“Num ambiente de amiguismo e corrupção, as perdas são generalizadas”
Com o país acossado pela instabilidade macroeconómica e dependente de apenas um produto (o petróleo), o responsável pela coordenação da economia explica o que tem sido feito, defende a agricultura familiar e repete: só uma nova e diversificada estrutura e
O país regista cinco anos de recessão económica, um longo período que tem sido marcado pela instabilidade ao nível da inflação, crescimento da economia e taxas de juro elevadas. Este declínio resulta apenas da estrutura económica do país ser largamente dependente do sector Petrolífero?
Não tenho quaisquer dúvidas de que a enorme dependência da economia de Angola dos recursos provenientes do petróleo é a causa dos grandes desequilíbrios que o país tem vivido de modo cíclico. Deixeme a título de ilustração dar alguns exemplos da nossa história económica recente. Após ter alcançado a paz definitiva em 2002, Angola entrou para uma trajectória de crescimento rápido até ao ano de 2014. Nesse período, isto é, de 2003 a 2014, o crescimento médio anual de Angola foi de 8 por cento. Houve mesmo um espaço de tempo, de 2004 a 2008, em que o crescimento médio foi de 12,54 por cento. Angola era dos países que mais crescia no mundo. Entretanto, no período de 2015 a 2020, o crescimento médio anual de Angola foi negativo em cerca de 1 por cento. Com excepção do ano de 2015, em que o país exibiu um crescimento pálido de 0,9 por cento, em todos os restantes anos desse período o crescimento foi negativo.
O que terá estado na base desta mudança tão radical na trajectória de crescimento económico?
A resposta está no facto deste forte crescimento do período de 2003 a 2014 ter sido puxado fundamentalmente por investimentos públicos e não por uma economia baseada num sector privado forte, empreendedor e competitivo. Entre 2003 e 2014, Angola terá gasto em média cerca de 9 mil milhões de dólares em investimentos públicos, com recursos provenientes fundamentalmente do sector Petrolífero. Nessa altura, o preço do barril do petróleo no mercado internacional chegou a atingir a média anual de 102 dólares americanos entre os anos de 2010 a 2014. No período de 2015 a 2019, os gastos com investimentos públicos caíram para uma média anual de 5 mil milhões de dólares americanos. O preço do barril do petróleo no mercado internacional baixou para uma média anual inferior a 57 dólares norte americanos.
Que lições devemos retirar desta trajectória?
Quando o preço do petróleo no mercado internacional está relativamente alto, os investimentos públicos aumentam e a economia cresce. Inversamente, quando o mercado do petróleo está em baixa, os investimentos públicos diminuem e a economia reduz drasticamente os níveis de crescimento. Esta constatação revela uma fragilidade estrutural da economia angolana, isto é, a sua grande dependência dos investimentos públicos financiados por recursos provenientes do sector Petrolífero. A nosso ver, este paradigma tem de ser definitivamente alterado de modo a que o sector privado passe a ter um papel mais activo no desempenho da economia angolana. Só deste modo poderemos ter no país uma economia que consiga exibir níveis de crescimento sustentados ao longo do tempo e baseados em critérios de competitividade e de eficiência. Este é o grande desafio que temos pela frente, ao qual estamos a fazer face. Os resultados deste esforço não serão imediatos mas surgirão mais à frente. Quando forem dados passos significativos no sentido da alteração da actual estrutura da nossa economia, os outros problemas que referiu (como as taxas de inflação e as taxas de juro que ainda são relativamente altas em Angola) serão mais facilmente resolvidos. A solução definitiva do problema passa pela estruturação de uma economia menos dependente das importações, uma economia com um peso mais significativo de sectores como a Agricultura, a Indústria, o Turismo, a Construção, as Pescas e outros que são intensivos em mão-de-obra e se situam fora do sector Petrolífero. É isto que estamos a fazer de modo focado e abnegado. Os resultados começam a aparecer.
A Covid-19 tornou o ano passado num martírio para quase todos os países e regiões. Mas se olharmos para os números, é perceptível que as pequenas aberturas e os ajustamentos que se fizeram deram origem a recuperações sazonais. Mesmo historicamente, sabemos que as grandes crises sucedem-se períodos de alguma expansão económica. De que forma o país se está a preparar para o pós-pandemia?
Tudo o que temos estado a fazer é no sentido de minimizar os efeitos da pandemia causada pela Covid-19 na saúde pública do país e na economia. Ao mesmo tempo estamos a preparar as condições para o desenvolvimento da economia no período pós-pandemia. No domínio macroeconómico, as medidas que o Governo adoptou para mitigar os efeitos causados pela Covid-19 permitiram amortecer o agravamento dos desequilíbrios nas contas internas e externas, tendo sido conseguidos importantes resultados.
Quais?
Terminamos o ano de 2020 com um défice orçamental de cerca de 1,5 por cento do PIB. O Orçamento Geral do Estado Revisto para o ano em referência previa uma cifra de 4 por cento, isto é, o resultado alcançado neste domínio ficou acima do esperado. Por outro lado, depois de ter atingido o nível de 41 por cento em 2016, a taxa de inflação desceu de modo acentuado para 17 por cento em 2019. Em 2020, esta tendência nitidamente decrescente da taxa de inflação foi interrompida devido aos efeitos da Covid19. A taxa de inflação atingiu, em 2020, o nível de 25,1 por cento mas esteve em linha com as previsões do programa que o nosso país está a desenvolver em conjunto com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em finais de 2020, o stock das Reservas Internacionais Líquidas (RIL) cifrouse em 8 mil e 690 milhões de dólares, um valor acima do limite definido no âmbito do programa com o FMI que é de 8 mil e 085 milhões. Um outro aspecto importante a realçar é que as importações em 2020 tiveram, em geral, uma contracção na ordem de 34 por cento. No que diz respeito aos bens alimentares, a contracção das importações foi de cerca de 23 por cento. Alguns economistas alegam que a redução das importações deve-se à quebra no consumo. Esta diminuição das importações de bens alimentares é, a nosso ver, uma manifestação do efeito positivo das medidas de estímulo à economia que o país tem estado a desenvolver e que revela que o esforço para aumentar a produção nacional começa a dar frutos. Gostaria ainda de destacar que não obstante os efeitos da pandemia, de acordo com dados preliminares em nossa posse, o sector da Agricultura teve, em 2020, um crescimento positivo ao redor dos 5 por cento, o que é um facto a todos os títulos notável. Este é o caminho que temos que continuar a trilhar cada vez com mais firmeza. As medidas tomadas pelo Executivo e pelo Banco Nacional de Angola (BNA) para aliviar a situação económica causada pelo Covid-19 já são conhecidas por todos. Apesar dos riscos ainda existentes, temos a previsão de que o ano de 2021 assinale o ano da retoma económica em Angola, com uma taxa de crescimento positiva ao redor de 1 por cento.
A pandemia acabou por trazer uma notícia positiva para Angola no que diz respeito à renegociação da dívida externa junto de alguns credores, como a China, por exemplo?
A dívida pública (interna e externa) constitui um grande constrangimento aos esforços de desenvolvimento do nosso país. Em 2018, a dívida pública absorvia cerca de 59 por cento da despesa total do país. O que é um valor muito elevado, pois todo o resto da economia ficava com apenas 41 por cento. Graças à disciplina e ao rigor imprimido à gestão das nossas finanças públicas, este valor passou de 59 por cento, em 2018, para 55,9 por cento em 2020. Prevê-se que, em 2021, atinja o valor de 52,5 por cento. O peso da dívida em relação à despesa global do país ainda apresenta níveis altos mas a tendência é nitidamente decrescente.
E a dívida externa?
No que se refere à divida externa foram dados passos importantes em 2020 no sentido do reperfilamento da dívida de Angola, de modo a criar maior espaço de tesouraria para encarar as grandes necessidades do país. Angola aderiu à Iniciativa de Suspensão do Serviço da Divida (DSSI), proposta pelo G-20 e negociou com os seus principais credores (que em conjunto representam cerca de 55,2 por cento do serviço da dívida externa) termos favoráveis para o serviço remanescente. Este reperfilamento da dívida com credores externos vai permitir um adiamento do pagamento de parte do serviço da dívida até 2023, prevendo-se com isto a criação de um espaço fiscal de aproximadamente 6 mil milhões de dólares nos próximos dois anos. Vamos continuar a envidar todos os esforços para que a dívida do nosso país não siga uma trajectória insustentável. Para tal, duas medidas são fundamentais: sair da situação de recessão económica em que nos encontramos, entrar para um cenário de retoma do crescimento económico e seguir uma política orçamental prudente de modo a diminuir as necessidades de endividamento do Tesouro Nacional. Estas medidas estão a ser seguidas no âmbito das reformas em curso no nosso país. Por exemplo, de 2015 a 2017, Angola apresentou saldos orçamentais negativos, o mais alto dos quais foi em 2017 com uma cifra de - 6,9 por cento do PIB. Como resultado das medidas de consolidação fiscal levadas a cabo pelo nosso Executivo desde 2017, esta trajectória foi revertida e nos anos de 2018 e 2019 Angola passou a apresentar saldos orçamentais positivos. Como já referimos, em 2020, devido à Covid-19, o país voltou a ter um défice fiscal de 1,5 por cento. Logo que as condições económicas o permitam, voltaremos aos saldos orçamentais positivos, porque desta forma as necessidades de endividamento do Estado diminuem e, com isso, as taxas de juro de mercado tenderão a diminuir. Quando as necessidades de endividamento de um país são altas, as taxas de juro também são altas, porque aqueles que investem na compra da dívida do Estado querem ser compensados pelo risco que correm ao se envolverem em tal transacção. As taxas de juro elevadas afastam o investimento do sector privado na economia real e os bancos têm pouco incentivo em emprestar dinheiro aos empresários porque ganham muito com a compra da dívida do Estado. Pensamos que o caminho da consolidação fiscal que estamos a seguir é o caminho mais apropriado.
O Orçamento Geral do Estado (OGE) 2021 tem sido elogiado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), que acredita ser um documento “prudente”. No entanto, algumas organizações da sociedade civil alegam que é um exercício de continuidade e não de emergência (em referênciaaocontextoeànecessidade de apoiar as empresas e as famílias).Consideraimportantereforçar a concertação social no que diz respeito ao OGE?
A dívida pública (interna e externa) constitui um grande constrangimento aos esforços de desenvolvimento do nosso país. Em 2018, a dívida pública absorvia cerca de 59 por cento da despesa total do país
O OGE é o principal instrumento de gestão da vida económica e social do país e o mesmo afecta as decisões de todos os agentes económicos da sociedade, nomeadamente as famílias, as empresas e o próprio Estado. Ninguém pode ficar indiferente ao OGE. O Decreto Presidencial nº 213/20, de 10 de Agosto, que aprova as instruções para a Elaboração da Proposta do OGE 2021, realça no seu artigo 7º a importância de os órgãos do sistema orçamental garantirem a participação e auscultação dos parceiros sociais. Para o presente orçamento de 2021, foi estabelecido um cronograma no qual foi definido o período de 17 de Julho a 14 de Agosto de 2020 para a auscultação dos parceiros sociais. Com base nestas disposições, o Executivo realizou encontros de consulta com diversos representantes da sociedade civil e da classe empresarial, tendo ainda havido encontros com a sociedade civil no âmbito da actividade parlamentar. Acreditamos que as limitações impostas pela pandemia terão condicionado o nível de abrangência e intensidade de tais consultas em 2020. Contudo, com a experiência que vimos acumulando, estamos convictos que a extensão e a intensidade das consultas para o OGE 2022 serão muito maiores. A este respeito não podia deixar de destacar a excelente iniciativa do Titular do Poder Executivo em criar o Conselho Económico e Social (CES).
Qual será a mais-valia do CES?
Trata-se de uma solução moderna que vai contribuir para o aprofundamento do debate nacional sobre os problemas do país, em particular nos domínios macroeconómico, empresarial e social. É um órgão constituído por pessoas com níveis elevados de conhecimento técnico-científico e também com muita experiência profissional. Pessoas que representam as mais diversas escolas de pensamento e que estão à disposição do Titular do Poder Executivo para efeitos de consulta em matérias de interesse para o país, incluindo as questões inerentes ao OGE. É sem dúvida um avanço muito importante no que respeita ao nível de abrangência e de inclusão do debate relativo ao desenvolvimento do país. Quanto ao elogio do FMI relativamente ao OGE 2021, para nós é um facto de grande relevância.
Porquê?
Estamos a implementar um Programa de Financiamento Alargado com o FMI desde Dezembro de 2018. Já vamos na quarta avaliação e todas elas têm sido de elogio ao desempenho do nosso Executivo no que respeita ao cumprimento das metas inseridas no referido Programa. Para nós, este é um acto que revela o rigor e a seriedade na gestão das finanças públicas e é também uma manifestação de confiança da comunidade financeira internacional no programa de reformas que o Executivo tem estado a desenvolver. Devemos todos nos sentir
orgulhosos como angolanos.
Que balanço faz da implementação do PRODESI? Por que foram selecionados mais de 60 produtos (praticamente a economia agrícola inteira)? Não faria mais sentido escolher três ou quatro fileiras em que o país já tem algumas condições para competir e investir seriamente no seu desenvolvimento?
Deixe-me corrigir. Não são 60 produtos. São na verdade 54 produtos. O critério para a selecção destes produtos foi a existência de condições objectivas para aumentar a produção interna dos mesmos, reduzir a sua importação e promover algumas exportações. Estes produtos não foram seleccionados num gabinete qualquer por três ou quatro pessoas iluminadas. O que não faria sentido. Foram seleccionadas através de uma consulta intensa e rigorosa às associações empresariais representativas dos produtores. No âmbito destes produtos temos estado a dar uma atenção especial àqueles que contribuem para a segurança alimentar estratégica do país (cereais, leguminosas e oleaginosas) e que sejam catalisadores da produção animal, como o milho e a soja que já figuram entre os produtos mais financiados pelo PRODESI.
Quantos projectos já foram aprovados?
O balanço que fazemos do PRODESI é positivo, não só no que respeita às actividades desenvolvidas e metas programáticas que têm sido alcançadas, mas também por ser um programa que já é amplamente conhecido em todo o país e é respeitado pelos agentes económicos. Quer dizer que já é tido em conta pelos empresários do país quando estão a equacionar e a resolver os seus problemas. Noutras palavras, é um programa que começa a ganhar a confiança daqueles que realmente produzem a riqueza nacional. O que é muito bom. O PRODESI já facilitou a aprovação de mais de 700 projectos de várias empresas, que poderão criar mais de 40 mil postos de trabalho em todo o país. Dados do Ministério da Economia apontam no sentido de que já se terão registado no Portal de Divulgação da Produção Nacional cerca de 10 mil produtores e que já terão sido estabelecidos mais de 1000 contratos de compra da produção nacional. O PRODESI ainda enfrenta inúmeros desafios.
Em que sentido?
Um deles tem a ver com a necessidade da atracção de investimento privado internacional que traga ao nosso país não só o capital financeiro e a tecnologia, mas que traga sobretudo o conhecimento (know-how). Com o know-how apropriado, o crescimento económico será muito mais rápido e também mais sustentado. O processo de melhoria do ambiente de negócios em curso e a suavização dos efeitos da pandemia causada pelo Covid-19 vão certamente contribuir para que este objectivo seja alcançado.
Fala-se muito de diversificação da economia e de facto isto está a acontecer. Mesmo assim, não deveria ser um processo mais rápido, dinâmico e com outra velocidade e qualidade de implementação? O que tem vindo a falhar e qual deve ser o papel do Governo?
Mais do que em meras abordagens discursivas, o aumento da produção nacional e a diversificação da economia está realmente a acontecer. Precisamos de mais velocidade e qualidade, é verdade, mas isso são elementos que dependem muito dos níveis de produtividade dos factores de produção. E de entre estes factores de produção destaca-se o mais importante, que é o capital humano. Temos de continuar a investir seriamente no capital humano, não só com cursos de nível universitário, mas principalmente na formação técnico-profissional dos nossos jovens. Só com o capital humano adequado conseguiremos atingir os níveis de organização, de produção e de inovação necessários para o desenvolvimento sustentado da nossa base produtiva. Como disse atrás, o investimento estrangeiro que traga sobretudo know-how (conhecimento) pode contribuir em muito para o aumento da velocidade do processo de diversificação da economia do país. Temos de continuar a melhorar o ambiente de negócios, intensificar a diplomacia económica e promover o estabelecimento de parcerias estratégicas empresariais internacionais. Estamos a trabalhar neste sentido, em particular com a Agência de Investimento Privado e Promoção das Exportações (AIPEX). É muito importante que os empresários nacionais estabeleçam relações de parceria estratégica com empresários de outros países possuidores de know-how e de tecnologia avançada, para que possamos rapidamente ter acesso ao que de melhor o mundo nos pode proporcionar nos domínios empresarial e da tecnologia. Nós queremos avançar com rapidez e com segurança neste processo de diversificação económica. Todo o investimento, incluindo o estrangeiro, será sempre muito bem-vindo.
Nos últimos anos, a retórica anti-importações tem vindo a ganhar muito terreno no espaço público e mesmo junto de alguns sectores da economia. Mas será que existe algum país no mundo que viva sem importações? Não estaremos a caminhar para a instauração de três ou quatro grandes monopólios de rosto nacional mas que, no fundo, vão colocar os preços médios acima das referências internacionais por falta de competição?
Claramente não há nenhum país do mundo que seja autosuficiente em tudo. Que não importe nada. O que está em causa não é a importação em si. O que está em causa é termos um país que depende praticamente de um só produto para os seus rendimentos em moeda externa e que importa praticamente tudo o que consome. Não é uma situação que signifique robustez económica. Trata-se de uma situação muito vulnerável a qualquer perturbação do preço deste produto de exportação no mercado internacional. Por esta razão, estamos a fazer um grande esforço para aumentar a produção nacional, diminuirmos a nossa grande dependência dos recursos do petróleo e reduzir as importações. Estamos, no fundo, a trabalhar para uma mudança profunda na estrutura económica do país. Em rigor não é justo falar em políticas anti-importação mas sim de um conjunto de medidas que estão a ser implementadas com vista a promover e apoiar a produção nacional e, por conseguinte, criar empregos e aumentar os rendimentos dos nossos cidadãos. O país actualmente apresenta já alguma capacidade para atender com algum nível de significância o mercado nacional em alguns produtos, como a farinha de milho, farinha de trigo, frutas tropicais, massa alimentar, bebidas (água de mesa, refrigerantes e cerveja), material de higiene e limpeza e alguns materiais de construção, entre outros. Sem colocar em causa o princípio da concorrência e da competição, é importante que existam políticas públicas para apoiar e promover os produtores nacionais, de modo a tornarem-se cada vez mais competitivos quer no mercado interno, quer no mercado internacional. Todos os países do mundo que hoje são desenvolvidos, num dado momento da sua história levaram a cabo tais políticas de fomento e de apoio às suas indústrias e produção locais. Não pode ser de outro modo, sob o risco de nunca se chegar a ter uma verdadeira estrutura produtiva no país. Para se ter uma ideia da importância que damos à produção nacional, foi recentemente efectuada a concessão da Fábrica África Têxtil, cuja matéria-prima (o algodão) inicialmente será importada. Facto que tem gerado algumas críticas.
Mas Angola tem potencialidades para a produção de algodão e já foi um grande produtor nacional e internacional. Olhando para isso, estão já em curso projectos de produção nacional de algodão para, a breve trecho, alimentarem esta unidade fabril e as demais que em breve estarão em pleno funcionamento. É assim que deve ser. Produzir em Angola o que pode ser produzido e bem no nosso país.
E a ameaça de surgimento de monopólios internos?
Os monopólios existem quando uma única empresa detém o mercado de um determinado produto ou serviço conseguindo, por isso, de modo unilateral, determinar o preço do produto ou bem em questão. Deixa assim de haver concorrência neste mercado. O facto de termos políticas públicas de promoção e apoio à produção nacional não quer dizer que queremos estabelecer monopólios no país. Se assim fosse, estaríamos a seguir um caminho contraproducente. Por um lado, estaríamos a lutar pelo aumento da produção nacional mas por outro estaríamos a diminuir a eficiência desta mesma produção nacional. Está provado pela teoria económica que os monopólios não são uma forma eficiente de organização da produção porque prejudicam o consumidor final com preços nãocompetitivos. Por isso, temos uma Lei da Concorrência que visa salvaguardar a competição entre os diferentes agentes económicos e evitar que certas empresas tirem vantagem da sua posição no mercado. Também no quadro da adesão de Angola à Zona de Comércio Livre da SADC e, posteriormente, à Zona de Comércio Livre Continental Africana (ZCLCA), o factor competitividade entre as empresas dos países aderentes será fundamental para determinar a sobrevivência e ganhos das empresas. Isso significa que as empresas irão enfrentar a competitividade, tanto no sentido interno como externo, quando pretenderem exportar os seus produtos ou serviços. Em conclusão, queremos revitalizar a base produtiva do país, aumentando a produção nacional, apoiando e promovendo os produtores nacionais numa base de concorrência entre os agentes económicos e não de monopólios e de outras imperfeições de mercado que não levem a eficiência no processo de alocação de recursos na economia nacional.
Por vezes tínhamos a sensação que os processos de contratação pública estavam marcados por vícios profundos. Qual o objectivo da legislação aprovada recentemente?
Sobre esta questão gostaria de referir, em primeiro lugar, que nas suas várias funções, o Estado é um agente económico, tal como as empresas e as famílias. Por isso, a forma como o Estado estabelece relações comerciais com os restantes agentes económicos da sociedade, em particular com as empresas, tem um impacto muito importante nos níveis de eficiência e de produtividade da economia e do desenvolvimento do país. Se as relações comerciais do Estado com as empresas forem estabelecidas com base no mérito e na capacidade organizativa, técnica e financeira das empresas, criase um ambiente de eficiência e faz-se uma boa alocação dos recursos do Estado. Haverá ganhos para todos. Para as empresas, para as famílias e para o próprio Estado. Inversamente, se as relações comerciais entre o Estado e as empresas forem estabelecidas com base em critérios como o amiguismo e a corrupção, o ambiente que se cria não é eficiente e a alocação dos recursos do Estado não proporciona o crescimento e o desenvolvimento do país. Num ambiente com estas características as perdas são generalizadas, excepto para um pequeno punhado de agentes que alcançam benefícios pessoais com tais operações. No âmbito das reformas em curso em Angola, temos de trabalhar sempre para que os recursos do Estado sejam usados para que em última instância contribuam para o aumento do bem estar dos cidadãos angolanos e não para o enriquecimento ilícito de alguns membros pouco honestos da sociedade. O primeiro instrumento regulador da contratação pública no foi aprovado em Setembro de 2010, tendo já sofrido ajustamentos para assegurar a adopção das melhores práticas, sem ignorar as particularidades da nossa realidade. Mais recentemente, constatou-se que algumas normas constantes da referida lei não respondiam a determinados anseios da actividade de contratação pública relativos à celeridade e amplitude das regras que regem os contratos públicos. Por isso, houve a necessidade de se fazer mais alguns ajustamentos. Foram introduzidas normas que visam a simplificação e melhoria de alguns dos procedimentos, tornando a sua aplicação mais eficaz e a sua execução mais fácil e cada vez mais transparente, através dos mecanismos de contratação por concurso público.