Alienação musical, declínio cultural e o risco de uma educação corrompida
Para esta semana, sendo ainda a ressaca do dia da juventude angolana que se celebrou na quarta-feira passada, 14. 04, apesar de ser uma celebração que ainda causa dividendo, e porque no dia a seguir, 15, celebrou-se o dia mundial da arte e na sexta, 16, o dia da voz, decidimos refectir sobre este assunto que há muito tempo tem atormentado a nossa caixa pensativa. Um assunto que envolve a juventude, a arte e o poder da voz dos fazedores da arte.
Queremos começar essa reflexão relembrando a você, caro leitor desse jornal, que a música é a mais universal das artes. Sua presença se dá não apenas ao longo da história, mas também nas mais variadas formas e culturas. Não há civilização, grande ou pequena, que não possua sua própria expressão musical. A apreciação dessa arte não depende de língua ou nível cultural. A música influencia a sociedade; é a principal arte do mundo e uma forte presença artística na cultura local. Uma música provoca um efeito poderoso em uma sociedade. Regula o comportamento da sociedade, chegando mesmo a desencadear diversas reacções emocionais como a raiva, tristeza, nostalgia e alegria aos seus ouvintes. (conceitos sugados de algumas fontes escritas) Segundo ainda as mesmas fontes, a música é considerada uma das artes que mais impacta a nossa sociedade. E partindo desses pressupostos todos, arte, cultura e sociedade, elementos que acompanham e com os quais se faz a música, pensamos que alguém precisa colocar os pontos nos “i´s” e os traços nos “t´s” de algumas letras musicais que soam por essa cidade de Luanda. Na semana passada, enquanto viajávamos por um dos táxis que arriscava perigosas mbaias, talvez para “acabar mesmo de nos matar”, no último banco, uma senhora reclamava pelas músicas que soavam aí dentro. Do Rocha Pinto ao Escongolense, não passávamos do “me chuparam”, “vou lhe meter” e mais outras mensagens que a muitos adultos, naquele transporte, incomodava.
Que cultura se reflecte em mensagens musicais como “me chuparam?” que arte há em mensagens como “vou lhe meter?” Sim! A linguagem usada nos textos literários, tal qual a música, é a conotativa, mas, sejamos realistas! Não há nada de conotativo ou figurado nessas mensagens musicais, não há nada de linguagem literária, pois, pela forma como são as danças, a mensagem é tão clara quanto promíscua. São mensagens que em nada dignificam a cultura do nosso país, já que a música também é cultura. E nem sequer vemos a arte que se transmite nessas mensagens que mais promovem a pornografia. Este assunto não incomoda apenas a mim, ainda me lembro das palavras do professor e escritor José Luís Mendonça, numa actividade que se abordava a valorização da cultura. Dizia o professor que se entristece quando encontra crianças dançando as mais tristes músicas do estilo kuduro, com mensagens promíscuas, que ultimamente soam pela nossa sociedade. Ao analisar o número de músicas que, ultimamente, têm promovido o “desestruturamento” social e cultural, a questão que não me quer fugir da mente é: “de quem é a responsabilidade de analisar e avaliar os músicos e suas músicas, antes mesmo de elas deambularem por essa Luanda?
O que presenciamos, nos últimos dias, é uma alienação musical, um declínio cultural. Existe um controle do que vai ou não fazer sucesso. Se somarmos isso ao descaso pela qualidade da música de hoje em dia no nosso país, poderemos observar um declínio cultural. Caso esse declínio cultural ocorra, a educação sofrerá igual impacto.
Alguns kuduristas, principalmente os da new school, precisam entender a relação entre a música e educação. Somente através da educação poderá haver uma significativa evolução no contexto musical e o contexto musical poderá então contribuir de maneira significativa para o aprimoramento educacional do país e assim formaremos um ciclo vicioso de virtude e aprimoramento musical e educacional. Os kuduristas da nova escola precisam de entender que a música é um sistema modelar primário do pensamento humano e uma parte da infraestrutura da vida humana, que ela não é apenas reflexiva, mas também gerativa, tanto como sistema cultural quanto como capacidade humana.
É importante salientar que a arte educa, transforma e conscientiza. A arte é parte do nosso património, da nossa identidade, dos nossos sentimentos como povo, como cultura e como seres humanos. Elementos que não consigo identificar nessas mensagens musicais.
E Já agora, se entre os escritores os livros passam por uma censura, aos críticos literários, quem deve censurar a música? O Ministério da Cultura? Os Críticos Literários? Os próprios cantores entre si? Não sei de quem é a responsabilidade, mas que alguém precisa colocar os pontos nos “i´s” e os traços nos “t´s” de algumas letras musicais que soam por essa cidade de Luanda, sim! E é urgente, antes que ocorra um declínio cultural e a educação se corrompa!