Haja concursos de ciência neste país
Ébonito assistir aos concursos de canto e de dança realizados com pompas e circunstância, geralmente, com uma produção de se lhe tirar o chapéu. Acredito fielmente que os patrocinadores e demais promotores não se têm arrependido do investimento que têm feito. Aplaudimos efusivamente toda a capacidade organizativa e criativa de todo o processo que culmina com a entrega de grandes prémios ao melhor classificado.
Este processo inicia, em geral, com a filtragem dos concorrentes. A priori, as enchentes nos locais de pre-selecção revelam, hipoteticamente, duas coisas: que hámuitoshabilidososnajuventude angolana ou que há um grande interesse pelos prémios anunciados. Os aprovados entre os preselecionados vão enfrentando as fases eliminatórias até chegar-se ou menor número, donde se destaca, então, o felizardo vencedor.
Me questionei diversas vezes se um concurso de ciências, fosse de biologia, de física ou de arquitectura, com prémios tão atractivos quanto os anunciados nos concursos de canto e de dança, teria a mesma moldura humana nos locais de triagem dos aventureiros e dos verdadeiros conhecedores das matérias. E se a adesão fosse baixa, o que significaria? Que há muitos jovens universitários mas poucos estudiosos? Ou que ciência não algo que interesse mito aos angolanos?
Pensemos, a guisa de exemplo, na repercussão dum concurso de conjugação verbal, que como prémio tivesse uma grande viatura, uma residência num bom condomínio, uma soma monetária orçada em alguns milhões de kwanzas, para não falar numa bolsa de estudo nas melhores instituições universitárias do mundo. Posso crer que o valor do prémio ditaria a importância que se dá a esta temática nesta sociedade.
A conjugação dos verbos é matéria importante em todos os níveis académicos, para todos os grupos etários, em todos os grupos sociais. Conjugar correctamente os verbos é virtuoso, lindo de ver e de extrema importância no dia-a-dia dos nossos actos comunicacionais. Entretanto, quantos estudantes não viram os olhos quando se quer falar de subjuntivo?!
Um concurso bem organizado, com todo o aparato de meios tecnológicos que a nossa imprensa sabe levar para dar cobertura a grandes eventos, sobre tudo com a elevação dos prémios – porque toda a riqueza dos aspectos organizativos, culturais e de produção perdem expressão se os prémios não forem de grande valor – pode mudar a forma como a sociedade olha para o estudo da língua portuguesa e da conjugação verbal, em particular.
Não disponho de dados bastantes para afirmar que os prémios dos concursos de canto, de dança, e ainda pior, os de sorte, são motivadores ou incentivadores do “lucro fácil” ou um indicador daquilo que certa classe imputa como de maior importância.
Da mesma forma como um grande número de estudante foi estudar um curso ligado às actividades mais bem pagas e não as que mais importantes resultados dariam ao país, como as engenharias, por exemplo, assim também os concursos dão uma indicação do que é tido por valioso. Assim, se concurso de canto premeia um carro e olimpíadas de matemática só oferece um fim-de-semana numa unidade hoteleira, fica claro o que é que se quer levar o povo a valorizar.
Paraquandodar-se-ãoprémios mais motivadores aos vencedores dos concursos académico-científicos? A propósito, que concursos académicos são feitos neste país? Que órgãos de comunicação social dão grande cobertura às “competições” académicas?
É ponto assente que é importante massificar o turismo interno, motivar gente a conhecer Angola que é um país grande e belo. Logo, um prémio chorudo para quem conhece os monumentos e sítios seria uma bela forma de motivar. Mas um concurso desses a premiar com cinquenta mil kwanzas, a ninguém motiva. Tanto menos motivador seria um prémio equivalente para o vencedor dum concurso de matemática.
E não queiramos pensar que concursos académicos só devem ser organizados por instituições académicas. Os mesmos que fazem os espectáculos dos grandes concursos de canto e de dança podem também enveredar para este lado. Estou convicto que patrocínios e apoios conseguem-se.
A população que o país tem precisa urgentemente de ser levada a olhar ao detalhe para a importância do saber, do conhecimento, da ciência, da academia. E há cidadãos com alto poder de influência neste país. Fica-lhes mesmo bem assumir a dianteira nestas iniciativas.
Particularmente no que toca à conjugação verbal, há famosos que demonstram grandes debilidades. Mas são eles os ditos fazedores de opinião. É oportuno que os mais habilitados iniciem a luta contra as futilidades das letras das músicas que fazem sucesso, contra o linguajar de baixo calão ou vocabulário. E os concursos (bem premiados) são um bom exercício neste sentido.
Em tempo de paz, é oportuno mobilizar CONCURSOS ACADÉMICOS E massificar A LUTA “ANTI SUPÉRFLUO”.