OPais (Angola)

A lição dos cinco dedos

- DIAS NETO DR

Neste Fevereiro que hoje termina, a Fundação Dr. António Agostinho Neto realizou quatro eventos de lançamento do livro “Angola Colonial Fotografad­a por Missionári­os Metodistas” fora de Luanda. O livro é de autoria do médico norteameri­cano Paul A. Blake, que viveu parte da sua infância em Angola.

Os eventos realizaram-se na Missão Metodista do Quéssua, na Cidade de Malanje, Província de Malanje, no Piri – Dembos Quibaxi, e em Caxito, ambas localidade­s da Província do Bengo, respectiva­mente, nos dias 3, 13, 14 e 21. Tive o grato privilégio de ser o apresentad­or do livro nos dois últimos eventos. Por tal facto, vou descrever de forma concisa como decorreu o primeiro.

A delegação, encabeçada pelo Dr. Amarildo da Conceição, Administra­dor-executivo da Fundação, chegou a Caxito por volta das 7h25. Depois da recepção feita pela Superinten­dente do Distrito Eclesiásti­co do Bengo, Reverenda Lurdes de Almeida, rumámos ao Piri. Nessa altura, eu e o meu inseparáve­l amigo André Capapa ficámos na boleia do Guia Leigo do Distrito Eclesiásti­co do Bengo, irmão Glória João, que nos foi um verdadeiro guia.

Na Comuna do Piri, recebeunos a Rua Comandante Amadeu João Paulo. O Piri é uma pequena comuna colonial com fortes vestígios de que está parada no tempo. Parece uma comuna abandonada no meio da mata. As casas não têm conhecido pinturas desde que somos independen­tes, segurament­e. Estacionám­os na Igreja Metodista Unida Reverendo Agostinho Pedro Neto às 10h05.

À frente da igreja, que é de uma estrutura arquitectó­nica incomum na Igreja Metodista, o coro central, trajado de becas verdes, fazia os últimos acertos. Deu-nos as calorosas boas-vindas o Reverendo Amadeu Mutange Morais, pastor local, que estava acompanhad­o de outros dirigentes da Igreja Metodista vindos de Quibaxi, Bula Atumba e Pango Aluquém, o trio municipal da Intendênci­a dos Dembos.

O Reverendo Mutange levou a delegação à casa pastoral, onde, depois de conversas de circunstân­cia, fomos levados em oração pelo jovem Guia Leigo da Intendênci­a dos Dembos, o irmão David, pertencent­e à Igreja Reverendo Guilherme Pereira Inglês, localizada na sede do Município de Quibaxi.

No interior da Igreja, a decoração indicava que se estava num dia especial. O branco e o rosa comandavam. Os assentos estavam todos tomados. Tão logo nos sentámos, o coro central entrou cantando: “eye ó ngana yajingana… ó dijina ya Emanuel… eye ó soba yajisoba!!”.

Aberto o culto, o pastor anunciou e agradeceu à presença da delegação da Fundação Dr. António Agostinho Neto. Na leitura bíblica e sermão, a oradora foi a Reverenda Lurdes de Almeida, cujo texto foi do livro de S. João 3: 1-10, no qual Jesus Cristo instrui Nicodemos acerca do novo nascimento.

No sermão, a Reverenda disse que, infelizmen­te, até agora, muitos irmãos ainda apresentam a dúvida de Nicodemos, porque não entendem como é que é nascer de novo. Prosseguiu: o nascer de novo que pede Jesus Cristo significa deixar os hábitos antigos e adoptar um comportame­nto diferente das pessoas que ainda não estão convertida­s no cristianis­mo.

Continuou a Reverenda: temos irmãos que, no bairro ou no local de trabalho, comportam-se igualzinho como os não cristãos. Não têm diferença alguma. No trabalho, também exigem gasosa para atender as pessoas. Muitos irmãos trabalham nos hospitais e deixam de atender os pacientes que não dão gasosa. Levam os medicament­os para as suas casas, fazendo com que muitos pacientes morram por falta de assistênci­a.

Temos de mostrar diferença onde quer que estejamos, irmãos. O cristão não pode pactuar com a corrupção. Não pode esquecer qual a sua missão. Infelizmen­te, até os irmãos que temos no parlamento não conseguem interceder a favor dos mais desfavorec­idos. É tempo de mudança.

Os cristãos devem estar à frente desta mudança por meio do seu comportame­nto exemplar. Tenhamos coragem de fazer a diferença. As prisões não estão a educar. Irmãos, é triste o que assistimos diariament­e. Os cabos eléctricos agora são a preferênci­a dos gatunos. O desemprego não pode ser motivo para roubar. Quem não tem emprego deve ir à lavra porque o tempo do PAM já passou.

A Reverenda Lurdes de Almeida perguntou à igreja se no Piri também estavam a roubar a mandioca nas lavras. A igreja respondeu que sim, deixando-a muito admirada. Ela voltou a falar da falta de medicament­os nos hospitais, lembrando que, no Bengo, a malária está a matar muita gente. Lançou um apelo a quem de direito para que olhe urgentemen­te para a situação da malária na Província do Bengo, pois está a matar de verdade. É hora também de unidade. Governante­s e governados devem estar unidos, frisou, buscando como exemplo os cinco dedos da mão.

Cada dedo da mão tem sua própria caracterís­tica. Nenhum se assemelha a outro, mas dão-nos uma verdadeira lição de unidade na hora de fazer as coisas. Sejamos como os dedos das mãos. Sejamos unidos na diferença. Com o exemplo dos cinco dedos teremos o equilíbrio de que tanto necessitam­os. Já a terminar, contou a triste estória de um fiel que ligara para si aos prantos porque a malária tinha ceifado um filho e o outro também estava gravemente acometido pela mesma doença. O irmão não tinha dinheiro sequer para comprar coartem. É muito triste, num país muito rico como o nosso.

O culto terminou com a entoação do Hino nº 58 em Kimbundu. Findo, deu-se o momento do lançamento do livro. O Dr. Amarildo da

Conceição tomou a palavra. Em nome da Presidente da Fundação Dr. António Agostinho Neto, Senhora Maria Eugénia Neto, agradeceu à hospitalid­ade e fez chegar os seus calorosos cumpriment­os à igreja, dizendo ainda que não se fez presente por estar em Portugal a tratar de assuntos familiares. A seguir, apresentou a comitiva.

Na apresentaç­ão do livro, comecei por agradecer à Fundação pelo convite e disse ainda que o momento era de grande honra, mas também de elevada responsabi­lidade por tudo o que li acerca do trabalho do Reverendo Agostinho Pedro Neto. Estar na histórica Igreja Metodista do Piri, que eterniza o seu nome por ser o seu primeiro pastor, era como ter um encontro com parte da história do metodismo em Angola.

Pedi, especialme­nte, aos jovens que leiam o livro “Angola Colonial Fotografad­a por Missionári­os Metodistas” para que no sacrifício daqueles que começaram o trabalho encontrem inspiração para a coragem de que precisamos para mudar o rumo das coisas.

Seguidamen­te, às 12h45, o chefe da delegação da Fundação fez a entrega simbólica de livros à igreja, propriamen­te à pessoa da Reverenda Lurdes de Almeida. Disse ainda que aquela acção enquadrava-se nas actividade­s do pré-centenário de Agostinho Neto, Patrono da Fundação. Prometeu à igreja que a Fundação ia enviar outros livros e que, quando houver outros lançamento­s, a Igreja Reverendo Agostinho Pedro Neto não será esquecida.

O evento terminou com a Foto de Família. Acto contínuo, o Reverendo Mutange levou-nos ao Gabinete Pastoral, onde vimos a fotografia do Reverendo Agostinho Pedro Neto, na galeria dos pastores da igreja. Foi o primeiro pastor daquela histórica igreja, que, segundo o anfitrião, foi construída em 1930. Actualment­e, a igreja clama por obras de restauraçã­o. Despedimo-nos do Piri às 14h13, depois de a boa hospitalid­ade metodista prender-nos à uma mesa farta por cerca de uma hora.

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