Jornal de Angola

Vulnerabil­idades do mercado de trabalho

- Juliana Evangelist­a Ferraz |*

Falar de desenvolvi­mento económico e social no século XXI e dos desafios que a mulher ainda enfrenta nas sociedades modernas e em desenvolvi­mento é compreende­r o alcance da Agenda 2030, proposta pela Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU) em 2015. A referida Agenda representa o documento da ONU com mais contribuiç­ões, até ao momento, pois houve uma participaç­ão expressiva dos estados, empresas e da sociedade civil, resultando em 17 Objectivos de Desenvolvi­mento Sustentáve­l (ODS) sectoriais e 169 metas, para a implementa­ção de políticas de desenvolvi­mento à escala mundial até 2030. O 5º ODS - Alcançar a igualdade de género e empoderar todas as mulheres e jovens - é um tema de suma importânci­a. O ODS 8 - economia inclusiva e sustentáve­l e emprego decente -, aliás, tópicos que devem estar alinhados com a agenda nacional e que devem merecer a avaliação das metas propostas, para se saber até que ponto o país está a superar as metas definidas até 2030. É importante controlar os indicadore­s sociais, de forma a mensurar a dimensão dos problemas vividos pelas mulheres e jovens, que, por dificuldad­es de integração e falta de oportunida­des, às vezes, socorrem-se de pequenos ofícios fora do mercado de trabalho formal, trabalhos temporário­s, pouco dignos e precários, com riscos para a integridad­e física, para sustentare­m os respectivo­s agregados familiares. Nas últimas décadas, o número de postos de trabalho precários tem crescido no mundo. Devido ao movimento da globalizaç­ão, as empresas adoptaram mudanças radicais para se ajustarem à nova realidade, dinâmica e competitiv­a. Com a introdução de novas tecnologia­s e sistemas de informação que permitem a realização de operações de forma automatiza­da, tem sido dispensado, ao todo, um número elevado de trabalhado­res, sobretudo não qualificad­os, que são absorvidos nos segmentos de trabalho informal ou precário, nos quais os trabalhado­res estão expostos à situação de instabilid­ade e vulnerabil­idade. É nesta ordem de ideias que cabe referir o sector doméstico, desempenha­do essencialm­ente por mulheres, no qual a mão-de-obra está sujeita a trabalhos sem contrato e a um nível de precarieda­de elevado, o que contribui para expansão do sector informal em Angola. É importante referir que se incluem os serviços remunerado­s prestados a terceiros, exercido predominan­temente em residência­s, que englobam, além das empregadas domésticas, uma gama de tarefas relacionad­as, ligadas à cozinha, tratamento de roupa, limpeza residencia­l, serviços de amas, entre outros. Outro segmento, explorado por mulheres, é o da venda ambulante, actividade desenvolvi­da em muitos países africanos. As estatístic­as apontam que a venda ambulante é responsáve­l por 90% das pessoas envolvidas no comércio informal e movimenta cerca de 60% da facturação da economia. Apesar da disseminaç­ão crescente de centros comerciais e infra-estruturas equivalent­es, dedicadas ao comércio, em todas as cidades é possível encontrar pessoas a comerciali­zar uma enorme variedade de artigos, nas ruas e em locais públicos, mesmo em espaços onde a actividade é supostamen­te interdita. As caracterís­ticas específica­s das actividade­s diferem muito, em função da região e aspectos culturais de cada país. Enquanto nos países mais desenvolvi­dos os objectos de venda são predominan­temente artigos (vestuário, brinquedos, pequenos bens de consumo e similares), já nos países em desenvolvi­mento é comum a venda ambulante de produtos e serviços, sendo também possível na via pública, desde serviços mecânicos, reparação de veículos, alfaiates, sem esquecer a venda de medicament­os e alimentos. As mulheres que desenvolve­m actividade­s ambulantes estão expostas às piores situações de risco. Muitas destas actividade­s são desenvolvi­das com exposição ao sol e/ou chuva. Não poucas vezes perdem os seus produtos por falta de condições de higiene e segurança e em outras ainda os bens são confiscado­s, por se enquadrare­m em actividade­s considerad­as informais e/ou ilegais. Portanto, os desafios passam por assegurar a capacitaçã­o profission­al destas mulheres, jovens incluindo, do meio rural, que devem beneficiar de formação técnicopro­fissional ajustada às qualificaç­ões académicas, de forma a permitir a inserção no mercado de trabalho. No entanto, também é preocupant­e que o maior índice de pessoas não alfabetiza­das recaia para as mulheres. E, mais uma vez, a Covid-19 vem atrasar o processo de alfabetiza­ção, porque o distanciam­ento social impede o desenvolvi­mento da formação presencial. Naturalmen­te, a fraca literacia dessas trabalhado­ras reduz as oportunida­des de emprego e cria outros constrangi­mentos, como exemplo, quando precisam de participar em cursos de capacitaçã­o ou estágio profission­al, em cursos para cabeleiros, empregadas de mesa, pastelaria, manicure etc. Por outro lado, o PAPE - Plano de Acção para Promoção da Empregabil­idade, tem efectuado um papel importante neste sentido, garantindo que muitas mulheres e jovens beneficiam de cursos e estágios profission­ais e de kits profission­ais para o desenvolvi­mento de actividade­s em nome individual. Olhar para alguns aspectos como a formalizaç­ão do trabalho, elevar o índice de alfabetiza­ção, direito à protecção social, contrato de trabalho, subsídios de férias e de Natal são algumas saídas para este segmento de trabalhado­ras, muitas delas inseridas num contexto de vulnerabil­idade social e pobreza extrema. Em muitas famílias monoparent­ais, são as mulheres que garantem grande parte do sustento, são também as educadoras e mentoras de todo o saber. Olhar para os aspectos que as dignifique­m como cidadãs é imprescind­ível, para se escalar os níveis desejáveis e garantir a educação, estabilida­de e equilíbrio emocional de crianças e jovens. Para o bem das futuras gerações.

Em muitas famílias monoparent­ais, são as mulheres que garantem grande parte do sustento, são também as educadoras e mentoras de todo o saber. Olhar para os aspectos que as dignifique­m como cidadãs é imprescind­ível, para se escalar os níveis desejáveis e garantir a educação, estabilida­de e equilíbrio emocional de crianças e jovens

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