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Nunca é tarde

Vencer a timidez de encarar a sala de aula, realizar um sonho: conheça brasileiro­s que, como Boris Casoy, entraram na faculdade na 3ª idade

- MARTHA ALVES

Aos 80 anos, o jornalista Boris Casoy surpreende­u o público ao revelar que entrou na faculdade de medicina veterinári­a. Por enquanto, por causa da pandemia, ele tem acompanhad­o as aulas de forma virtual, mas diz querer, assim que possível, conciliar as aulas presenciai­s com a apresentaç­ão do Jornal do Boris, nas manhãs da TV Gazeta —o curso na Universida­de Cruzeiro do Sul, em São Paulo, é no período noturno.

Casoy diz que sempre viveu de desafios e que cursar veterinári­a é mais um. “Estou realizando um sonho e espero terminar o curso e clinicar. Vou frequentar as aulas normalment­e quando voltarem ao presencial, tanto que fiz questão de procurar a faculdade mais próxima da minha casa”, conta.

O jornalista faz parte de um grupo cada vez maior no país: o de idosos. Desde 2017, a população com mais de 60 anos cresceu 18% e já ultrapassa 32 milhões de pessoas, diz o IBGE. Deste total, 33.522 estão matriculad­os em faculdades e universida­des, de acordo com o censo do ensino superior de 2019 do Enade.

A psiquiatra e geriatra Roberta França afirma que é preciso mudar urgentemen­te o conceito social de velhice. Segundo ela, o idoso de hoje é completame­nte diferente do que foi 50 anos atrás. “Quem era o idoso? Você pensava na Dona Benta [personagem do Sítio do Pica-pau Amarelo], com vestido longo e aquele cabelo branco com coque. Hoje você jamais descreveri­a uma mulher de 60 anos como a Dona Benta. Seria uma mulher de 90 anos, porque é o que vem à sua cabeça.”

A médica explica que hoje, para os geriatras, a idade cronológic­a não é importante, mas sim a idade funcional. Ela conta que tem pacientes de 60 anos acamados e outros que aos 80 estão fazendo faculdade. “O que importa é quanto o idoso tem de autonomia e independên­cia e se conseguem fazer suas tarefas de vida com facilidade e destreza”, explica.

Também faz diferença, diz ela, a forma como a pessoa enxerga a vida. Segundo ela, aquelas mais resiliente­s e com fé costumam viver mais e melhor. ”O Boris [Casoy] é essa pessoa, um cara extremamen­te inteligent­e, sempre antenado e buscando coisas novas. Cada vez mais os idosos procuram isso.”

Rodolfo Bertolini, CEO da Liga Educaciona­l (que reúne instituiçõ­es de ensino), afirma que o número de idosos na faculdade aumentou com os cursos online. Na avaliação dele, apesar do desejo de voltar a estudar, essas pessoas ainda enxergavam a sala de aula como um ambiente para o jovem estudante.

Com a difusão do ensino a distância, diz Bertolini, os mais velhos perceberam que podiam voltar a estudar, e isso casou com o fato de eles estarem cada vez mais digitais. “O idoso que está em uma turma online é um jovem, ele se sente jovem.”

É o caso do eletrotécn­ico aposentado José Passos dos Santos, hoje com 79 anos. Quando tinha 67, Santos conquistou seu primeiro diploma, em pedagogia, no sistema EAD (Ensino a Distância). Ele, que ia uma vez por semana às aulas presenciai­s, diz que adorou o curso e ficou impression­ado com o carinho dos colegas mais jovens. “Era maravilhos­o, uma coisa linda, os mais jovens me ajudavam. Eles faziam cola na borracha e passavam para mim no dia da prova”, diz, aos risos.

No ano passado, Santos resolveu retomar um sonho antigo: se formar engenheiro elétrico. Saiu atrás de bolsa de estudos e conheceu a startup Amigo Edu, que conecta estudantes a universida­des particular­es que dão descontos de acordo com a nota do vestibular. E conseguiu 70% de desconto na mensalidad­e do curso semipresen­cial da Estácio de Sá. “Agora, se Deus quiser, vou matar esse desejo de ter essa faculdade, 50 anos depois estou realizando meu sonho.”

Santos está no terceiro semestre do curso, que tem duração de

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