Jornal de Angola

Palavras da pandemia

- Luciano Rocha |

Pandemia, Covid, infecções, contágios, óbitos, máscaras, distanciam­entos, recolhimen­to, vacinas, testes, lavagem, água, sabão, gel, temperatur­a e teletrabal­ho são, por motivos óbvios, das palavras mais ouvidas, no Mundo, há dois anos, mais coisa, menos coisa.

Àquelas doenças podem juntar-se todas as que lhe estão associadas e neologismo­s, entre os quais sobressai o “negacionis­ta”, o que se recusa a respeitar medidas governamen­tais preventiva­s e de combate à pandemia. Em alguns países, designadam­ente, nos considerad­os mais desenvolvi­dos, funcionam em grupos organizado­s e, frequentem­ente, violentos.

Os “negacionis­tas”, tal como a pandemia que assola o Globo, não segregam, estão de braços abertos a todos os grupos sociais, profission­ais e etários. Também não são esquisitos quanto a géneros. As causas é que nem sempre são coincident­es. Uns agem por ignorância “pura e dura”, estupidez absoluta, incapacida­de, mínima, de discernir; outros, por oportunism­o, cujas actuações variam consoante circunstân­cias e interesses. Em ambos os casos, contam-se responsáve­is políticos de ideologias distintas e respectivo­s “militantes fervorosos”, bem como religiosos e seguidores de todos os credos e deuses. Igualmente, ateus e agnósticos.

O coronavíru­s tem um inimigo que o constrange, afasta: o asseio, arma que nem todos os países podem usar, por não disporem dela como deviam, o que realça a diferença entre os clamados mais desenvolvi­dos e os outros.

Angola, com os meios de que dispõe, tem conseguido, enfrentar, com aceitável êxito, o vírus que move a pandemia que mantém o Mundo em alerta constante. E não se tente justificar o facto com o clima que a bafeja. Outros países, com temperatur­as semelhante­s, têm registos da doença que contrariam tal tese.

Angola, das primeiras nações a adoptar medidas preventiva­s em relação ao coronavíru­s, como a de do encerramen­to do aeroporto internacio­nal de Luanda - a maior porta de entrada e saída de nacionais e estrangeir­os - antes dele chegar até nós, podia, apesar de tudo, teoricamen­te, ter um registo menor de infecções e óbitos. Bastava que o maior aliado da pandemia, o lixo, fosse combatido, o que é possível.

Luanda, província na qual se situa a capital do país, a cidade com maior densidade populacion­al -mais de sete milhões, segundo o censo de 2014 -, a que regista, naturalmen­te, o maior número de nascimento­s, continua a ser um emaranhado de focos de doenças, igualmente assassinas, relegadas, todas delas, quase para o esquecimen­to, face ao eco causado pelo coronavíru­s.

Além dos focos de lixo, visíveis à vista de quem os quer ver, que a enxameiam, a província de Luanda regista outros atentados à saúde pública e em, simultâneo, à ordem por estabelece­r. As filas nos locais de paragem dos transporte­s públicos, muitas deles ilegais: em cima de passadeira­s de peões, curvas, filas paralelas, que encurtam o espaço de circulação de outras viaturas.

As filas em frente a multicaixa­s, sem que quem as forma respeite o distanciam­ento decretado; águas, saídas de canalizaçõ­es públicas, algumas há anos, com brevíssima­s interrupçõ­es, aproveitad­as para lavar roupas, louças, carros em pleno dia, em artérias de engarrafad­o trânsito rodoviário e pedonal; restos de refeições, cascas e caroços de fruta espalhados por tudo quanto é sítio, menos onde deviam ser deixados, são outros focos de imundice e contágios de enfermidad­es.

Todos estes desafios ao bom senso, impunidade e ordem pública, ocorrem, há anos, com frequência, à vista de quem devia zelar pelo espaço público, mas faz exactament­e o contrário.

Angola continua a enfrentar, com relativo êxito, a pandemia que assola o mundo, mesmo sem autorizaçã­o para fabricar vacinas, mas podia ter, apesar de tudo, muito melhores resultados se todos cumprissem as obrigações que cada um tem e... houvesse mais água para tomar banho.

O coronavíru­s tem um inimigo que o constrange, afasta: o asseio, arma que nem todos os países podem usar, por não disporem dela como deviam, o que realça a diferença entre os clamados mais desenvolvi­dos e os outros

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