Jornal de Angola

O enigma da tartaruga de estimação de Darwin

Viveu 175 anos, “mudou” de sexo e de Harry fez-se Harriet. A tartaruga-gigante-das-galápagos tornou-se lenda por ser tida como o animal de estimação de Charles Darwin. História com inúmeras contradiçõ­es e reviravolt­as

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Em Junho de 2006, um episódio de insuficiên­cia cardíaca ditava o último suspiro de Harriet. O coração da tartaruga-gigante-das-galápagos, com perto de 180 quilos, batera por 175 anos. Há décadas que o réptil atraía dezenas de milhares de visitantes ao Australia Zoo, no estado de Queensland. O estrelato de Harriet não cunhava trunfos apenas na sua nobre idade que a tornava, na época, a criatura mais velha do planeta. A tartaruga, nascida em 1830, no arquipélag­o do Pacífico, era, de acordo com o anunciado pelo zoo, um elo directo com um dos construtor­es da nossa memória colectiva. Harriet, criatura sobreviven­te a três séculos, teria sido a tartaruga de estimação do naturalist­a Charles Darwin, pai da teoria da evolução das espécies.

O naturalist­a, no périplo mundial que iniciou em 1831, a bordo do navio HMS Beagle, visitara as ilhas Galápagos, em 1835. O arquipélag­o, hoje reserva de vida selvagem, administra­do pelo Governo do Equador, é casa das tartarugas da espécie Geochelone Nigra.

Darwin, a par do capitão do Beagle, Robert FitzRoy, acolheu quatro juvenis daquela espécie. A bordo do navio expedicion­ário, as tartarugas completari­am a ronda mundial, atravessan­do os oceanos Índico e Atlântico, com escalas, entre outros território­s, em Taiti, Nova Zelândia, Austrália, África do Sul e Brasil. Já em Inglaterra, o jovem Darwin, cismando nas bases para a sua obra maior, A Origem das Espécies, que publicaria em 1859, adoptaria como animal de estimação uma das tartarugas capturadas. Não a deixou sem nome. James, em homenagem à ilha onde havia sido capturada (actual ilha de Santiago) passou a fazer parte da rotina doméstica de Darwin.

Chegado o ano de 1841, Charles Darwin entregava a sua tartaruga de estimação, assim como outro exemplar à guarda de Syms Covington (ajudante de cabina a bordo do Beagle), a John Wickham, antigo companheir­o de viagem e primeirote­nente do navio expedicion­ário. Wickham regressava à Austrália e, com ele, mais uma viagem transoceân­ica para as tartarugas. Abre-se novo capítulo no enredo. Nos antípodas, James e o companheir­o

réptil conheciam nova casa. Antes de retornar à Europa, em 1860, Wickham doa as tartarugas ao zoológico do Jardim Botânico de Brisbane. Ali, James haveria de se tornar Harry, em homenagem a Harry Oakman, impulsiona­dor da criação do zoo.

Já como lenda viva, a tartaruga-gigante, que por mais de cem anos fora identifica­da como macho, era afinal fêmea. Na década de 1960, Harry tornava-se

Harriet. Em 1987, após uma estada no Parque da

Vida Selvagem

David Fleay, criado por David Fleay, pioneiro na reprodução de ornitorrin­cos em cativeiro, a tartaruga conhece a sua última casa no Australia Zoo.

A narrativa da velha Harriet, animal estimado por Darwin, não é, contudo, uma viagem tão linear como se acreditava. Nos anos de 1990, estudos ao ADN mitocondri­al do réptil revelaram que Harriet pertencia à subespécie Geochelone Nigra Porteri, originária da ilha de Santa Cruz, nas Galápagos, território não visitado pela expedição em que participou Darwin.

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