Um exemplo de superação
Atleta com deficiência visual parcial agradece ao CPA pelo apoio e destaca Armando Sayovo pela inspiração
Esperança Gicasso, atleta portadora de deficiência visual parcial, é uma das muitas mulheres que superou na vida todas as adversidades consequentes das suas limitações. Encarou o mundo de cabeça erguida e foi à luta. Aos 29 anos revela, em entrevista ao Jornal de Angola, que em momento nenhum sentiu-se diminuída e muito menos inferior.
No mês consagrado a todas as mães, esposas, irmãs, filhas, enfim, às mulheres, esta “guerreira”, que muito cedo deixou a sua terra natal, Malanje, para enfrentar Luanda, em busca de melhores condições de vida, notabilizou-se no desporto e é hoje uma referência do atletismo paralímpico feminino em Angola.
“Foi a directora do ensino especial, a professora Ana Maria que me incentivou a praticar o atletismo. Confesso que não sentia nada pela prática do desporto, mas aos poucos depois de começar senti-me bem e atraída por esta modalidade. Na altura tinha 16 anos de idade”, salientou.
“Sinto-me bastante feliz e confortada pelo facto de ter abraçado o desporto. Hoje digo sem qualquer receio e com muita satisfação que o desporto fez muito bem a minha vida. Tive um grande desenvolvimento psicológico, motor, emocional e digo com orgulho que valeu a pena abraçar este desafio”, conta emocionada.
Despida de qualquer complexo defende que todo o ser humano tem o seu valor, não obstante a sua condição social, política e física. Realça que ninguém é superior a ninguém e diz que o importante na vida é respeitarmos a diferença.
“Ser deficiente não implica nada. O que conta é a nossa vontade, e o querer de podermos fazer aquilo que gostamos. No meu ponto de vista e no meu caso particular, sinto-me igual a qualquer ser humano. O único senão é que os outros vêm com facilidade e eu não. As necessidades são todas iguais”, precisou.
Com deficiência na ordem dos noventa por cento confessou que no princípio em função da sua especificidade sentiu imensas dificuldades para competir nas provas internacionais, devido as condições impostas de acordo os regulamentos.
“A minha deficiência visual é parcial, por isso quando corro no exterior do país vedam-me a vista com uma fita escura. No princípio sentia algum desconforto, mas com o tempo fui me adaptando e hoje não tenho qualquer tipo de problema”, explicou.
Em contagem decrescente para um dia colocar o ponto final na sua bem-sucedida na carreira desportiva, já que nada é eterno, espera continuar nas pistas por mais alguns anos e depois definir o seu futuro. “Assumi este desafio, gosto e estou preparada para o que der e vier”, completou confiante num fim de carreira promissor.
“Neste momento tenho o foco centrado para os Jogos Paralímpicos de Verão, de 24 de Agosto a 5 de Setembro de 2021, na cidade de Tóquio (Japão). Se Deus permitir pretendo dar o meu máximo, fazendo o melhor para a minha carreira e o meu país. É bom que fique bem claro, não estou a prometer trazer medalha porque não gosto de fazer promessas, mas quero dar o meu melhor”, elucidou.
Depois de duas presenças nesta competição ( Inglaterra 2012 e Brasil 2016) , sem conquistar qualquer medalha, Esperança está confiante e tem esperança que a terceira pode ser de vez, por isso acredita que pode atingir o pódio, pois tem trabalhado para este objectivo.
“O meu grande desafio é conquistar uma medalha nos Jogos Paralímpicos, a conquista que falta na minha carreira, daí a concentração estar virada para os jogos do Japão 2021 e colocar assim a cereja no top do bolo, isto é, fazendo o pleno em todas as grandes competições internacionais”, sublinhou.
Reconhece que para alcançar tal propósito, não será uma tarefa fácil pois tem muitas etapas a superar, ainda assim sente-se lisonjeada pelo facto de fazer parte da família olímpica, um ambiente ímpar na vida desportiva de qualquer atleta.
“Competir numa olimpíada é o sonho de qualquer atleta. Já tive este privilégio em duas ocasiões e se tudo correr bem, o Japão será a terceira presença na maior prova desportiva a nível do Planeta. Com fé e a graça de Deus acredito numa boa prestação. Aliás, só ele sabe o dia de amanhã”, disse crente numa prestação airosa.
A relação com o actual guia Márcio Neto e tantos outros com quem teve o privilégio de dividir às pistas e competirem como irmãos siameses é o melhor possível. “As vezes tem havido alguns desentendimentos, o que é normal nos seres humanos, mas de um modo geral a relação é boa”, louvou.
“Todo e qualquer ser humano em véspera de uma competição sente um certo calafrio e o nervosismo toma conta de nós, por isso temos de estar concentrados e confiantes que tudo vai dar certo. Mas como as pessoas portadoras de deficiência têm o sistema nervoso mais alterado e por vezes as coisas mudam. É uma questão de nos entenderem”, completou.