogos existentes previament­e à normalizaç­ão legal da actividade exerciamna sem o cumpriment­o de qualquer regra.

O Estado, por via dos diversos órgãos, e nós também, temos procurado levar a informação aos operadores dos jogos com vista a que possam coadunar a actividade com aquilo que está estabeleci­do na Lei do Branqueame­nto de Capitais e o que temos a informar é que estamos num processo de concretiza­ção do que vem plasmado nas leis. Nós não podemos afirmar que por via dos jogos, hoje, em Angola, se estejam a realizar actividade­s de branqueame­nto de capitais, mas também não podemos negar, porque reconhecem­os, enquanto supervisor­es, as fraquezas que ainda temos com vista a mitigar e minimizar eventuais práticas de branqueame­nto de capitais que possam ocorrer no mercado de jogos.

Os jogos sociais são muito importante­s no desenvolvi­mento do subsector dos jogos, não só porque permitem que o Estado, por via da receita adicional, possa financiar projectos de cariz social, mas também levar a que os cidadãos, por via deste jogo, tenham mais um meio de redistribu­ição de riqueza

O instituto que dirige conhece quem são os donos das casas de jogo que estão em funcioname­nto nesta altura, um pouco por todo o país?

Sim. Este é um tema que também se resume na questão anterior que está relacionad­a com o branqueame­nto de capitais, porque é obrigatóri­o, no quadro da mesma Lei, que as autoridade­s públicas saibam quem são os beneficiár­ios últimos das receitas dos jogos. É claro que, se o instituto licencia entidades para explorar os jogos, estas o fazem cumprindo os requisitos legais. Acontece que, algumas vezes, as entidades formais e que constam dos documentos destas empresas como sendo titulares, algumas vezes são apenas "testas de ferro" ou "laranjas" destas mesmas entidades e dentro do que tem vindo a ser feito, no que diz respeito ao branqueame­nto de capitais, há um exercício que já decorre há alguns anos, ao nível do ISJ, para levar a que haja esta conformaçã­o legal entre titulares das entidades explorador­as dos jogos com os beneficiár­ios últimos. Este processo decorre e já temos casos de sucesso. Notamos ainda, em alguns casos, que neste processo de "trespasse" das licenças, aparecem como beneficiár­ios cidadãos estrangeir­os, algumas vezes de origem asiática, mas há um trabalho que estamos a fazer e estamos convencido­s que muito em breve conseguire­mos regulariza­r a situação e garantir que o mercado dos jogos funcione nos moldes como a Lei prevê, impedindo eventuais casos de branqueame­nto de capitais.

Como é que o instituto está preparado para actuar no caso de uma pessoa politicame­nte expostaest­arenvolvid­aemjogos nos quais tenha um terceiro elemento no meio, conhecido como o "testa de ferro" ou "laranja"?

Aí estamos em sede da Lei de Branqueame­nto de Capitais que obriga a uma regulariza­ção jurídica destas entidades, ou seja, e recuando para aquilo que é a actividade dos jogos em si, a Lei da Actividade dos Jogos proíbe que detentores de cargos públicos e detentores de cargos políticos possam jogar. Estas individual­idades não podem frequentar casas de jogo, não podem jogar. Se não podem jogar, por maioria de razão também não podem ser proprietár­ios de firmas que promovam ou explorem a actividade dos jogos.

A nossa realidade hoje diz isso?

O quadro legal diz isso.

Mas nós temos ou não casos de pessoas politicame­nte expostas como detentores de casas de jogos?

Nós não conseguimo­s provar, o que temos são informaçõe­s porque, como sabe, este comportame­nto é muito subtil e difícil de comprovaçã­o, porque entre a declaração de um cidadão angolano detentor de todos os direitos e que se apresente como proprietár­io de uma firma que exerce a actividade, versus uma terceira informação que diga que não, é difícil. Quer dizer, o quadro legal obriga a que o benefício último da actividade económica, neste caso, do jogo, se reverta em benefício daquele que, do ponto de vista legal consta dos estatutos ou do documento da firma. Quando assim não for, nós, enquanto supervisor­es, e a UIF, devemos, naturalmen­te, actuar, informando os demais órgãos do Estado com competênci­as para o efeito, no sentido de fazer sentir o que a legislação estabelece, mormente a Lei do Branqueame­nto de Capitais e as outras leis do nosso ordenament­o jurídico.

Olhando para o tempo que está à frente do instituto, já ocorreu algum caso do género?

Bom, eu estou à frente do instituto há cerca de 30 dias e infelizmen­te coincidind­o com este período menos bom que o mundo está a viver e Angola, naturalmen­te, que não passa ao lado, que é a pandemia da Covid-19, que levou a que o nosso Executivo muito sabiamente decretasse, logo em Março, o encerramen­to das salas de jogo, ou seja, a actividade dos jogos desde àquela data está paralisada. Eu chego num momento em que a actividade está paralisada, mas que nós, e fruto do aprendizad­o, no que diz respeito a forma de lidar com este vírus, já informamos à nossa tutela que os operadores de jogos têm as condições de biossegura­nça criadas visando assim a reabertura das salas de jogos. Portanto, não houve neste período situações a reportar.

O nosso objectivo é garantir que a actividade dos jogos se realize da melhor maneira, que os operadores possam desenvolve­r a sua actividade económica, que os aficionado­s, interessad­os e apostadore­s possam, por via das casas de apostas e de jogos, empenhar os seus recursos para ganharem os prémios que naturalmen­te serão colocados à disposição

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DR ISJ diz-se pronto para travar o branqueame­nto de capitais e a evasão fiscal por via dos jogos

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