Renovar esperanças no “Havemos de Voltar”!
Asensibilidade das películas fotográficas da época apenas captava os tons cinzas, sendo incapaz de registar a plenitude da beleza dos lilases do pôr-do-sol. Daí que o retrato de há 45 anos apresenta-se assim, pálido e, pela voracidade do tempo agreste, carcomido pelos bichos da terra.
- Mas por quê e sempre a memória, até parece um museu, que vive debruçado sobre o passado?
A memória não é um lugar onde se guardam os farrapos e bugigangas das nossas vidas. A memória é lugar de construção de novas narrativas que vão estruturar o imaginário colectivo. É lugar de disputas por afirmação. Aliás, a memória e a identidade são inseparáveis! Por isso, a preservação da memória é também uma questão de segurança nacional. Porque a história tem sempre vários protagonistas, e dependendo do lugar da fala de cada um, sua narrativa.
- Quem sóis? “Somos Mussunda Amigo!”… Escuta! Em Outubro de 1975, as notícias sobre os avanços e recuos da guerra dominavam a audiência. Do Sul, Ruacaná, Santa Clara, Pereira de Eça, Sá da Bandeira, Benguela, Lobito, Novo Redondo… Balombo, Alto Hama, Santa Comba, Morro do Tongo e Ebo, colunas perseguidas pelo exército sul-africano e elementos das UNITA-FALA precipitavamse em direcção a Luanda. Do Norte, São Salvador, Tomboco, Ambrizete, Ambriz, Uíge, Negage, Caxito, eram território da “Liberdade e terra” da FNLA-ELNA, que apoiados por mercenários recrutados em vários países transformaram a localidade do Ambriz, no seu Quartel-general. Seu pesadelo chamava-se Kifangondo!
Diante das notícias divulgadas pela rádio e da onda de boatos gerados pela incerteza, a aldeia dormia e acordava com a zumbir nos ouvidos. O antigo estabelecimento comercial dos Machados, no bairro Pange-Amboim, foi transformado em comité do MPLA.
Com o início da guerra, as empresas, lojas e escolas encerraram suas portas e boa parte das famílias portuguesas partiu desesperada. A economia parou. Os jovens camponeses e operários que trabalhavam na cidade e nas fazendas ficaram desempregados.
Vivia-se com euforia diante da aproximação do dia da proclamação da independência. Angola é nossa terra! Um só Povo! Uma Só Nação! A Luta Continua! A Vitória é Certa!
Com a ameaça de supostos soldados antropófagos, ninguém na aldeia queria ser transformado em sarrabulho (prato feito com vísceras). Então, restou apenas ingressar nas FAPLA e empunhar uma arma para lutar contra o inimigo da liberdade que matava e comia o coração do povo. “Cada cidadão é e deve sentir-se necessariamente um soldado”.
A moda estava vestida de uniforme castanho, botas soviéticas, chapéu a cowboy e uma arma Pepecha (PPSh-41), que com um carregador de 71 munições, disparava 900 tiros por minuto.
Em grupo, à noite, ouvia-se o noticiário da Rádio Oficial e antes de dormir reza-se para que Deus protegesse a vida pelo menos até ao amanhecer.
A aldeia comia tudo o que produzia e com o excedente comprava no comércio rural bens de que necessitava... Ainda beneficiava de crédito que era pago depois da colheita. Os comerciantes estavam em todos os lugares... A rede comercial era verdadeiro mecanismo de controlo administrativo do território e civilizacional com temperos de bacalhau, vinhos e fado.
E hoje? Hoje sente-se a falta de uma rede de comerciantes rurais com olhar sensível sobre o campo! Porque aquele que povoa seu subconsciente com referências ao campo como sendo o “mato”, lugar inóspito, acciona inadvertidamente o bloqueio que o cega!
Nascemos e crescemos no campo, já pensamos num “Projecto de Revitalização das Comunidades Rurais” sob o slogan “Um olhar rural sobre o campo”. Partilhamos com muitos, mas ficamos pendentes sem retorno. Mas ao ver na tomada de posse alguns membros do Conselho Económico e Social criado pelo PR João Lourenço, renovamos as esperanças no “Havemos de Voltar/Aos nossos Campos”…
Que nostalgia!... Na noite da independência, antes do hino “Angola Avante!” cantamos eufóricos com Miró, “A independência está chegando e a terra vai se resplandecer…”,
“Compreendes a minha angústia? (…)/Nós somos!/ Inseparáveis/ caminhando ainda para o nosso sonho”.
Ai Sagrada Esperança!
Comemora-se nesses dias em todo o mundo a semana do investidor. Essa efeméride que decorre, geralmente, na primeira semana de Outubro é uma campanha global criada em 2017 pela Organização Internacional das Comissões de Mercado de Capitais (IOSCO, na sigla em inglês), enquanto órgão internacional de coordenação das políticas regulatórias e supervisoras deste segmento do mercado financeiro. A iniciativa foi concebida com o propósito de promover a literacia (educação) financeira no seio da população, bem como a protecção do investidor.
A literacia financeira é, segundo a Organização para a CooperaçãoeDesenvolvimentoEconómico (OCDE), uma combinação de consciência, conhecimentos, habilidades, atitudes e comportamentos necessários para se tomar decisões financeiras sólidas, visando alcançar o bemestar financeiro individual (Cfr: The World Bank. Good Practices for Financial Consumer Protection., June 2012, p. 29).
Em Angola, a efeméride está a ser vivenciada com a realização de uma série de webinars sob os auspícios da Comissão de Mercado de Capitais (CMC). Ao longo da semana, serão abordados diversas temáticas relacionadas às finanças e ao mercado de capitais nacional. Constitui preocupação da CMC ver o mercado de capitais nacional funcional e dinamizado, onde investidores não profissionais, sobretudo as pessoas individuais tenham um papel relevante para o seu desenvolvimento há muito almejado.
Essa tal pretensão só é alcançável com uma população financeiramente instruída, o que pressupõe a promoção de hábitos de poupança (saving) no seio das pessoas, propiciando a sua participação no mercado de capitais para que tenham a oportunidade de rentabilizarem essas poupanças e se transformem, eventual
mente, em investidores com bastante sucesso (rich).
A falta de literacia financeira dos angolanos de um modo geral é notória e um problema grave que deve ser urgente e energicamente combatido, pois contribui para a não valorização devida do património detido e, de certa forma, promove a eternização da pobreza no seio da população. Assim, o nível de literacia financeira da população é directamente proporcional à sua prosperidade financeira, que tem como consequência imediata a extinção da pobreza.
Em sede do mercado de capitais, a educação financeira é fundamental para a protecção dos consumidores de serviços financeiros, pois investidores com um nível adequado de literacia financeira podem proteger-se melhor contra as más práticas, denunciando, caso ocorram, os comportamentos inadequados dos intermediários financeiros às autoridades de supervisão. O desejável é que os investidores tenham o nível de conhecimento adequado sobre o mercado de capitais para que primeiramente saibam se proteger, evitando que sejam facilmente enganados por outros intervenientes do mercado.
Assim, urge que as temáticas sobre a educação financeira sejam inseridas nos programas escolares a todos os níveis de ensino a par daquilo que a própria CMC já prevê na sua “Estratégia de Actuação 2017-2022”.
Por conseguinte, o mercado de capitais angolano só desenvolverse-á quando se tornar democrático e isso só é possível com uma população dotada de literacia financeira que reconheça o valor da poupança e dê o devido valor ao princípio do valor temporal do dinheiro. Fazemos votos que nessa semana do investidor, a CMC consiga fazer passar a mensagem para o bem desse importantíssimo segmento do mercado financeiro nacional.