A corrupção e suas consequências no desenvolvimento económico
O reputado economista e prémio Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, ao dissertar sobre a corrupção, afirmava com toda a força e determinação que a sua abordagem traduzia uma forma inteligente, dinâmica e provocadora de oferecer formas interessantes de olhar para a globalização.
A corrupção constitui uma violação da confiança depositada pelos constituintes nos titulares de cargos em qualquer organização, seja uma empresa, um sindicato ou mesmo uma Organização Não Governamental, podendo, no entanto, existir casos de corrupção por uma causa nobre, embora, tratando-se de meras e raras excepções, pois que no geral é condenável.
Na verdade tudo seria mais simples na vida se as coisas moralmente censuráveis, como a corrupção, tivessem, sem dar lugar a equívocos, consequências económicas negativas.
No entanto , a realidade é outra e bem mais confusa.
No passado século XX, houve o caso do Exzaire de Mobutu (hoje República Democrática do Congo) ou do Haiti de Duvalier, cujas economias foram arruinadas pela corrupção desenfreada ,sendo grande parte do dinheiro transferida para o estrangeiro, sem que tenha havido criação de empregos e de rendimentos, enquanto num outro extremo há países, como a Finlândia, e a Suécia, Singapura, que são conhecidos pela sua ética e pelo sucesso económico.
Mas também há países como a Indonésia, que eram muito corruptos mas tinham um bom desempenho económico e onde o dinheiro da corrupção permaneceu maioritariamente no país, criando empregos e rendimentos.
Outros ainda, como a Itália, a Coreia do Sul, Taiwan e a China, embora em muitos casos com uma corrupção enraizada em grande escala, porém, melhor sucedidos do que a Indonésia, apesar de a corrupção não ter atingido a gravidade deste último país.
Deve ficar claro que a corrupção não é um fenómeno exclusivo do século XX nem sequer da nossa era, pois os actuais países ricos industrializaram-se, não obstante a sua vida pública ter sido espectacularmente corrupta.
Na Grã Bretanha foram notórios os casos de corrupção, tendo sido considerado normal, os ministros tomarem de empréstimos fundos dos departamentos para realizarem lucros pessoais.
Para além destas e de outras anomalias que perduraram até ao ano de 1870, as nomeações de altos funcionários públicos eram feitas com base em compadrios e não por mérito.
Nos Estados Unidos da América os cargos públicos eram atribuídos aos membros do partido no poder, independentemente das suas qualificações profissionais e essa prática enraizou-se no início do século XIX, tornando-se mais intensa durante as décadas posteriores à guerra civil.
Não há memória de que um único burocrata federal dos Estados Unidos, tivesse sido nomeado através de um processo aberto e competitivo até 1883, altura em que foi publicada a lei de Pendleton.
Apesar disso, os Estados Unidos foram das economias que mais cresceram em todo o mundo.
O suborno, o convívio, que normalmente consistia em oferecer bebidas alcoólicas em associações filiadas num partido, promessas de empregos e e ameaças aos eleitores foram práticas generalizadas nas eleições, até ao surgimento da Lei de Práticas de Corrupção e Ilegais de 1813, atrás referida.
Apesar da sua aprovação, a corrupção eleitoral persistiu até ao século XX nas eleições autárquicas.
As consequências económicas da corrupção em diferentes economias podem ter resultados dispares, pois que, em alguns países podem ser desastrosos, como nos casos do antigo Zaire e do Haiti, enquanto outros têm desempenhos aceitáveis, como no caso da Indonésia e ainda outros bem sucedidos, como vimos dos Estados Unidos da América nos finais do século XIX e dos países do extremo oriente, após a segunda guerra mundial.
O suborno é nada mais que uma transferência de riqueza de uma pessoa para outra e pode não ter necessariamente efeitos negativos sobre a eficiência económica e do crescimento.
A título de exemplo, constata-se que, no caso de algum alto funcionário público aceitar um suborno de um capitalista e investir esse dinheiro num projecto pelo menos tão produtivo como aquele, no qual o capitalista teria investido se não tivesse de pagar o suborno, a imoralidade subjacente poderia não ter qualquer efeito sobre a economia em termos de eficiência ou crescimento.
A única diferença é que o capitalista está mais pobre e o funcionário público mais rico, ou seja, trata-se de uma questão de distribuição de rendimento.
Em Angola, a corrupção tem as suas características próprias e reflecte-se em três patamares bem diferenciados :
O primeiro está ligado a políticas de rendimentos mal concebidas e sem conexão com a produção e a produtividade, dando lugar ao desincentivo para o trabalho e ao marasmo, sem fim à vista, e está na origem das apetências para o lucro fácil e imoral, transmitindo-se verticalmente, de baixo para cima da estrutura social do país.
Para fazer face e dar-lhe um combate credível, por sinal já tardio, mas possível, para recuperação no tempo e no espaço, torna-se necessário rever toda a política salarial com coragem e determinação, eliminando-se o enorme surto de descontentamento que predomina nas hostes laborais, pois que, além de injusta e deprimente, poderá no futuro vir a ser uma fonte de conflitos de consequências gravosas e imprevisíveis, razão pela qual se justifica em absoluto a tomada de medidas que conduzam à sua alteração urgentemente.
O segundo é predominante nas classes mais favorecidas, que se aproveitam da sua posição social para transferirem para o estrangeiro valores monetários em grandes quantidades, que desperdiçam exuberantemente em objectos de luxo ou ninharias, sem que proporcionem emprego e rendimento no país.
Deste modo, a luta contra a corrupção através de medidas adequadas que devem ser tomadas, ganhará um novo alento pelo vigor que poderá imprimir e pela credibilidade que poderá suscitar junto da população.
Finalmente o terceiro patamar está relacionado com a sobrevalorização do Kwanza, cujo valor em comparação com o dólar americano se manteve imutável durante mais de meio século, criando preconceitos negativos que se reflectiram na política de preços das mercadorias, não só de combustíveis importados como também de outros produtos que eram desviados e reexportados a baixo custo para os países vizinhos sob a forma de contrabando.
Este problema está a ser ultrapassado e, apesar de a taxa de câmbio ainda não estar equilibrada, importantes passos foram dados em frente, que estão a produzir efeitos positivos, sendo inegável que uma vez vencido o preconceito e os receios provocados pelo conflito militar que reinou no país, tudo parece indicar que se está no caminho certo em direcção a uma reforma monetária coerente.
Do nosso ponto de vista, o momento é oportuno e propício para a criação de um novo órgão, com, carácter eminentemente pedagógico, mas com poderes para propôr medidas legislativos, com a designação de ALTA AUTORIDADE CONTRA A CORRUPÇÃO.
* Ex-ministro das Finanças e antigo governador do BNA