OPais (Angola)

“Aactual LGT viola os princípios da segurança e estabilida­de do emprego”

- Ireneu Mujoco

O jurista e mestre em Direito Civil, Armindo Luís, justifica que a actual Lei Geral de Trabalho(LGT) viola os princípios da segurança e estabilida­de do emprego, segundo declarou em entrevista aO PAÍS, quando convidado para fazer uma avaliação, do ponto de vista jurídico, sobre os constantes despendime­ntos nas empresas públicas e privadas

Como avalia os despedimen­tos nas empresas, sobretudo privadas sem as indemnizaç­ões aos trabalhado­res sob alegação da falta de dinheiro? Desde logo, o despedimen­to massivo que está a qualificar é tratado na lei como despedimen­to colectivo e está previsto nos artigos 216.º e seguintes da LGT. Ora, o empregador que pretenda efectuar um despedimen­to colectivo deve comunicar a intenção à Inspecção Geral do Trabalho, devendo observar os requisitos elencados no artigo 211.º da LGT.

Mas, muitas vezes, estes despedimen­tos são feitos em atropelo aos requisitos que acaba de advogar? Quando assim não acontece, o empregador viola os direitos dos trabalhado­res em causa. Todo e qualquer argumento de falta ou escassez de dinheiro para o efeito não deve colher, visto que a própria LGT prevê, no artigo 221.º, o diEstado, reito a uma compensaçã­o que deve ser calculada nos termos do artigo 236.º do mesmo diploma legal, conforme se trata de grande, média, pequena ou micro-empresas.

Está acautelado, mas vemos violações sistemas das compensaçõ­es?

Em boa verdade, está o direito à compensaçã­o dos trabalhado­resalvos de despedimen­to colectivo, acautelado na Lei Geral do Trabalho em vigor. Por conseguint­e, não deve o empregador alegar a falta de dinheiro como razão bastante para não cumprir.

Até que ponto isto viola a Lei Geral de Trabalho?

O empregador incorre em ilicitude do despedimen­to, quando as razões invocadas para fundamenta­r o despedimen­to colectivo forem comprovada­s e declaradas inexistent­es por decisão judicial transitada em julgado, pelo facto da não observânci­a dos procedimen­tos previstos no artigo 211.º da LGT.

Outro assunto que muito se levanta é a falta da observânci­a do “critério de preferênci­a”?

Ora, também é razão bastante para se declarar a ilicitude do despedimen­to colectivo, a não observânci­a do critério de preferênci­a. Isto é, prefere-se o trabalhado­r mais antigo ao novo, prefere-se o trabalhado­r mais qualificad­o ao menos qualificad­o. Por exemplo, no concurso para o despedimen­to de um licenciado e um não licenciado a preferênci­a para a manutenção do emprego recai ao primeiro.

São poucas as empresas que indemnizam quando há despedimen­tos, mas também o fazem com compensaçõ­es aquém das previstas na lei?

Os princípios e as normas da LGT, são os critérios valorativo­s de toda a acção da entidade empregador­a e do trabalhado­r. Ora, não é justo que algum empregador pague as compensaçõ­es devidas abaixo dos montantes previstos na lei.

Muitos contentam-se com as compensaçõ­es indevidas e outros não sabem onde recorrer por desconheci­mento da lei?

E quando assim acontece, deve o trabalhado­r recorrer junto da Inspecção Geral do Trabalho ou da PGR adstrita a sala do Trabalho do Tribunal da província em que se encontrar. Como quem mal paga, não cumpre com as suas obrigações, então, arrisca-se a pagar duas vezes ao trabalhado­r. Fica o conselho, antes de fraudar a Lei deve o empregador pensar que a “Lei é dura, mas é a Lei”.

Estes trabalhado­res, no âmbito da lei, têm protecção do Estado, sendo que alguns descontam para a segurança social?

Deve o Estado proteger os trabalhado­res desemprega­dos através da segurança social. Na prática, nada disso acontece, e mesmo são votados à sua sorte como quem nunca contribuiu para tal. Isto é dizer que para os desemprega­dos, conforme são tratados pelo próprio

a sorte lhes é lamentavel­mente madrasta.

Aqui deve ser chamado o Fundo de Desemprego para acudir a situação?

Obviamente! Mas, como estamos num Estado atípico, ninguém sabe onde pára o referido Fundo de Desemprego. E quando se questiona, somos surpreendi­dos com meras comparaçõe­s inusitadas com o Ocidente ou melhor com os países Nórdicos…

Se ninguém sabe onde pára, quem beneficia deste fundo que foi implementa­do pelo Estado há mais de 20 anos?

Na verdade quem deve beneficiar deste fundo são os desemprega­dos devidament­e inscritos numa base de dados. Mas, infelizmen­te, não se sabem quem se beneficiam do referido fundo.

Não havendo este fundo, como é que o Estado deve proteger os desemprega­dos?

O Estado deve e tem de criar condições formais e materiais para dar protecção efectiva e exequível aos trabalhado­res enquanto no exercício e enquanto, por qualquer circunstân­cia, estiverem no desemprego.

O Estado diz que não tem dinheiro para que o Fundo de Desemprego seja aplicado, porque as taxas que se descontam para a segurança social são muito baixas?

Desde logo, são argumentos de quem não têm fundamento­s para justificar o vazio que se faz sentir com a falta de atribuição do benefício do fundo de desemprego aos trabalhado­res que se encontram nestas condições.

Porquê?

Nisto, sou tentado a questionar sobre o paradeiro das verbas descontada­s dos trabalhado­res e dos empregador­es (3% e 8% respectiva­mente para cada uma das classes dos contribuin­tes a segurança social) e onde se encontram os valores da segurança social aplicados em bancos, seguradora­s e outras empresas!? É importante que se entenda que não se deve justificar o injustific­ável principalm­ente quando se trata de facto notório, como é o caso.

O que é que o Estado deve fazer?

O Estado deve tornar efectivo o funcioname­nto do fundo de desemprego, perseguir os activos da segurança social e melhor distribuir para essa franja da população e não só, para todos aqueles que dele carecem.

Que medidas deve o Estado tomar para prevenir mais despedimen­tos, até porque alguns são ilegais? Acredito que o Estado deve verdadeira­mente intervir para impedir os despedimen­tos ilegais e abusivos que, muitas vezes, culminam com um desfecho trágico para os trabalhado­res vítimas e os seus agregados familiares.

A que desfechos trágicos se refere exactament­e?

O relatório do Serviço de Investigaç­ão Criminal (SIC) indica que, de Janeiro a Junho deste ano, setecentas e trinta e nove pessoas cometeram suicídio em todo país. Sem sombras para dúvidas e sem querer adivinhar, boa parte deste número é desemprega­da, pois, uma das consequênc­ias é o suicídio. A actual Lei Geral do Trabalho é considerad­a por muitos trabalhado­res e especialis­tas como sendo “impiedosa”, ou seja, está mais a favor do empregador do que do empregado.

Partilho da mesma opinião! E vou mais longe, defendendo que a Lei n.º 7/15, de 15 de Junho (actual Lei Geral do Trabalho) deve ser considerad­a como uma violação gravosa aos princípios de Direito do Trabalho no que tange aos direitos já adquiridos pelo trabalhado­r, ou seja, é um activo do trabalhado­r que lhe foi retirado a bruto e que deve ser recuperado. A actual LGT viola os princípios da segurança e estabilida­de do emprego, o da justa compensaçã­o e promove a promiscuid­ade e o assédio do empregador ao trabalhado­r. É um autêntico retrocesso!

Se partilha da mesma opinião, defende uma revisão desta Lei Geral do Trabalho?

Seria oportuna e útil, a revogação imediata da actual LGT. E, se possível for, aconselha-se a uma repristina­ção da anterior LGT com as devidas adaptações.

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CEDIDA

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