Agora

‘Hoje, está todo mundo com medo de falar, todo mundo calado’, diz

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O passado de Elza Soares hoje não passa de uma sombra. Dos tempos de samba e de contratos restritivo­s com grandes gravadoras, ela lembra da pouca liberdade. “Não tinha escolha. Precisava de um emprego.”

Sobre o processo de revisitar as memórias para sua recente biografia, escrita por Zeca Camargo, ela rejeita completame­nte a nostalgia. “Saudades do que? Da fome?”.

Não é difícil de entender. Elza foi mãe aos 13 anos, perdeu um dos filhos para a fome aos 15 e viu ainda as mortes de outros dois, além da de Garrincha, seu marido. A relação com o lendário jogador também teve momentos conturbado­s.

Por isso tudo, Elza não se sente confortáve­l para falar do passado. Ela não comenta o uso de drogas e nem gosta de lembrar dos proble

Umas com a ditadura, nos anos 1970.

A essa altura da vida —não confirma a idade, mas já passou dos 80—, Elza carrega o status de mito na música brasileira e de ícone dos movimentos negro e feminista.

Quando lançou “A Mulher do Fim do Mundo”, contudo, ela recebeu críticas pela falta de mulheres nos bastidores do álbum.

“Ah, deixa o pessoal reclamar. Inclusive, sinto falta disso. Botaram Lexotan na água do povo. Está todo mundo calado”, diz, ríspida. “Nos anos 1960, eu via muita gente na rua. Chico, Caetano, aquelas composiçõe­s fortes. Sofreram, claro, por toda a rebeldia. Mas, hoje, está todo mundo com medo de falar. É por isso que uso minha voz, para falar o que se cala.” Em “Libertação”, single de “Planeta Fome” com participaç­ão do Baianasyst­em, Elza se apresenta como inimiga do fim, repetindo que não vai sucumbir com a voz rouca e resistente. A sensação é de que não há idade avançada ou dificuldad­e de mobilidade que possam cessar a fome insaciável da artista. “Vozona não sou”, diz. “Você não vai me ver de chinelinho, mas sim de calça jeans rasgada, camisetona. O Brasil está doente, mas estou avançando.” (Folha)

O jornalista viajou a convite da gravadora

Nos anos 1960, eu via muita gente na rua. Chico, Caetano, aquelas composiçõe­s fortes. Sofreram por toda a rebeldia. Por isso [hoje] uso minha voz Elza Soares

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Felipe Panfili/bienal do Livro Rio Elza e Zeca Camargo, jornalista que escreveu biografia da cantora

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