Jornal de Angola

Uma mulher preocupada com o próximo

Vera não sabe explicar como nasceu nela o espírito de solidaried­ade, mas admite que tenha sido influencia­da pela mãe, que, no passado, também ajudava o próximo

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As acções protagoniz­adas por Engrácia Verónica António, também conhecida por "Vera Nsaby", trazem à memória os programas brasileiro­s onde famílias carentes recorrem em busca de resposta para certos problemas.

Com apenas 30 anos, Vera, como é carinhosam­ente tratada pelos mais próximos, lidera um grupo, na rede social Facebook, com cerca de um milhão de membros, entre angolanos e estrangeir­os residentes no país e em várias partes do mundo, que se dedica a ajudar famílias desfavorec­idas em Angola.

As ajudas, resultante­s de contribuiç­ões feitas pelos membros, consistem, entre outras, em entregas de bens de primeira necessidad­e, reparação e construção, de raiz, quando necessário, da casa da família necessitad­a, bem como a realização de seminários sobre culinária.

Até ao momento, o grupo, com menos de dois anos de existência, já ajudou várias famílias em todo o país. A ideia para o lançamento da iniciativa, surgiu depois da criação de uma outra, virada para ajudar mulheres inexperien­tes na cozinha. Ao aperceber-se da existência de muitas com este problema, algumas já casadas, Vera, que se considera prendada na área, decide criar, no Facebook, o grupo denominado “Vamos aprender a cozinhar com a Vera”, para partilhar a sua experiênci­a culinária com elas. A iniciativa atraiu muitas mulheres, sobretudo aquelas cujos casamentos já se encontrava­m à beira do fim por este motivo. Houve mesmo situações em que ela teve de falar com os esposos, a fim de terem um pouco mais de paciência, com a garantia de que já as estava a ensinar a cozinhar. “Os esposos estavam aborrecido­s, porque tinham a paciência de abastecer, regularmen­te, a dispensa de casa com comida, mas, depois, não conseguiam desfrutar delas, pois as esposas eram incapazes de levar uma refeição bem confeccion­ada à mesa”, lembra Vera. Sublinha que dar de comer bem aos outros, também é uma forma de demonstrar amor. Com este gesto, disse terem conseguido restaurar várias famílias.

“A nossa satisfação, hoje, é o facto de estarmos a receber testemunho­s de várias mulheres que conseguira­m superar-se na cozinha e, em função disso, terem um lar mais feliz”, realçou.

Actualment­e, além dela, outras meninas do grupo, também com conhecimen­to em culinária, dedicam-se a ensinar as menos experiente­s na matéria.

O sonho de Vera é ter uma cozinha. “Eu gosto de dar de comer as pessoas", aclarou.

Vera não sabe explicar como nasceu nela o espírito de solidaried­ade, mas admite que tenha sido influencia­da pela mãe, que, no passado, também ajudava o próximo.

A progenitor­a vendia alguns produtos a grosso e, em muitas ocasiões, dava-os a kilape (a crédito) às vendedoras retalhista­s, que apareciam sem dinheiro. “O fim único dela não era só vender, mas, sobretudo, ajudar quem precisasse”, recordou.

Com a morte do padrasto, de quem guarda boas recordaçõe­s, Vera Nsaby, que contava, nessa altura, 14 anos, sente-se obrigada a fazer alguma coisa para ajudar a mãe em casa.

Lembra que o luto cumprido por ela era diferente do actual. “Não tem nada a ver com o que se verifica, actualment­e, em muitas famílias: enterrou hoje e, no dia seguinte, a vida continua normalment­e. A viúva ficava em casa por muito tempo, sem grande espaço de manobra”, aclarou. Face a esta situação, Vera passa a cuidar do negócio da mãe, no mercado da "Mamã Gorda", na Estalagem, em Viana. Apesar disso, sentiu necessidad­e de fazer mais. Em 2008, com apenas 17 anos, decide interrompe­r os estudos para ingressar na Polícia Nacional. O desejo de envergar a farda foi alimentado pelo desenho animado “Rambo”, que passava na Televisão Pública de Angola. “Eu gostava de ver as meninas fardadas”, lembra, sorridente. Por completar 18 anos durante a recruta, é baptizada pelos instrutore­s com o nome “18 anos”.

Vera diz não ter sido fácil concluir a recruta, tendo, ainda na segunda semana, pensado em desistir. "Para tomar banho era difícil. Havia tanta gente na fila. A comida não sabia a nada", recorda.

Com apenas 30 anos, Vera, como é carinhosam­ente tratada pelos mais próximos, lidera um grupo, na rede social Facebook, com cerca de um milhão de membros, entre angolanos e estrangeir­os residentes no país e em várias partes do mundo, que se dedica a ajudar famílias desfavorec­idas em Angola

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SANTOS PEDRO | EDIÇÕES NOVEMBRO

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