Conferência Internacional aborda nacionalismo angolano
O jornal Cultura, publicação de especialidade da Edições Novembro, EP., realiza no próximo dia 25, sexta-feira, em Luanda, a sua primeira Conferência Internacional sobre a História de Angola, que terá no centro das discussões o tema “A Nação e o Nacionalismo dos séculos XIX e XX”.
De acordo com o portavoz do evento, Gaspar Micolo, a iniciativa enquadra-se num amplo programa gizado pela administração da Edições Novembro, proprietária dos títulos Jornaldeangola, Economia & Finanças, Desportos, Metropolitano, entre outros, que visa a realização de conferências nas áreas de especialidade dos jornais de modo a ampliar os espaços de debate, além das tradicionais páginas dos jornais.
“Os jornais estão muito associados à informação, mas a imprensa tem um importante papel na formação das pessoas, elevando o nível cultural dos leitores, quer seja nas próprias paginas dos jornais assim como na promoção de conferências, debatendo de maneira mais alargada os temas importantes”, justifica o director do jornal Cultura.
Assim, num total de quatro painéis, quatro historiadores e professores angolanos, sendo um proveniente do Brasil e outro de Portugal, vão discorrer sobre as origens do Nacionalismo dos séculos XIX e XX e a consequente formação da Nação angolana. No primeiro painel, o historiador Alberto de Oliveira Pinto aborda “O Imaginário Cultural do Nacionalismo e as Retóricas Coloniais”, que deverá contar com a moderação do professor Bruno Júlio Kambundu. Já no segundo painel, a historiadora Rosa Cruz e Silva discorre sobre “O Proto-nacionalismo nos jornais dos séculos XIX e XX”, e conta com a moderação do professor Ngombo Kalemba. "A Formação da Nação Angolana na Era do Nacionalismo Moderno" estará a cargo do prelector Carlos Serrano, proveniente do Brasil, e que contará com a moderação da professora Anabela Cunha. Já "O Ensino da História do Nacionalismo Angolano na Graduação" é da responsabilidade do prelector Dinis Kebanguilako, que terá a moderação do professor João Lourenço da Cunha.
Como se formou uma nação
Autor do já clássico estudo "Angola - Nascimento de uma
Nação", resultado da sua tese de doutoramento, Carlos Serrano é antropólogo e professor aposentado do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP). Foi director do Centro de Estudos Africanos (CEA-USP) e integra o corpo editorial de diversas revistas de História de África.
"Carlos Serrano nasceu em Cabinda, em Janeiro de 1942. Fez os estudos secundários no sul de Angola, perto do Lubango, na Escola de Regentes Agrícolas do Tchivinguiro. E já em Lisboa, a fazer formação superior, e porque não havia universidade em Angola, mantém contactos com as figuras de destaque da Casa
dos Estudantes do Império (CEI). Nacionalista empenhado, reviu-se e engajouse logo na luta de libertação nacional e foi amigo dos principais lideres do MPLA da altura, nomeadamente de Viriato da Cruz, Mário Pinto de Andrade, António Jacinto, Mário António e muitos mais", resume o director do jornal Cultura.
Por isso, segundo Gaspar Micolo, o antropólogo angolano residente no Brasil pôde fazer um dos estudos mais importantes sobre a construção da Nação angolana, isso porque, avança, Carlos Serrano aprofunda as raízes da formação da identidade nacional que, entre vários, dá o exemplo “do facto nacional proporcionado pela Luta de Libertação Nacional, em que as diversas comunidades existentes no interior das fronteiras nacionais conjugam os seus esforços em direcção a uma unidade real baseada na luta contra o colonialismo”.
Pesquisador activo, Carlos Serrano publicou ainda “Os
senhores da terra e os homens do mar” (FFLCH-USP, 1983), "A revolta dos colonizados" (Atual, 1995, com Kabengele Munanga), “Brava gente do Timor: a saga do povo maubere” (Xamã, 1997, com Maurício Waldman) e “Memória d’áfrica: a temática africana em sala de aula” (Cortez, 2007, com Maurício Waldman). O reconhecimento pelo seu trabalho na área de Ciências Humanas veio em Novembro de 2009, aquando da sua consagração como vencedor da disciplina de Investigação em Ciências Humanas e Sociais do Prémio Nacional de Cultura e Artes promovido pelo Governo angolano.
A formação da identidade nacional e o ensino
Presente na Literatura Angolana, o tema da identidade nacional é uma tradição antiga, pois faz parte não só da resistência, como também dos primeiros momentos de luta contra o colonialismo. De acordo com Gaspar Micolo, essa tradição vem desde o nati
vismo, com os jornais do final do século XIX e começo do século XX, passando pelos anos 40 e 50, sobretudo, com toda a actividade da Mensagem e da Cultura, mas também, incluindo-se aí, o movimento dos jovens intelectuais que teriam como palavra de ordem “Vamos descobrir Angola!”,
jovens intelectuais que vão ter o papel de liderança na luta de libertação. Por isso, explica o porta-voz do evento, as abordagens do historiador Alberto Oliveira Pinto e da professora Rosa Cruz e Silva deverão elucidar esta perspectiva, complementando-se.
O historiador Alberto Oliveira Pinto, nasceu a 8 de Janeiro de 1962, em Luanda, onde viveu a sua primeira infância, acabando depois
por se fixar em Lisboa, a capital portuguesa. Só voltaria a ver a cidade das memórias da avó em 1996. Historiador e professor universitário, é membro da União dos Escritores Angolanos, e já recebeu vários prémios em Angola, quer seja pelos trabalhos lite
rários como pelas investigações na área de História. Depois de concluir o seu doutoramento em História, em 2010, dedicou-se a escrever uma síntese da História de Angola, publicada em 2016, que já tem várias edições.
“Combinando as abordagens dos livros “Angola e as Retóricas Coloniais” e “Imaginários da História Cultural de Angola” conseguiremos compreender como os percursos do nacionalismo angolano contrastam com o universo paradisíaco propalado pelo discurso colonial português, ou seja, como desde a resistência sempre houve manifestação desta vontade de autonomia, independência, seja política ou cultural”, explica Gaspar Micolo.
De acordo com Gaspar Micolo, a abordagem da historiadora Rosa Cruz e Silva, que muito escreve sobre o impacto da imprensa nos séculos XIX e XX, deverá ser fundamental para percebermos a génese da formação de uma “consciência nacional” em Angola, pois, a partir dos periódicos da época, a professora angolana tem sabido dar a conhecer o pensamento político que os principais autores das doutrinas emancipadoras, conscientemente fizeram por divulgar.
Recorde-se que Rosa Cruz e Silva deu uma importante contribuição para os estudos da imprensa angolana, ao trazer para o público em geral uma breve descrição de 26 títulos de periódicos, no ano de 1997, intitulado "Os periódicos como fonte de pesquisa histórica – a imprensa escrita de Angola do século XIX", num período em que os meios de pesquisas académicas digitais não eram tão populares. Esse trabalho consistia num material de divulgação do Arquivo Nacional de Angola, cujo levantamento apresentado informava que existiam jornais publicados em Ambriz, Benguela, Catumbela, Mossamedes e Luanda, perfazendo um total de 59, dos quais 33, constavam na lista dos periódicos da Biblioteca Municipal de Luanda.
Doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Dinis Kebanguilako é professor de Didáctica de História no ISCED de Luanda, há mais de uma década, leccionado igualmente as disciplinas de Teoria e Metodologia de História.
De acordo com o porta-voz do evento, a consciência histórica é fundamental para a cidadania e o sentimento patriótico, é por isso que, tendo em conta as valiosas funções sociais da História, importa a abordagem sobre “O Ensino da História do Nacionalismo Angolano na Graduação” que será feita pelo historiador e professor universitário Dinis Kebanguilako.