Pesquisadores resistem um ano após incêndio no Museu Nacional
Professores e técnicos incluem busca pelo acervo nos escombros do palácio na rotina de aulas
RIO DE JANEIRO No último ano, uma pergunta rondou os funcionários do Museu Nacional, no Rio: se pegou fogo em tudo, ainda há o que fazer? A resposta, no começo esfumaçada pelo luto, foi se tornando cada vez mais clara.
“Aprendemos que a máquina não pode parar”, diz a historiadora Regina Dantas, 56. “Sabe aquela história de ‘ninguém solta a mão de ninguém’? Foi cada um fazendo a sua parte e, quando vimos, estava todo o mundo trabalhando junto.”
Aulas, pesquisas e orientações continuam na rotina dos cerca de 90 professores e técnicos da instituição, dos quais em torno de dez agora dividem o tempo com as buscas pelo acervo perdido nos escombros.
O que não significa que as lágrimas já podem ser contidas quando lembram daquela noite de domingo, em 2 de setembro de 2018.
Também não esconde as dificuldades de se trabalhar em laboratórios emprestados de outras áreas, muitas vezes com falta de verba e material adequado.
Até junho, haviam sido contabilizados 5.000 achados, entre fragmentos de itens e objetos do dia a dia, ainda sem análise do quanto isso representa do acervo. “Muita coisa se salvou, eu diria que 15% das peças de cada coleção estão inteiras, entre cerâmicas e bronzes. Mas muitas perderam coloração, se deformaram, partiram”, diz a arqueóloga Angela Buarque, com 67 anos de idade e 45 trabalhando.
A longa experiência em escavações e um conhecimento profundo da reserva técnica de arqueologia da instituição --pela qual ela era responsável havia anos-- a fizeram ser chamada três dias depois do incêndio para integrar a equipe de resgate do acervo no palácio.
Mudança
Para Regina, que passou boa parte da vida acadêmica estudando o palácio, agora existe uma nova história a ser contada. “O incêndio está me mostrando marcas do Dom João, imperador que quase nem cito na minha dissertação sobre o cotidiano na casa. Agora estamos vendo um outro palácio.”
Ela se refere, por exemplo, a camadas de tinta nas paredes que eram invisíveis antes da tragédia. Com o fogo, essas novas informações emergiram e já começam a ser observadas por pesquisadores de arquitetura.
“Nos projetos de TCC e mestrado dos alunos, vamos continuar estudando o que já existiu, sem ignorar o incêndio. E contar uma nova história, que é o que o palácio está mostrando para a gente.” (Folha)