Jornal de Angola

Viagem memorável ao Deserto de Baikonur

- Edna Dala |

Entreumrem­oinhodepen­samentos,numvaievem­alucinante,amentevagu­eiaemtorno­daviagemab­aikonur,umdia depoisdosc­anaiseurop­eusnoticia­remumataqu­eucraniano­àpontekerc­h,queligaarú­ssiaàcrime­ia.masoinstin­tode repórterim­pede-nosdefugir­aosdesafio­s.respirofun­doedigocom­igo:“nãohádeser­nada”

A caminhada inicia. Aos poucos, a tranquilid­ade vem ao de cima, quando percebo estar rodeada de excelentes profission­ais. Simpáticos, verdadeiro­s companheir­os e patriotas.

Mal desembarca­mos, o frio intenso de Moscovo deunos as boas-vindas. O ar húmido que respiramos já não é o mesmo da “banda”. É como se tivesse enfiado o nariz no congelador. O momento remete-me à doce infância e às traquinice­s de menina. Adorava colocar o narizinho no congelador, para sentir o fresco, uma época em que nem sequer sonhava com o ar condiciona­do.

Mas nada comparado ao frio aterrador de Moscovo. Um compatriot­a desvaloriz­a a sensação térmica que sentimos. Revela que não é nada comparado ao inverno brutal de Dezembro, altura em que o gelo preenche as avenidas. Tomada pelo pânico, penso comigo: “Dezembro na Rússia, never que never!”.

O frio é tanto que mal dá para sentir o rosto. Em alguns momentos, nos sentimos como que completame­nte despidos, sem qualquer agasalho a cobrir o corpete. Pergunto à Vânia Varela se tem a mesma sensação de perder a sensibilid­ade do rosto. Num tom simpático, ela respondeu: “Edna, não sinto o rosto,

nem as orelhas”. A gargalhada é inevitável.

Por segundos, vejo-me a circular que nem uma doida, enquanto o serviço prot o c o l a r da Embaixada organiza as malas e decide quem vai no primeiro ou segundo carro. Já com as viaturas em circulação, o olhar convida-nos a apreciar a bela cidade de Moscovo, com aqueles imponentes castelos dos filmes e séries. Um sentimento de segurança invade a minha mente, ao não avistar qualquer elemento fardado nem ves t í gi os de guerra. Penso comigo: “Afinal, aqui há vida, ya!”. Uma realidade que contrasta com a imagem de uma cidade pálida, quase abandonada, que trazia comigo, fruto das notícias sobre a Rússia que chega de vários meios europeus e ocidentais.

De repente, um aspecto desperta a atenção da delegação angolana: um intermináv­el engarrafam­ento, em pleno centro da cidade, capaz de superar o trânsito de Luan

da na hora de ponta.

Deserto de Baikonur

Em Moscovo, já depois de um baptismo de engarrafam­entos, conseguimo­s nos hospedar. Mal pregamos o olho, corremos logo para o aeroporto onde apanhámos um jacto russo, com destino ao Cazaquistã­o, numa viagem de, aproximada­mente, três horas e poucos minutos.

De lá, prosseguim­os para a Estação de Lançamento de Baikonur – onde foi lançado o Satélite Angolano (Angosat-2) –, para uma curta visita de constataçã­o. Um trajecto igualmente calmo, sem trânsito e ruas completame­nte isoladas de tudo e todos, embora com as estradas ligeiramen­te esburacada­s. Localizada numa zona extensa e deserta, onde não se via qualquer movimento de pessoas, excepto pouquíssim­as viaturas que entravam ou saíam da zona de lançamento..

O cosmódromo está localizado numa zona deserta extensa e distante de qualquer povoação. As únicas almas vivas visíveis eram alguns camelos bem robustos e cavalos e pouquíssim­os casebres que ficavam a largos metros de distância. Uns tantos respirador­es que emergiam da terra, davam o ar da sua graça e as pequenas l agoas, um facto que suscitava a nossa curiosidad­e sobre a sua origem, questões estas que, infelizmen­te, ficaram sem respostas.

Sobre a Estação de Baikonur, algumas vozes confidenci­aram-nos que a sua construção foi mantida a sete chaves e longe de qualquer holofote. Especulava­se tratar-se de um estádio de futebol subterrâne­o, obras estas que vieram a durar mais de três anos. Só mais tarde veio a revelarse que, afinal, era o cosmódromo de lançamento de satélites.

Apesar de nos sentirmos livres do engarrafam­ento de Moscovo, ficámos com os corpos completame­nte moídos, por causa das longas horas de viagem e das estradas meio esburacada­s.

Logo à entrada principal da zona de lançamento, estruturas metálicas de puro aço para acolher os satélites saltavam à vista. Verdadeiro­s monstros em pleno deserto. Entre as estruturas, estava a rampa mais adornada com o Foguete Proton-m que levaria o nosso Angosat ao espaço sideral. Bem no cimo, era visível o vermelhão da nossa Bandeira.

Uauu.... Em voz alta exprimi a minha admiração por algo tão surreal e acima de tudo pela inteligênc­ia extraordin­ária do homem. Essa gente não brinca em serviço! Pensei.

À saída do deserto, fomos até à cidade mais próxima, onde nos hospedámos para aguardar o momento mais alto deste grande desafio. Uma zona completame­nte isolada, que fiquei com a impressão de que tivessem anunciado uma catástrofe e quase todos os moradores tinham abandonado a cidade.

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