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Miguel Bastos Araújo Realista não pessimista
É dos especialistas em biodiversidade mais respeitados internacionalmente. Dirige o Museu de Ciências Naturais de Madrid. Os prémios que recebeu, como o Pessoa, são prova de talento e reconhecimento.
Miguel Bastos Araújo tem 49 anos, nasceu na Bélgica – onde o pai era exilado político –, estudou na Escócia e em Inglaterra, foi professor na Grã-bretanha e na Dinamarca, dá aulas em Portugal e é diretor de um dos mais conceituados museus de Espanha. Cientista especializado no impacto das alterações climáticas na biodiversidade, fez história ao tornar-se o primeiro Prémio Pessoa ligado ao Ambiente, em 2018. O que o honrou, mas não lhe subiu à cabeça como perdição, garante. Como também não lhe dominaram o ego outras distinções que recebeu, como o Prémio Nacional de Ambiente Fernando Pereira, da Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente, em 2019.
“Tenho uma bagagem filosófica e um conhecimento de mim próprio e dos objetivos que persigo suficientemente sólidos para gerir a exposição mediática de um prémio sem que isso afete a essência de quem sou e do que faço”, assegura. A curiosidade surgiu cedo, em criança. Foi o princípio de tudo, da vida inteira que Miguel Bastos Araújo tem dedicado à ciência. “A biodiversidade interessou-me mesmo antes de o termo ter sido inventado. Fui fortemente influenciado pelo meu avô materno, através do relato das suas experiências em África, e pelo meu pai, que me introduziu à observação da natureza”, recorda.
Hoje, é diretor do Museu de História Natural de
Madrid (Espanha). Corolário de um trajeto com imenso para contar e de um empenho profissional que classifica como intenso. “É praticamente impossível alguém destacar-se num trabalho científico sem um grau de dedicação a roçar o obsessivo.
Um investigador que não esteja disponível para este nível de investimento pessoal fará melhor escolher outra profissão”, atira. “Os resultados e o impacto da sua investigação demorarão anos, por vezes décadas, a materializar-se e existe o risco de que nunca se materializem. Não é para todos”, detalha. Na capital espanhola, Miguel Bastos Araújo pretende deixar marca. “Quero consolidar o Museu de Ciências Naturais de Madrid como centro de formação científica em biodiversidade”, admite.
Em Portugal, Miguel Bastos Araújo dá aulas na Universidade de Évora, onde ministra a Cátedra Rui Nabeiro, financiada pelo líder do grupo Delta, a primeira de sempre com dinheiros privados numa instituição pública de ensino. “É uma tradição anglo-saxónica que, até ver, tem sido pobremente implementada em Portugal. Um dos grandes problemas nacionais é o fraco investimento privado, além de termos uma burocracia paralisante e um sistema de financiamento público para a investigação imprevisível”, entristece-se Miguel Bastos Araújo, o cientista que, apesar de tudo, recusa o desalento: “Considero-me realista mas não pessimista. Face à iminente catástrofe civilizacional e ambiental que estamos a forjar, o pessimismo é a pior receita possível”.