OPais (Angola)

“Não somos tidos nem achados no Progresso”

- Texto: Sebastião Félix Fotos: Lito Cahongolo

l Salviano Ferreira Magalhães, co-fundador e antigo jogador do Progresso Associação Sambizanga, em entrevista ao jornal O PAÍS, falou do processo que resultou na fundação do clube, aos 17 de Novembro de 1975, tendo à testa Kiferro e outras personalid­ades. Man Tay, como também é conhecido pelos mais próximos, nasceu em 1951, afirmou que antes jogou na Textang, tendo servido o exército colonial português no Leste.

Salviano Ferreira Magalhães, co-fundador e antigo jogador do Progresso Associação Sambizanga, em entrevista ao jornal O PAÍS, falou do processo que resultou na fundação do clube, aos 17 de Novembro de 1975, tendo à testa Kiferro e outras personalid­ades. Man Tay, como também é conhecido pelos mais próximos, nasceu em 1951, afirmou que antes jogou na Textang, depois serviu o exército colonial português no Leste. Assim que regressou a Luanda, foi convidado a fazer parte do “Chuping” Clube, formação que antecede o Progresso, para destronar o Santo Rosa no torneio do Bucavu, no Sambizanga. Como é evidente, Salviano Magalhães falou dos momentos menos bons que o clube viveu durante o 27 de Maio de 1977, bem como do desapareci­mento físico de Kiferro e de Ginguma, antigos jogadores daquela formação

OO nde é que surgiu a ideia para a criação do Progresso Associação Sambizanga? Progresso surgiu em 1975, no período da Independên­cia para quebrarmos a hegemonia que o Santo Rosa tinha, num torneio de futebol no Bucavu, aqui mesmo no bairro. O Kiferro teve a ideia de fundar o clube. Nessa altura, estava no Leste, era tropa no exército português. No meu regresso, encontro o torneio e sou convidado pelos meus antigos colegas da Textang. Eles tinham um clube com o nome de “Chuping”, porque depois do jogo iam tomar alguns copitos. Então, durante o torneio, fui o melhor marcador do nosso clube, mas a jogar defesa central no futebol salão de sete e daí não larguei mais a posição, porque eu era médio ofensivo.

Nesse período a hegemonia do Santo Rosa foi quebrada?

Assim que baptizamos o clube com o nome de Progresso Associação Sambizanga, vencemos pela primeira vez o torneio do Bucavu e não houve um outro a seguir. Depois apareceu o Camarada Rui de Jesus, tinha o seu barco de pesca na Ilha de Luanda e por ter nascido no Sambizanga, sugeriu que se formasse um clube de verdade, porque o futebol de sete era só para passar tempo e com o seu apoio e a voz de outros mais velhos criamos a equipa que existe até hoje.

Houve alguma discussão em relação ao nome do clube?

Houve discussão em relação ao nome. Mas, o Kiferro pediu um ponto de ordem, entrou para o seu quarto e quando saiu disse “já arranjei o nome e fica Progresso Associação Sambizanga. Ele justificou que era um clube de todos que nasceram naquela zona, não importava o bairro”. O Kiferro era muito inteligent­e! Só jogou uma época no Progresso. E no dia 17 Novembro de 1975 foi fundado o clube.

O apoio era somente do Camarada Rui de Jesus ou havia outros?

Na altura, o Camarada Rui de Jesus é que apoiava. Antes não havia contratos. Só queríamos aparecer no mundo do desporto. O camarada Rui de Jesus foi aguentando todas as despesas do clube e depois surgiu o 27 de Maio de 1977.

O que foi o 27 de Maio de 1977 para o Progresso e alguns atletas?

Muitos atletas desistiram por causa dessa confusão. Eu e o Praia tivemos a obrigação de recrutar atletas de clubes do bairro para darmos vida ao Progresso, porque já ninguém queria jogar no Progresso. O Havemos de Voltar foi um dos clubes.

Quais foram as razões?

Falou-se que dois ou três elementos do Progresso participar­am na intentona. Na manifestaç­ão que o povo fez, mas o Ginguma, que até era trabalhado­r das Relações Exteriores, emprestou o carro do serviço a um amigo, esse amigo foi para lá, no entanto fizeram uma foto no carro e, lá, alegaram que era o Ginguma, no fundo não era ele.

E quem era?

Era um jovem chamado Zeca ou Zé que morava mesmo aí nos lados do campo do Bucavu, sabe-se que era filho de um cabo-verdiano. Foi ele quem levou o carro à manifestaç­ão. Depois disso, o Ginguma foi preso e desaparece­u fisicament­e.

E o Kiferro?

Como era militar, foi um dos primeiros a ser preso e também desaparece­u fisicament­e, mas foi muito corajoso. Perguntara­m-lhe sobre as pessoas, no Progresso, que participar­am no fraccionis­mo, ele falou que do Luís Cão ao último suplente ninguém tinha alguma coisa a ver com o movimento.

Falou-se que depois surgiu uma “mão invisível” para salvar o Progresso. Isso foi apenas um boato ou é verdade?

Depois dessas confusões, o Progresso ficou parado, mas apareceram o camarada Brito Sozinho e o camarada José Eduardo dos Santos, o ex-Presidente da República, na altura era ministro das Relações Exteriores. Eles ouviram que o Progresso ia acabar como clube. Depois de alguns dias, o camarada José Eduardo mandou um recado com o camarada Brito Sozinho a avisar que se os miúdos acabarem com o clube é que irão mesmo presos. Foi assim que recrutamos novos miúdos para dar vida ao Progresso. Continuamo­s a trabalhar, mas fui chamado pelo camarada Nicolau da Silva, presidente da Associação Provincial de Futebol de Luanda à época. Ele disse-me

“O Rui Mingas também mandou um emissário para ver se acabássemo­s com o clube, mas deu em nada. Resistimos”

que tínhamos de acabar com o clube. Eu respondi que o Progresso não era de militares e que não participou numa intentona, deste modo é preferível acabarem com os homens que jogam no Progresso. O Rui Mingas também mandou um emissário para ver se acabássemo­s com o clube, mas deu em nada. Resistimos. Depois do “bafo” do camarada Brito Sozinho, tivemos mais ânimo. Mas, passamos mal, porque as equipas de Luanda não queriam jogar connosco, nos acusavam de fraccionis­tas.

Quanto tempo durou essa fase?

Foram meses. No ano seguinte, os Perdidos aceitam fazer um jogo com o Progresso. Até o Bangu, nosso vizinho, negou fazer uma partida connosco no campo da Académica. Com os Perdidos, ganhamos por 5-2, com os novos atletas e mais jovens. O resultado deixou algumas pessoas admiradas e diziam que o Progresso afinal ainda está em vida. Foi assim que o Progresso reapareceu, sendo que o Bangu depois aceitou jogar frente ao Progresso e perdeu 3-0. O mesmo aconteceu com o Sporting de Luanda, que nos convidou para o torneio em alusão ao aniversári­o deles, nos Coqueiros.

Na sede do Progresso existe algum lugar para homenagear as figuras que fundaram o clube?

Eu até vou rir-me da sua pergunta. Não somos tidos e nem achados no Progresso. É verdade!

Porquê?

Não sei. Em tempos, vários alunos visitaram o clube para saber sobre a sua história. Os dirigentes não sabiam o que falar do Progresso. Foram buscar-me em casa e falei sobre a história do Progresso.

Onde é que está a falha?

A falha é da própria direcção. Esses jovens que treinam aqui não sabem quem são os fundadores do Progresso. Não há uma política, aqui, para se narrar a história do clube. É falha das direcções que apareceram depois do 27 de Maio de 1997. Esta sede devia estar pintada com as nossas “figuras” como antigos praticante­s. No interior da sede não há nenhuma fotografia nossa.

Está a dizer que a direcção do clube não tem arquivos?

Esta pergunta devia ser feita aos dirigentes do clube. Risos. Na sede, não há nenhuma foto do Kiferro, Ginguma, Salviano, Augusto Pedro, Santinho e outros, não há!

Como foi a vossa primeira participaç­ão no Girabola que começou em 1979?

Nesse ano, ficamos em quarto lugar. Um ano antes, fomos para o Brasil, onde jogamos no Estádio do Maracanã, penso que fomos a primeira equipa africana a pisar naquele belo estádio, antes da minha “convocatór­ia” para a Selecção Nacional para o jogo entre Angola e Cuba. O Praia, o Santinho e o Jaime também foram convocados.

E o Santo António?

O Santo António fez parte da equipa do Progresso mais tarde. Fomos buscá-lo no clube “JMPLA”, sendo que também vieram o Matateu, o Zezinho, Eduardo André e outros. E foi nesse período que saiu o camarada Rui de Jesus e entrou o camarada Brito Sozinho como presidente do clube. Fui eu quem aconselhou Santo António a ir para o Petro.

A saída do camarada Rui de Jesus gerou polémica?

Ficamos tristes, mas a situação ficou ultrapassa­da. Foi o homem que deu vida ao Progresso. O clube é o Rui de Jesus, porque o Progresso só foi fundado para o futebol de sete. Foi o camarada Rui de Jesus que veio com a proposta de futebol onze e ninguém fala dele.

Onde anda o camarada Rui de Jesus?

Ainda vive, mas no Tômbwa, na província do Namibe, onde continua a exercer a sua actividade, a pesca.

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