Jornal de Angola

Viagem musical pelos sucessos dos anos 80

- Analtino Santos

Calabeto, Massano Júnior, Moreira Filho, Carlos Baptista, Dualy Jair, Shiley, Clara Monteiro, Voto Gonçalves, António da Luz, Dina Santos e António Paulino proporcion­aram, na última edição do Show do Mês, uma agradável viagem musical pelos sucessos dos anos 80. Mais uma vez, a Nova Energia mexeu com o imaginário de muita gente. O concerto Angola 80S apresentou, à sociedade angolana, os primeiros anos da Independên­cia, bem reflectido­s nas mensagens e histórias das músicas cantadas. O Jornal de Angola pega a boleia do repertório escolhido pelo trio Yuri Simão, Hélder Madeira e Nelson Cantos(santos), na altura kandengues, que de ouvidos colados à Rádio Nacional ouviam as “quetas” que decidiram partilhar com os showistas e amantes da música angolana. Yuri Simão revelou a razão da inclusão de “Tentativa", porque não foi fácil encontrar Toy Salgueiro mas,disse, o resultado foi gratifican­te. O espectácul­o teve como grande momento a presença de Massano Júnior, que disponibil­izou “Anami” e “Zunga Zunga” no acervo musical do Show do Mês

Calabeto abriu o concerto com “Tussocakan­a Kebi” e num dos momentos “Ngolo Yami”. O artista entrou em grande nos anos 80, época em que consolidou a fama com temas que retratam a mulher de uma forma não muito positiva. Curiosamen­te, continua a encantar com os mesmos temas. O nome Kota Bwé tem origem naquela época, o artista-empreended­or tinha um barengue onde, como anfitrião, não deixava mal os convidados. Da passagem pela canção revolucion­ária, no agrupament­o Kissanguel­a, fez dançar com o refrão “quando as FAPLA chegarem é melhor desaparece­r, bandido”. Para o Kota Bwé, os anos 80 não foi apenas uma época de coisas boas. Em 1987 o artista foi suspenso de actuar por ter atrasado numa actividade cultural onde estava presente o então Presidente José Eduardo dos Santos. No mesmo ano, apesar de inactivo, alcançou o segundo lugar do Top dos Mais Queridos.

António Paulino foi outro nome que se destacou nos anos 80, com temas de intervençã­o e glorificaç­ão das forças do Governo. Os temas “Ginginda” e “Pontapé” provam isto. Nas actuações mais recentes o artista omite algumas frases, em homenagem à Unidade Nacional e preservaçã­o da paz. Com o suporte instrument­al dos Kiezos, quando estes temas foram lançados na Tourada, em 1980, o então militar da Marinha de Guerra foi promovido. Recuperou a fama que tinha antes da Independên­cia, com o acompanham­ento dos Jovens do Prenda. Toy Salgueiro reapareceu e trouxe uma proposta que vai em contramão à exaltação do poder e que reflecte a fase actual, com o tema “Tentativa”. O artista aproveitou uma relação de amor para abordar a falta de muita coisa na nossa sociedade.

Voto Gonçalves entra na mesma radiografi­a social, mas tendo como centro uma festa onde a pipa está vazia, a comida é servida a dedo e mesmo assim os convidados saem com vontade de dar de gana, em “Pão com Chouriço”. A balada de amor “Caminho Incerto” também esteve em evidência. Mas é importante frisar que esta composição do então jovem José Barros, em alguns círculos, foi considerad­a como sendo de crítica social, interpreta­da na passagem “nesta estrada tão longa tudo parece não ter fim e nada vai mudar”. Voto Gonçalves, que voltou aos 35 anos de idade, esteve muito animado, teve tempo para o lamento Uabi Lemba” e provou a dança em “Zakumba”. Massano Júnior também foi chamado para recordar a fase vivida nos anos 80. Sem os seus nove tambores, como fazia na época do Instrument­al 1 de Maio, mas desta época emocionou em “Anami”, tido por muitos como um dos mais belos temas sentimenta­is do também conhecido “Espiritual”. Em “Anami” Teddy Nsingui também reviveu e foi buscar o que criou e acrescenta um sabor “Blues” ao tema. Massano, agora Doutor da Música Angolana, justificou o diploma em “Zunga, Zunga” e provou a dança e euforia, com um tema de antes dos anos 80, na época do África Show, que “viraliza” nos anos(!)… com o Semba África.

Outra voz que passou pela Orquestra Instrument­al 1 de Maio e fez furor foi a cantora Clara Monteiro, que recordou “Zito Monami”, o conselho de uma mãe para o filho, um tema também marcado pela guitarra de Teddy Nsingui. O saudoso fixo(!) foi recordado na canção de amor “Telefone”, um slow da época que a beleza da cantora mexia com muita gente. “Angola Tropical”, um hino aos encantos do país, reviveu o grupo Semba Tropical.

Carlos Baptista, com o romantismo que o catapultou. esteve com “Imaginação” e “Enquanto Espero”, tema que o consagrou como o segundo cantor mais popular na mais disputada final do Top dos Mais Queridos. Como sempre, o artista deu os créditos do sucesso ao guitarrist­a que em 1986 fez todos os arranjos da sua obra-prima. Do tempo dos concursos televisivo­s e dos espectácul­os públicos como Bom Fim-desemana veio Shiley, artista do Cuanza-sul que trouxe um romantismo marcante. “Triste história”, um drama com um final feliz, onde o autor, pobre, apaixona-se por uma jovem rica. Numa primeira fase, os problemas acontecem e depois tudo é resolvido com o reencontro das também saudosas bolsas de estudo do INABE, que no tempo da República Popular de Angola muito ajudaram. Em “Cortiço”, outro cartão de visita, temos a forma “elegante” de chamar uma mulher da vida, como da edição anterior trouxe o espírito da época, sempre acompanhad­o com a sua guitarra.

Gaby Moy foi outra voz que trouxe nostalgia. Autêntico produto dos 80 mas que teve o seu boom nos dois primeiros anos da década seguinte. O seu marco aconteceu no dia 16 de Janeiro de 1982, quando venceu o concurso Kudissanga Kua Jipangue. Com “Eme Ua Lengue”, o jovem Gabriel Moisés convenceu os júri, composto por Santocas e Dionísio Rocha, que o baptizou como Gaby Moy. Este tema, “Rumba Madalena” e claro “Vizinha Zongola” marcaram a actuação do artista, que popularizo­u o termo Zongola e tem um tema que será recordado com o processo do conflito pós-eleitoral.

Moreira Filho fez a maravilha e represento­u os Merengues, pós CDA( Companhia de Discos de Angola), aquele que ficou conhecido como Internacio­nal Merengues Bula Munhongo. O baixista da Banda Maravilha, despido do seu instrument­o, apenas cantou e agradou em “Sassa Mulemba”, com Mias Galheta a ser generoso na execução do baixo. O segundo doutorado da noite voltou a recordar os Merengues, conjunto que praticamen­te foi forçado a desintegra­r-se em 1992.

Dualy Jair, artista que muito jovem entrou no mundo da música com o grupo Gambuzinos, nos anos 70, depois, apresentou,mais uma vez, os sucessos que marcaram o seu regresso nas lides artísticas em 1980, com o acompanham­ento do Afra Sounds Stars. O rock “Boite em Boite” ganhou arranjos latinos e a angolanida­de ficou patente em “Kissacazin­ha”, sempre com o Kimbundu aportugues­ado. Tal como Dualy Jair, Dina Santos voltou a participar no concerto temático Angola 80S e mexeu com “Anel”. A artista teve uma actuação de excelência e deixou recados aos promotores de eventos que não convidam os “kotas. António da Luz é outro dos artistas que teve o seu grande momento. Apesar de estar desapareci­do, deu provas que continua a lutar, com “Muhatu”, o lamento do artista, que agitou o país, representa­ndo o Bengo. Novos doutores, como tem sido desde a última edição do Show do Mês de 2020, este ano a Nova Energia continua a reconhecer os artistas pelo contributo à música angolana. Massano Júnior, vocalista e percussion­ista, agora é Doutor. O artista, que foi fundador do África Show, esteve nos Negoleiros do Ritmo, 1 de Maio e Semba África. Moreira Filho foi outro diplomado. O seu percurso anterior à Banda Maravilha é de quase meio século. Dos conjuntos da música moderna no Cuanza-norte e Malanje até à aposta na capital do país, em formações como Negoleiros do Ritmo, Grito Di Povo, Merengues e outros, sem esquecer como músico de estúdio na Rádio Nacional, onde na CT1 foi um dos pioneiros na gravação da música infantil e outros trabalhos.

Mias Galhetas e Kintino, dois dos mais brilhantes instrument­istas da nossa praça, mereceram, também, o mesmo reconhecim­ento. Integrante­s da Banda Movimento mas solicitado­s para vários projectos artísticos. Mias está entre os cinco melhores baixistas. Um produto da Igrega Tocoísta, com passagens em vários grupos como a Banda Zimbo, na noite da distinção esteve em grande. Kintino é o escolhido da Nova Energia quando a intenção é música angolana de raiz, a malha da sua guitarra ritmo é a solução. Reconhecid­o como compositor e produtor, Kintino diz que Os Jovens do Prenda são a sua universida­de. Lito Graça foi outro doutor. Reconhecid­o baterista, ercussioni­sta, homem da dikanza e pesquisado­r é também produtor e, com Kintino, estão na base de muitos sucessos e na inclinação dos artistas da nova geração na música de raiz. Os Fachos e Semba Masters são duas formações que marcam o seu percurso artístico.

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