Executivo “ensaia autarquias”, enquanto oposição “apega-se” à conclusão do pacote legislativo
ainda não disponha de um horizonte temporal concreto com vista a realização de eleições autárquicas, muito por conta da não conclusão do pacote legislativo, que está em discussão na Assembleia Nacional, o Executivo vem desconcentrando uma série de serviços de âmbito central para o local, bem como se tem desdobrado na construção de um conjunto de unidades e edifícios autárquicos em várias províncias, o que revela um suposto ensaio para as autarquias
Atransferência, esta semana, para o Governo provincial de Luanda (GPL) de várias estruturas de gestão territorial e urbana, meios técnicos e humanos que estavam concentrados nos órgãos centrais, está a ser entendida por políticos e organizações da sociedade civil como parte de um conjunto de acções de um suposto ensaio que o Governo de João Lourenço está a implementar para a preparação da realização das eleições autárquicas.
Embora o país ainda não disponha de um horizonte temporal concreto com vista à realização de eleições autárquicas, muito por conta da não conclusão do pacote legislativo, que está em discussão na Assembleia Nacional, o Executivo vem desconcentrando uma série de serviços de âmbito central para o local, bem como se tem desdobrado na construção de um conjunto de unidades e edifícios autárquicos em várias províncias, o que revela um suposto ensaio para as autarquias.
No entanto, a par do acto de transferência de várias estruturas de gestão territorial e urbana da competência central para o local, Benguela, Luanda, Cuando Cubango, Lunda-Norte, Lunda-Sul e Cunene constam de um conjunto de províncias que, desde o ano passado, estão a ser erguidas uma série de unidades autárquicas.
Em muitos casos, o financiamento destas obras provém do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), que é igualmente outro dos instrumentos criados pelo Executivo central no âmbito da desconcentração do poder e a alocação de competências a nível local para a construção e reparação de uma série de projectos.
No Cunene, por exemplo, o PIIM financiou a construção das Assembleias Municipais Autárquicas de Cahama e Ombadja, que iniciate ram em Janeiro deste ano, no quadro da criação das condições gerais para a implementação das autarquias no país.
A obra da assembleia autárquica da Cahama ficou orçado em 173 milhões, 663 mil e 725 Kwanzas e será construída em seis meses. Já a de Ombadja vai custar 168 milhões, 908 mil e 405 Kwanzas e será erguida em oito meses.
Por sua vez, o edifício administrativo autárquico do município de Saurimo, província da Lunda-Sul, cujo lançamento da primeira pedra para construção deu-se igualmenem Janeiro último, ficou orçado em quatro mil milhões e 818 milhões de Kwanzas.
A província vizinha da LundaNorte, no município de Caungula, ganha, dentro de um ano e meio, um edifício administrativo autárquico, que será construído numa área de 200 metros quadrados, que custou aos cofres do Estado cerca de mil milhões, 140 milhões e 720 mil Kwanzas, enquanto, no Cuando Cubango, as obras de construção das infra-estruturas administrativas para a futura autarquia de Menongue ficou orçada em cerca de três mil milhões de Kwanzas, no âmbito do PIIM.
Na transferência de poderes desta semana, foram transferidos para o controlo do Governo Provincial de Luanda, que posteriormente passará para as respectivas administrações municipais, competências, meios técnicos e humanos dos extintos Gabinete de Desenvolvimento e Aproveitamento Hidráulico do Kikuxi (GADAHKI), o
Gabinete Técnico de Reconversão Urbana do Cazenga (GTRUC) e as Reservas Desanexadas do Perímetro de intervenção da Zona Económica Especial Luanda-Bengo, EP, até então superintendidas pelos ministérios da Agricultura e Pescas, das Obras Públicas e Ordenamento do Território e da Economia e Planeamento, cuja acção incidia sobre os municípios de Viana, Cacuaco e Cazenga.
Para a especialista em políticas públicas, Cecília Kitombe, estas transferências podem ser compreendidas como um ensaio das futuras autarquias. Mas, defende, é preciso ser efectivada a acção e alargada para a participação dos cidadãos a nível local.
“Elas podem ser consideradas no âmbito do reforço do poder local, caso a transferência fosse feita directamente às administrações municipais e à população dos referidos municípios pudesse beneficiar em primeira instância desses equipamentos, mas na realidade não são equipamentos já com uma certa orientação metodológica e de recursos humanos”, frisou.
Transferir capacidades para a melhoria da governação local
Cecília Kitombe disse ainda ser necessário que os governos provinciais e as administrações mu
“Feito o acto de transferência de poderes, o grupo técnico que conduziu o processo vai continuar a monitorar a sua execução”
Márcio Daniel
“Agora é preciso que a Assembleia Nacional também faça questão de fechar o pacote legislativo o mais breve possível”
Zeferino Kuvingua
“Um país, como o nosso, onde o poder sempre foi centralizado, a descentralização exige acompanhamento e capacitação”
Cecília Kitombe
“
Quando as autárquicas forem instituídas, nós vamos ter, ao nível dos municípios, instituições ligadas ao poder de Estado que vão ter dependência do poder central” Nelito Ekuikui
nicipais gozem de forma descentralizada de serviços públicos, principalmente aqueles que devem ser de grande relevância para as comunidades locais.
Por outro lado, entende que a transferência de competências deve garantir não só que a estrutura central transfira equipamentos sociais ou económicos à administração local do Estado, mas que esta possa transferir recursos como capacidades, conhecimentos, recursos humanos, técnicos e financeiros de modo a que os governos provinciais e municipais consigam desenvolver acções significativas no âmbito da melhoria da governação local e bem-estar das comunidades. Conforme explicou, as transferências de competências devem estar suficientemente alicerçadas num diálogo permanente entre as diferentes estruturas (central e local), para que a partilha de responsabilidades e as novas demandas locais sejam suficientemente compreendidas entre as partes.
“É preciso que ocorra uma efectiva transferência de competências para consolidar o processo de desburocratização do Estado e melhoria na relação de confiança entre as instituições públicas e os cidadãos”, defendeu.
CASA-CE: Preparação sem fixação de data
Por seu lado, o secretário provincial da CASA-CE em Benguela, Zeferino Kuvingua, disse que há mais de dois anos que o Executivo vem dando sinal de ensaiar as autarquias mediante a transferência de poderes de âmbito central para local.
No seu entender, quer a questão da transferência de poderes desta semana da competência central para o local bem como a construção de edifícios e empreendimentos autárquicos revelam uma certa preparação, mas, frisou, peca por não se ter, até ao momento, uma data efectiva para a realização das primeiras eleições autárquicas em Angola.
“O pacote legislativo ainda não está definido, mas estamos a ver acções que são princípios para a realização das autarquias. Agora é preciso que a Assembleia Nacional também faça questão de fechar o pacote legislativo o mais breve possível”, referiu.
Mera desconcentração administrativa
Já a UNITA, por via do seu primeiro secretário de Luanda, Nelito Ekuikui, disse que as transferências de poderes bem como a construção das referidas unidades autárquicas em curso em várias províncias não podem ser entendidas como ensaios para as autarquias.
Na sua opinião, trata-se apenas de uma mera desconcentração administrativa, pelo que não tem nada a ver nem deve ser entendida como ensaio para a realização das autarquias.
“Mesmo quando as autárquicas forem instituídas, nós vamos ter, ao nível dos municípios, instituições ligadas ao poder de Estado que vão ter dependência do poder central”, frisou.
Para Nelito Ekuikui, mais do que qualquer interpretação que se possa fazer das acções do Governo, no âmbito deste processo de transferência de competências, é preciso que se institucionalizem as autarquias no país, tendo sempre como princípio a aprovação do pacote legislativo autárquico.
Fiscalização é preciso
Noutra abordagem, o secretário de Estado para a Administração Local e Reforma do Estado, Márcio Daniel, garantiu que, feito o acto de transferência de poderes desta semana, o grupo técnico que conduziu o processo até a assinatura dos termos de transferência de competências vai continuar a monitorar a sua execução.
Conforme explicou, uma equipa que integra secretários de Estado
do ministério da Administração do Território e Reforma do Estado( MATRE); das Finanças; da Agricultura e Pescas, técnicos do Governo Provincial de Luanda, entre outros, vai continuar a acompanhar, na prática, a execução dos termos de transferência que foram assinados. Por seu lado, a especialista em políticas públicas, Cecília Kitombe, disse ser preciso que o Estado, através das diferentes instituições fiscalizadoras e de acompanhamento, como o MATRE, Finanças, Assembleia Nacional e o Tribunal de Contas, monitorem estas instituições, para que os propósitos sejam alcançados.
“Um país, como o nosso, onde o poder sempre foi centralizado, a descentralização exige acompanhamento e capacitação para que estas administrações locais do Estado ganhem de facto autonomia na gestão de processos e equipamentos que outrora pertenciam a estrutura central do Estado”, frisou.