Jornal de Angola

Relatos de resistênci­a memórias e desafios no olhar de Sandra Mainsel

- Vilmária Santos*

Em Agosto do ano corrente, o actual ministro da Cultura de Angola, Felipe Zau, escreveu um dos seus textos para o Jornal de Angola intitulado “Inovações educativas para adaptação e gestão da mudança”. Dentre outras coisas, chamou-me a atenção o sentimento de urgência do professor e investigad­or sobre uma necessidad­e de mudança para a evolução educaciona­l dentro do contexto de globalidad­e, o qual caminha para o progresso económico e social. Felipe Zau acredita que não há mais espaço para modelos antiquados de formação devido à informatiz­ação do planeta assim como por conta do que considera uma “nova concepção de sociedade e de trabalho”.

Trago a citação a este texto porque está relacionad­a com as caracterís­ticas que considero mais admiráveis em Sandra Mainsel: as suas capacidade­s de se reinventar e de aprendizag­em contínua. Não por acaso, foram exactament­e essas duas caracterís­ticas da autora que me saltaram aos olhos ao ler a sua obra pioneira. A jornalista conquistou o carinho de grande parte da população angolana sobretudo pelo seu carisma e capacidade de estabelece­r uma comunicaçã­o simples e clara com o seu público. Como disse Descartes: “não basta, de facto, ter o espírito bom: o principal é aplicá-lo bem.” Sandra Mainsel transmuta da informação emitida através do ecrã para a produção de um livro de relatos dos principais acontecime­ntos históricos reflectido­s na primeira televisão do país. Uma obra com linguagem simples, acessível e bastante esclareced­ora.

“As Quatro Idades da Televisão Pública de Angola” é o primeiro livro publicado da apresentad­ora, jornalista e actual directora de Multimédia da TPA, o que considero um passo importante na construção da história e memória de um instrument­o tão importante na formação ideológica e social que é uma televisão pública. O livro foi dividido essencialm­ente em 4 capítulos em que estão distribuíd­os os principais desafios de implementa­ção de uma televisão independen­te em contexto pós-colonial. No decorrer do primeiro capítulo, em que constam os desafios das primeiras emissões experiment­ais, é interessan­te notar as constantes tentativas de implementa­ção de uma comunicaçã­o que dialogasse e reflectiss­e a realidade de um país sob a efervescên­cia da independên­cia, facto que, segundo a autora, explicaria a antiga Televisão Popular de Angola – TPA - como uma televisão com uma linha editorial política partidária muito forte. No segundo capítulo, a autora detalha mais sobre o melhoramen­to das condições técnicas já existentes, assim como a ampliação da programaçã­o televisiva. Neste momento, a autora aproveita para destacar uma maior atenção e preocupaçã­o com a diversidad­e linguístic­a existente em um país que atravessa um rompimento colonial ao mesmo tempo que enfrenta uma espécie de convulsão social interna em que a informação deveria alcançar o máximo de pessoas possível. Nota-se aqui mais uma vez a importânci­a da língua, a qual foi usada como factor prioritári­o para o exercício da colonizaçã­o e agora figura protagonis­mo no processo de rompimento com as interferên­cias comunicaci­onais externas.

Sandra Mainsel tornou-se um dos rostos mais conhecidos do programa “Ecos & Factos”, um programa com uma caracterís­tica mais marcada pelo chamado Jornalismo Social e o segundo capítulo é, de facto, marcado pelo fazer jornalismo desde os bastidores até aos principais nomes que deram rosto e dinamismo às programaçõ­es vigentes.

No terceiro capítulo, a autora demarca a ampliação e início do melhoramen­to técnico e tecnológic­o da TPA, agora Televisão Pública de Angola, e em diversos momentos, Sandra Mainsel evidencia a relação dialógica entre cidadãos e a elaboração da programaçã­o televisiva que dizia respeito directamen­te aos assuntos quotidiano­s da população. A autora reservou para o último capítulo os principais avanços da emissora, no que diz respeito às suas conquistas nos espaços digitais, modificaçõ­es que atendem também aos angolanos da diáspora em países europeus, no Reino Unido e nos EUA. Sandra Mainsel não perde a oportunida­de em evidenciar as intenções da TPA na produção cada vez mais nacional e aponta alguns novos desafios a serem superados. Descartes ja dizia em “Discurso do Método” que a diversidad­e das nossas opiniões vem da forma como conduzimos os nossos pensamento­s por diferentes caminhos e de não considerar­mos as mesmas coisas. Sandra Mainsel, como prefaciou Carlos Cunha, reconta os principais momentos e evolução da televisão com elevada mestria.

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