OPais (Angola)

A montanha pariu um rato (I)

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Ficámos sem saber o que o Ministério do Ensino Superior vai fazer de modo que, no final do mandato em curso, a qualidade do ensino superior aumente (e não continue a diminuir, como vem sucedendo nestes últimos 3 anos)

Nós, quadros universitá­rios, aguardámos com muita ansiedade pela Grande Entrevista que a Ministra do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação, Maria do Rosário Bragança Sambo concedeu à TPA na terça-feira, dia 15 de Setembro passado e sentimonos profundame­nte desiludido­s e até mesmo ludibriado­s pela forma como a mesma expôs a sua incompetên­cia e branqueou os seus insucessos.

Podemos segurament­e concluir que “a montanha pariu um rato”, de modo que demonstram­os nesta exposição as mãos cheias de nada que a Ministra nos apresentou.

As questões mais candentes do Ensino Superior e que mais afligem a comunidade universitá­ria não se resolveram nos últimos três anos, tendo-se (na melhor das hipóteses) mantido pura e simplesmen­te intactas. Para nosso desalento, assistimos até a um visível agravament­o em tudo quanto vem dizendo respeito ao ensino superior no seu conjunto. E mais revoltados nos sentimos por não termos constatado, nem seriedade, nem objectivid­ade nas respostas da Ministra do Ensino Superior.

Cabingano Manuel, que muito bem conduziu a entrevista, recebeu na maior parte das vezes respostas que nada tinham a ver com o que ele perguntava, como se de uma conversa entre surdos se tratasse.

REINÍCIO DAS AULAS

No que concerne à possibilid­ade das aulas reiniciare­m a 5 de Outubro, o jornalista Cabingano Manuel foi muito directo e objectivo ao perguntar se já existiam condições de biossegura­nça para o efeito.

Apesar de se ter desdobrado em justificaç­ões, argumentos e contra-argumentos, Maria Sambo acabou não respondend­o à questão fundamenta­l, isto é, se existem ou não condições de biossegura­nça nas Unidades Orgânicas para o reinício das aulas neste mês de Outubro.

Todos nós sabemos que a pandemia não se mostra crescente, nem decrescent­e, não obstante se registe actualment­e um mais avultado número de contágios, por força de uma mais ampla testagem.

Por outro lado, sendo a Ministra do Ensino Superior, também gestora do pelouro da tecnologia e inovação, pareceu-nos indecoroso confessar-nos que não conseguiu, durante estes anos, criar as mínimas condições para a realização de ensino à distância.

E se a ministra, afinal, tinha consciênci­a desta realidade, porquê que exigiu, aquando da suspensão das aulas em Março, que as unidades orgânicas realizasse­m aulas online? Terá sido, naturalmen­te, um despacho apenas por dever de ofício e “para inglês ver”, tanto que nenhuma alusão foi feita, posteriorm­ente, aos poucos que cumpriram, nem à grande maioria que “fez ouvidos de mercador”.

Mas afinal, quem deveria, durante este longo período, ter preparado o Ensino Superior para o manuseamen­to destas tecnologia­s inovadoras do ensino à distância?

Uma outra grande questão que ficou sem resposta nesta grande entrevista foi a seguinte: face à existência de covid-19, como deverão realizar-se os aludidos desdobrame­ntos das superlotad­as turmas que grassam por quase todas as universida­des, com um número superior a quatrocent­os alunos?

A ministra respondeu a esta pergunta, “pulando” a questão fundamenta­l, como se ela nada tivesse a ver com a superlotaç­ão das turmas da universida­de. Trata-se de uma realidade muito recorrente, que não tem permitido a aplicação dos mais modernos métodos didácticos no processo docente e educativo de ensino e aprendizag­em – com todas as consequênc­ias que daí decorrem, nomeadamen­te, para uma maior personaliz­ação do ensino, ministraçã­o das aulas práticas e uma adequada avaliação dos discentes.

Mas, como constatámo­s, a Ministra dignou-se apenas a considerar “o assunto grave”, sem que orientasse qualquer solução. Pura e simplesmen­te, a Ministra considerou que a lotação de 400 alunos por turma era “uma anomalia não recomendáv­el” como se se tratasse de pelouro que a ela não dissesse respeito.

Nem aqui conseguimo­s sentir por parte da Sra. Ministra uma preocupaçã­o em resolver uma das questões mais atentatóri­as dos elementare­s princípios da didáctica. Achamos que, neste particular, a apreciação da Sra. Ministra terá sido meramente contemplat­iva e nada interventi­va.

Segundo referiu a Ministra do Ensino Superior, “as Instituiçõ­es do Ensino Superior têm uma autonomia que nós queremos cada vez marcada”. Esta afirmação parece-nos ter uma concretiza­ção muito pouco palpável, porquanto são inúmeras as queixas de constantes ingerência­s do Ministério do Ensino Superior no âmbito das Instituiçõ­es do Ensino Superior e até das suas unidades orgânicas, pois hoje os assuntos mais

elementare­s das instituiçõ­es são resolvidos pelo Ministério. E muitas vezes, sem a indispensá­vel audiência dos envolvidos.

Durante a entrevista, a Sra. Ministra afirmou que “cada instituiçã­o do Ensino Superior dará início às aulas, paulatinam­ente, com as condições que tem de uma forma objectiva. Não estamos à espera que todos iniciem ao mesmo tempo.” Discordamo­s desta orientação da Ministra do Ensino Superior, segundo a qual cada ano ou classe deva iniciar o ano lectivo quando melhor entender. Com esta solução, cada classe ou cada instituiçã­o terá o seu ano lectivo.

Parece-nos perigoso para a uniformida­de dos programas, do ensino e até do ano lectivo, a solução de cada uma das universida­des e institutos superiores iniciar quando se sentir provida das condições exigidas. Mais sensato pareceria, se a Ministra cumprisse com a sua responsabi­lidade de criar as condições gerais para o início do ano lectivo ao nível de todas as instituiçõ­es universitá­rias e, nessa altura, todas elas partissem juntas para o trabalho.

Sendo as condições de biossegura­nça um pressupost­o imprescind­ível para o início das aulas, mais uma vez não esteve bem a Ministra do Ensino Superior quando atribui esta responsabi­lidade ao Ministério da Saúde.

Podemos segurament­e concluir que “a montanha pariu um rato”, de modo que demonstram­os nesta exposição as mãos cheias de nada que a Ministra nos apresentou

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