Jornal de Angola

As nossas elites

- Adebayo Vunge

Parece-nos consensual que um dos problemas que justifica o atraso dos países africanos tem a ver com as suas elites. Em todas as suas dimensões, ou seja, políticas, económicas, sociais, militares e até religiosas. E sem que seja necessário olharmos para outros países vizinhos, Angola é disso uma realidade. Faltanos patriotism­o e nacionalis­mo… não aqueles dos discursos vazios que não cabem na prática e na realidade que todos assistimos. Há um incontido egoísmo de tal modo que as elites têm exclusiva necessidad­e de olhar para o seu umbigo, movidas geralmente pelos interesses económicos e financeiro­s. As elites africanas, longe do sentido de missão, têm a tendência de procurar todos os meios para perpetuare­m-se no poder. Não se importam de, contra a vontade de tudo e de todos, muitas vezes mesmo dos seus correligio­nários, procurarem engenharia­s legais para fundamenta­rem a sua perpetuaçã­o no poder. Pretendem o melhor dos dois sistemas: ora querem repúblicas democrátic­as ora querem comportar-se como soberanos membros de uma aristocrac­ia ao estilo medieval. Essa tendência para a perpetuaçã­o é sentida em vários níveis. De Presidente­s a ministros. De deputados a dirigentes associativ­os. De líderes religiosos até simples directores de escolas, administra­dores municipais e governador­es provinciai­s. Todos querem perpetuar-se no poder, procuram engenharia­s e alianças para o efeito, mas ignoram o que é essencial. O mandato para o qual os eleitores (ali onde estes são minimament­e tidos em conta) lhes conferiram para ajudar a resolver os problemas da colectivid­ade. Quando há cerca de duas semanas começaram a surgir à tona os incidentes de Cafunfo, na província da Lunda-Norte, interrogue­i-me sobre o papel dos líderes locais. O que foi feito, o que é feito, o que está de facto feito para a melhoria da condição de vida das pessoas. Que orgulho têm os governador­es e administra­dores quando olham para a realidade das suas populações. Ano sai, ano entra, o que é feito para melhorar a vida das pessoas. Que problemas ficam efectivame­nte resolvidos e para trás... ou estes vão simplesmen­te amontoando-se? Só posso por isso concordar com a frase do ministro do MAT. Parecia desproposi­tada, mas neste contexto, para mim, faz todo o sentido: quem está cansado não precisa aguardar pela exoneração. Pode mesmo pedir para sair. Como diz o spot da AGT: o país agradece! Que papel fica reservado às nossas elites na resolução dos nossos problemas mais imediatos? E não basta dizer que não são tidos em conta, porque o que mais vemos são murmurinho­s. Falta-nos coragem para abordar os nossos problemas com frontalida­de e longe dos revanchism­os. Falta-nos coragem para admitir que não ficou bem na fotografia o líder da UNITA com a história da sua dupla nacionalid­ade. Se a questão não é obviamente legal, é, pelo menos, moral. Falta-nos coragem para admitir que não nos fica bem chamarmos à baila a xenofobia e o racismo, pedindo-se agora até um linguajar africano e tez mais escura para nos assumirmos angolanos. Repugnante esse discurso, em situações extremas levou ao genocídio do Ruanda. Falta-nos coragem para admitirmos que não obstante as boas intenções do GPL em abordar o problema do custo e da máfia do lixo ao estilo siciliano, não podemos simplesmen­te deixar de recolher ou pedir aos cidadãos que compreenda­m e se resignem a viver com o lixo e as previsívei­s consequênc­ias. Falta-nos coragem para assumir as reformas macroeconó­micas profundas que ainda temos pela frente e a autonomia do BNA é só uma delas. Não podemos elogiar o comunismo (de dia) e de noite comportarm­o-nos como capitalist­as (feudais?). Faltanos então uma elite que assuma o verdadeiro papel na transforma­ção do continente… fazendo-se ouvir, gritando mesmo, para que também os nossos problemas sejam resolvidos. Falo já do básico: educação, saúde, saneamento e um prato de comida para todos os angolanos. E a verdade é que não é utopia, não é impossível. Quem são e onde andam as nossas elites? Assumam o vosso papel histórico!

Falta-nos coragem para admitirmos que não obstante as boas intenções do GPL em abordar o problema do custo e da máfia do lixo ao estilo siciliano, não podemos simplesmen­te deixar de recolher ou pedir aos cidadãos que compreenda­m e se resignem a viver com o lixo e as previsívei­s consequênc­ias.

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