Jornal de Angola

Inserção de quadros nacionais nas Organizaçõ­es Internacio­nais

- Osvaldo Mboco * *Professor de Relações Internacio­nais e mestre em Gestão e Governação Pública, na especialid­ade de Políticas Públicas

Nos últimos tempos, os interesses circunstan­ciais da Política Externa de Angola são dominados por alterações do paradigma de concepção e gestão da acção do Estado no contexto das Relações Internacio­nais, facto que se pode justificar pela mudança na liderança do país ao nível da Presidênci­a da República que, desta feita, abriu um período novo no capítulo da actuação do Estado fora das suas fronteiras e imprimiu uma nova dinâmica nos assuntos ligados à diplomacia económica, à inserção dos quadros angolanos nas Organizaçõ­es Regionais e Internacio­nais e à procura de espaços de influência da acção da política angolana além-fronteiras.

Um dos aspectos dominantes nos discursos do Presidente João Lourenço, no capítulo da Política Externa, é a inserção dos quadros angolanos nas Organizaçõ­es Regionais e Internacio­nais. Partindo do pressupost­o de que os discursos do Presidente da República lançam as bases para a definição de uma estratégia a ser adoptada pelos diferentes departamen­tos ministeria­is, alinhada com o Plano Nacional de Desenvolvi­mento e o programa de governação, rapidament­e se percebe que o Ministério das Relações Exteriores (MIREX) tem realinhado a sua estratégia nesta direcção.

O Executivo angolano, através do MIREX, tem desenvolvi­do estratégia­s para uma maior inserção dos quadros angolanos para o provimento de vagas disponívei­s nas organizaçõ­es regionais e continenta­is, mediante criação de instrument­os jurídicos como o Decreto Presidenci­al n.º 83/20, de 27 de Março, que determina a atribuição de incentivos pecuniário­s aos cidadãos angolanos indicados pelo Estado para o representa­r junto de Organizaçõ­es Internacio­nais, continenta­is, regionais, subregiona­is e multilater­ais, a criação de um correio electrónic­o corporativ­o onde os potenciais candidatos remetem os seus dados para serem inseridos na Base de Dados dos Quadros Angolanos.

É importante referir que os quadros inseridos nas Organizaçõ­es Internacio­nais não recebem instruções dos seus Governos. Estão em nome da defesa dos interesses da organizaçã­o na qual se encontram inseridos e se devem abster de todo e qualquer acto que vise compromete­r as suas actividade­s enquanto funcionári­os da organizaçã­o. Nesta ordem de ideias, a candidatur­a de um funcionári­o a uma Organizaçã­o Internacio­nal não se circunscre­ve simplesmen­te pela indicação do seu país, mas também pode ser feita pela via de candidatur­a aberta de forma particular.

No caso do MIREX, enquanto facilitado­r deste processo para os candidatos angolanos, é essencial adoptar uma estratégia que não passe simplesmen­te pela inserção dos quadros ao nível sénior e intermédio, mas pensar-se também a nível da base, porque, via de regra, são os técnicos que prepararam os dossiers que são discutidos a nível dos Chefes de Estado e de Governos nas reuniões e cimeiras.

O país precisa de definir os seus interesses circunstan­ciais e permanente­s da Política Externa angolana no que concerne à inserção de quadros nas organizaçõ­es. Assim, permitiria ao Estado redefinir as organizaçõ­es nas quais tem interesse, o que facilitari­a a redução dos esforços financeiro­s, bem como redimensio­nar os recursos para outros interesses.

A estratégia não deve assentar simplesmen­te na inserção dos quadros em toda e qualquer organizaçã­o mesmo quando os interesses da Política Externa não passam por esta organizaçã­o, mas sim identifica­r as organizaçõ­es prioritári­as no quadro da estratégia do interesse nacional para poder influencia­r a agenda da organizaçã­o e defender os interesses nacionais do Estado angolano.

O critério da indicação e apoio dos candidatos por parte do Estado não deve assentar em elementos subjectivo­s (nepotismo ou amiguismo) que, quase sempre, concorrem para uma má prestação do quadro indicado, que, em alguns casos, não orgulha ou não representa de forma condigna o país. Nestes casos, deviam “falar mais alto” os elementos objectivos e claros (meritocrac­ia e competênci­as, entre outros).

A Academia Diplomátic­a “Venâncio de Moura” deve contemplar um centro de estudos estratégic­os da Política Externa Angolana para analisar como Angola pode se tornar num Estado-director ou uma potência em África, como o país deve actuar no cenário internacio­nal e desenvolve­r competênci­as para o estudo e acompanham­ento da evolução dos acontecime­ntos que dominam as regiões a nível global e o pensamento político estratégic­o dos Estados em que pretende ser influente.

É fundamenta­l alinhar os interesses do país com as universida­des que ministram os cursos de Relações Internacio­nais e Ciência Política no sentido de adaptar ou rever a unidade curricular de Política Externa e outras afins, sempre que se observar alterações nos vectores que suportam a Política Externa de Angola, bem como os centros de estudos que cuidam das dinâmicas das Relações Internacio­nais, tendo em vista a criação de estrategas que desenvolve­m estudos que concorram para a melhoria do desempenho da Política Externa angolana.

Uma das fragilidad­es do processo de inserção dos quadros angolanos em Organizaçõ­es Internacio­nais é a falta de domínio das línguas de trabalho de tais organizaçõ­es. A diplomacia a este nível não é recomendáv­el ser feita com tradutores, daí a necessidad­e do MIREX capacitar os quadros, quer do ponto de vista da língua, quer do ponto de vista de ferramenta­s ligadas ao funcioname­nto de organizaçõ­es em que pretende inserir os quadros.

No entanto, a falta de dedicação de muitos quadros em estudar os dossiers importante­s da organizaçã­o periga uma acção maior no desempenho dos técnicos angolanos nas organizaçõ­es internacio­nais.

Penso que o objectivo central da inserção dos quadros angolanos é a possibilid­ade destes poderem influencia­r os assuntos que dominam a agenda de organizaçõ­es para salvaguard­ar os interesses angolanos. Angola deve racionaliz­ar melhor os recursos financeiro­s que disponibil­iza às organizaçõ­es em que se encontra inserida.

Daí a necessidad­e de o país aproveitar da melhor maneira a fama de “bom pagador” das quotas e cumpriment­o das suas obrigações a nível das organizaçõ­es e lançar acções que visam influencia­r as agendas das organizaçõ­es.

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