Ordem de Bolsonaro fez Exército destravar verba para cloroquina
Laboratório ampliou produção com base em movimentações internas; Defesa não comenta
BRASÍLIA O Exército viabilizou recursos públicos para a ampliação da produção de cloroquina dois dias depois de o presidente Jair Bolsonaro determinar ao então ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, o aumento da fabricação da droga.
A aposta num medicamento sem eficácia para Covid-19 contou com o aval do general Edson Leal Pujol, que comandava o Exército naquele momento. O dinheiro foi destravado a partir do DGP (Departamentogeral do Pessoal) quando a unidade era chefiada pelo general Artur Costa Moura.
O general Paulo Sérgio de Oliveira assumiu o DGP após as transferências dos recursos para a produção de cloroquina. Nesta terça-feira (20), Oliveira substituiu Pujol no comando do Exército.
Os repasses se repetiram mais duas vezes, seguindo o mesmo ritual orçamentário e passando pelo mesmo DGP. É o que mostram as três notas de crédito que garantiram os recursos.
O instrumento usado foi a descentralização de recursos, na qual um órgão entrega parte de seu orçamento para outro órgão executar. Nas notas de crédito que registram a descentralização do dinheiro, a unidade emitente é o DGP.
A unidade favorecida é o Laboratório Químico Farmacêutico do Exército. Foi ele que produziu 3,2 milhões de comprimidos de cloroquina para atender a vontade do presidente. O Exército gastou R$ 1,1 milhão em recursos públicos.
A produção é investigada pelo MPF (Ministério Público Federal) e pelo Tribunal de Contas da União e é um dos objetos da CPI da Covid, recém-criada no Senado.
A Procuradoria da República no DF instaurou um inquérito civil para investigar a produção e distribuição de cloroquina pelo governo Bolsonaro. Em 22 de fevereiro deste ano, cobrou explicações do comando do Exército, com base em uma reportagem publicada pela Folha de S.paulo no dia 6 do mesmo mês. A reportagem mostrou que Bolsonaro mobilizou cinco ministérios, estatais, conselhos, Exército e Aeronáutica para distribuir cloroquina aos quatro cantos do país.
O MPF, então, questionou Pujol sobre os órgãos mobilizados e os montantes envolvidos no Exército.
Uma resposta foi fornecida no último dia 1º, com cópias das três notas de crédito existentes para a produção da droga. Ao todo, as três notas de crédito somaram R$ 1,606 milhão. O gasto com cloroquina foi de R$ 1,146 milhão, segundo o Exército. A diferença, de R$ 460 mil, foi usada na produção de álcool em gel.
“Não houve aquisição de insumos para produção do fármaco em epígrafe no ano de 2021, bem como não houve descentralização de recurso para a distribuição de cloroquina, tendo em vista que o laboratório possui estrutura logística montada com contrato em vigor”, afirmou ao Ministério Público Federal o general André Luiz Silveira, comandante da 1ª Região Militar, em ofício assinado no último dia 1º abril.
A reportagem enviou questionamentos ao Exército e ao Ministério da Defesa na segunda (19). Não houve resposta até a conclusão desta edição. (Folha)