Parte um panafricanista
Morreu ontem, num hospital da capital zambiana, Lusaka, Kenneth David Kaunda, aos 97 anos. O primeiro Presidente da Zâmbia foi um dos líderes mais influentes da África Austral. Além de ter conduzido a Zâmbia à independência do Reino Unido, em 24 de Outubro de 1964, Kenneth Kaunda foi um dos artífices da criação da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), bloco político e económico constituído por Angola, África do Sul, Botswana, República Democrática do Congo, Lesoto, Madagáscar, Malawi, Maurícias, Moçambique, Namíbia, Swazilândia, Tanzânia, Zâmbia, Zimbabwe e Seychelles.
Conhecido como “Pai da Nação”, Kenneth Kaunda fez parte dos líderes históricos da região que deu um apoio prestimoso aos movimentos de independência e pela paz em África.
Ao lado de Agostinho Neto, de Angola, Julius Nyerere, da Tanzânia, Samora Machel, de Moçambique, e Seretse Khama, do Botswana, Kenneth Kaunda, da Zâmbia, ajudou a alterar o equilíbrio de forças na África Austral, onde os Estados negros independentes tinham sido, até então, demasiado depedentes da ajuda externa para se oporem aos regimes de minoria branca na Rodésia do Sul, actual Zimbabwe, na Namíbia e na África do Sul, onde vigorava o apartheid.
Embora todos os Estados independentes, em maior ou menor grau, apoiassem os movimentos de libertação contra o apartheid na África do Sul, na Namíbia e, também, na Rodésia do Sul, Kaunda, Agostinho Neto, Julius Nyerere, Seretse Khama e Samora Machel deram um grande impulso no processo de libertação da África Austral.
Através do movimento dos Países da Linha da Frente (ELF, na versão inglesa) que teve a sua última Cimeira, em Harare, capital do Zimbabwe, em 1994, Robert Mugabe no poder e Nelson Mandela como primeiro Presidente Negro da África do Sul saído de eleições multirraciais, reconheceram os feitos dos pais das independências de Angola, Zâmbia, Tanzânia e Botswana no processo de luta contra o apartheid.
O relançamento do movimento dos Países da Linha da Frente foi importante em todo o processo que conduziu à libertação da África do Sul, da Namíbia e do Zimbabwe do apartheid. A ELF marcou o início da coordenação dos países da África Austral na oposição aos regimes de minoria branca. As acções dos ELF passaram a ser consideradas, pela comunidade internacional, com as Nações Unidas à cabeça a vertente política de combate ao apartheid.
Kaunda, o homem do lenço branco da paz, embora nessa altura não fosse já o Presidente da Zâmbia, também ajudou a abrir caminho para a pacificação de Angola, pois Lusaka acolheu, durantes meses, conversações oficiais entre as partes em conflito no país.
Não se conseguiu consolidar os Acordos de Paz de Lusaka, assinados na capital zambiana, mas o país de Kaunda nunca se fechou a juntar na mesma mesa os irmãos angolanos desavindos. Com altos e baixos, próprios da condição humana, parte para a eternidade um grande panafricanista, que ficará no panteão da História de África.