Ciclo encerrado
Andrés Sanchez planeja licença antes do fim do mandato e tenta último ato para sair por cima
A pouco mais de dois meses do fim do mandato de presidente do Corinthians, Andrés Navarro Sanchez, 56 anos, deveria ter dias mais tranquilos. Ele enfim anunciou, no último dia 1º, o fechamento do acordo para os naming rights do estádio, agora chamado de Neo Química Arena.
A negociação de R$ 300 milhões parcelados em 20 anos pode ser a chave para resolver a dívida com a Caixa pelo financiamento da obra. O banco cobra R$ 550 milhões. Para Andrés, o valor devido é de R$ 450 milhões. Esse é o último nó que ele pretende desatar antes da eleição marcada para 28 de novembro.
Mas não há felicidade visível no ambiente, o que condiz com sua tese de que mesmo os melhores momentos na presidência duram pouco. “Quando o time ganha um título, a alegria é indescritível por 24 horas. Depois volta tudo ao normal”, define.
O presidente sabe que a equipe não será campeã brasileira e, ao constatar isso, ironiza os que estão mais preocupados com o balanço financeiro do clube do que com os resultados em campo. Ele ainda se incomoda com as críticas ao resultado de 2019: déficit de R$ 177 milhões.
“Talvez sejamos o 10º do Brasileiro, mas vamos ser número 1 de balanço”, diz.
Desde fevereiro de 2018, mais de 30 jogadores foram contratados pelo Corinthians. Alguns custaram caro e não deram o retorno esperado. O dinheiro gasto em reforços pouco produtivos e a aposta em técnicos menos rodados, como Osmar Loss, Jair Ventura e Tiago Nunes, fizeram a pressão da torcida e da oposição aumentarem ainda mais sobre o presidente.
Andrés defende que o problema no Corinthians não é a despesa. A questão seria aumentar a receita. Há duas semanas, o clube pagou três meses de salários atrasados ao elenco.
Há também o componente político. Se eleger Duilio Monteiro Alves no pleito, o mesmo grupo político se garantirá no poder por pelo menos 16 anos. Começou em 2007, com a eleição de Sanchez, e iria até 2023.
“A transparência existe. As portas da minha sala estão abertas. Eu mostro todos os documentos a qualquer conselheiro que vier aqui”, defende-se Andrés.
Sempre há gente na recepção à sua espera: o conselheiro que deseja discutir as finanças, os empresários de jogadores e até o sócio revoltado porque o preço da cerveja no bar aumentou dez centavos. Também podem ser ex-atletas e integrantes da diretoria.
O que lhe dá ânimo é saber que isso tudo está para acabar. São 27 anos consecutivos como diretor, assessor, presidente ou figura influente da diretoria. Período iniciado em 1993, nas categorias de base.
“Meu ciclo no Corinthians acabou. Eu me sinto realizado, mas este mandato atual foi de tanta decepção que não quero mais. Prometi isso para a minha filha [Marina, 22]”, declara ele, pai também de Luca, 26.
Os três mandatos como presidente (dois de 2007 a 2011 e mais um desde 2018) são mais do que a criança Andrés Sanchez sonhou quando, aos 10 anos, jurou para a mãe, Josefa Navarro, que um dia seria diretor do Corinthians. Foi o clube em que viveu alguns dos melhores dias de sua vida, com as vitórias em campo. Dentro dele também teve um dos piores de todos, menos dolorido apenas que a morte dos pais: o rebaixamento para a Série B em 2007. Ele assumiu o cargo antes das sete rodadas finais.
“Tive de suportar o que poucas pessoas pessoas suportariam. Quando chegamos ao clube [após a queda] cuspiram na minha cara, xingaram os meus filhos. Isso é algo que não se apaga nunca.”
Mesmo quando não esteve na presidência, o cartola foi o principal fiador dos sucessores Mario Gobbi e Roberto de Andrade. Andrés se decepcionou com ambos, mas diz ser “mais chegado” a Andrade.
“Eu tenho bronca do pessoal com o qual o Gobbi se aliou. Gente que ele nem sabe, mas que o chamava de ladrão. Eles fizeram bolão para adivinhar quando eu seria preso. Isso é imperdoável. A ganância desses engravatados que não gostam e não frequentam o Corinthians é incrível”, diz.
O dirigente diz que não pretende terminar o mandato em 28 de novembro. Planeja se licenciar após anunciar o acordo com a Caixa. Soa como estratégia para sair por cima, mas a explicação é premiar os vices Edna Murad Hadlik e Alexandre Husni.
Seu estilo direto e para muitos agressivo lhe rendeu inimigos no clube e críticas na imprensa. Ele as considera elitistas. “Passo como prepotente, truculento, mal-educado e não sou nada disso. Eu falo errado mesmo. Mas tenho certeza que sei me comunicar com 100% dos brasileiros.”
Nos próximos meses, para manter seu grupo político no poder, vai fazer o que mais detesta: pedir votos. Seu candidato a presidente é Duilio, que saiu da direção de futebol na semana passada.
“A primeira coisa que vou fazer [quando deixar o cargo] é tirar uns dias de férias. Depois preciso tocar a minha vida”, conclui, antes de acender um cigarro. (Folha)