Ana Maria

Sempre seremos seis

- Por André Romano | Foto Elvis Moreira

Gloria Pires volta à TV sob a alta expectativ­a de viver

Dona Lola, a icônica protagonis­ta de Éramos Seis. A personagem é a estrela principal da obra literária de Maria José Dupré, que ganha sua quinta versão para a

TV, agora como a nova novela das 6 da Globo. À Anamaria, a atriz conta como a história do folhetim

a faz lembrar dos pais nascidos nos anos de 1920 (época em que se passa o folhetim), relembra que, embora tenha vivido momentos difíceis ao lado deles no

passado, nunca perderam a fé e fala, orgulhosa, da família que formou com o marido, Orlando Morais, e os

quatro filhos: Cleo, Antonia, Ana e Bento

Assistiu à versão de 1994 de Éramos Seis, no SBT, com a Irene Ravache no papel da Lola?

Li o livro e ele é bem mais triste e pesado do que a novela. O folhetim tem um lado de humor, romance... Fazer esse personagem é emocionant­e, pois a novela é icônica. Quem viu em 1994 está ansioso para conferir a nova versão. A própria equipe tem uma sensação de honra em participar desse projeto.

O livro original de Maria José Dupré, então, foi uma fonte de inspiração importante?

Sim, pois o livro tem todo o peso dessa época. Claro, não faremos a história pesada. A gente quer uma novela das 6, uma trama bem mais leve – que traga realidade com leveza. O livro é mais dramático.

Como encara a responsabi­lidade de fazer uma personagem tão marcada no imaginário de muitos telespecta­dores?

Procuro não pensar nisso [risos]. Todo mundo quer fazer alguma coisa nova. Então, qual o sentido de buscar o que já foi feito? Nenhum! Até o público que já assistiu às versões anteriores quer ver algo novo. Tanto que a autora [Ângela Chaves] traz algumas tramas que não existiam nas outras versões e dá mais espaço a personagen­s que nas outras versões não apareciam tanto.

Conversou com a Irene Ravache sobre a Lola?

Não… Infelizmen­te, porque a adoro. Não encontro a Irene desde a novela Guerra dos Sexos [2012]. A Nicette Bruno [que viveu a Dona Lola em 1977] esteve conosco no primeiro dia de encontro de toda a equipe. Ela, Osmar Prado e Othon Bastos [intérprete­s de Júlio e de Zeca na versão de 1994] estiveram lá, dando depoimento­s, falando da emoção de rever essa novela, do quão importante foi para a carreira deles. Existe essa aura de amor, emoção... E é tudo que a gente quer para contar essa história: o coração na mão o tempo todo!

Como está construind­o a sua versão da personagem?

A minha Lola é uma mãe que não é boazinha, mas amorosa. Ela procura compreende­r e ajudar os filhos. É também uma esposa dedicada, que honra muito o casamento, a casa. O fato de ter adquirido a casa é um peso enorme para essa família, que fará de tudo para conseguir honrar esse compromiss­o e ter o imóvel no fim da vida. A casa é uma personagem também. A Lola está dentro desse ambiente, onde todos são envolvidos pelo amor, prazer de estarem juntos, mas driblando as dificuldad­es da vida.

A Lola, como era normal à época, é bastante submissa ao marido, não?

Todas as mulheres dessa época eram assim! A vida era muito dura. Elas dependiam do marido... Essa novela enaltece o poder que toda mulher já tinha naturalmen­te. Elas são as grandes mantenedor­as dos lares, das famílias, sempre foram!

E elas continuam tentando manter os seus sonhos vivos?

Os sonhos não morrem nunca. Claro, tem temperamen­tos e temperamen­tos, né? Mas viver sem sonho é um pouco difícil. A novela fala disso. A gente quer mostrar como a vida era dura, de trabalho físico... Não existia toda essa tecnologia. Tudo era mais complicado.

A sua Lola terá um destino tão triste e solitário como na obra original?

Ninguém ousou fazer Éramos Seis como está no livro por ser de uma crueza que a gente termina realmente no chão. A ideia é ter a Lola, a família, a casa e a história como pano de fundo, mas de forma inspirador­a. Que leve as pessoas a acreditare­m nos sonhos, propósitos e se dedicarem a realizar o que desejam.

Como é contracena­r com os jovens atores que fazem os seus filhos?

Eu já conhecia o Xande [Valois, intérprete de Carlinhos] de Babilônia [2014]. Mas o Davi Oliveira, Pedro Sol e Maria Júlia [Maju Lima] eu não conhecia. Estou encantada com eles! Também estou encantada com o Antonio Calloni. É a primeira vez que fazemos um casal e tem sido uma delícia. A Kelzy Ecard também... Eu a admiro há tantos anos e, agora, interpreta­mos melhores amigas. Estou muito feliz.

Você tem um histórico de remakes: Mulheres de Areia, Anjo Mau, Guerra dos Sexos... Encontrou um método para se relacionar com personagen­s tão ‘grandes’?

Adoraria dizer que tenho um método, mas não tenho [risos]. O que trago sempre, não só para remakes, mas para todos os personagen­s, é esse olhar despido, que procura o novo, o frescor. Para mim, novela de época é complicada porque busco trazer leveza. Não quero fazer de forma fixa, rígida… Quero humanidade, algo natural do dia a dia.

Para chegar a isso, você deve estudar muito...

Estudo muito, leio tudo o que eu posso sobre o tema. Nessa novela, os álbuns de família estão sendo meus companheir­os. E isso me emociona. Por exemplo, meus pais nasceram nos anos 20. Me lembro do meu pai [o ator Antônio Carlos], contando os detalhes desse período. E passeando pela cidade cenográfic­a, me lembro das coisas que ele me dizia, identifica­ndo a chapelaria, as sacadas, a postura das moças, os carros... Tudo que ele me contava, agora vejo aqui! A história da novela é sobre o que acontece dentro do íntimo de cada um.

O que a mãezona da novela, lá da década de 20, tem a ver com a mãezona atual?

O que toda mãe tem, né? Claro, ninguém é perfeito nem ninguém tem uma fórmula para seguir. O primeiro filho talvez seja a coisa mais sofrida, pois existe inexperiên­cia. O primeiro filho é a faculdade, a dureza [risos]. A gente aprende a ser mãe junto com aquela primeira criança. Na novela não tem grandes atos heroicos... A não ser os pequeno atos heroicos diários.

A família brasileira mudou muito daquela época para cá?

Claro! É consenso da direção e da equipe trazer o realismo. Queremos fazer uma novela de época que não pareça um álbum de retratos, mas de pessoas reais, que transpiram, onde o cabelo não é impecável. Muita coisa mudou, muita coisa foi acrescenta­da.

O que mudou, por exemplo?

O machismo, o papel da mulher na nossa sociedade...

Como é a sua relação com a costura, profissão da Lola?

A mãe da Lola era viúva e criou as três filhas fazendo doce. Em princípio, a Lola trará esse know-how de fazer os doces pra ganhar dinheiro. Ela costura, faz as roupas dos filhos, faz tricô para vender e colaborar com o orçamento da casa. Eu, Gloria, tenho a maior ligação com a costura, porque a minha mãe fazia coisas pra mim e minha irmã. Então, ela ficava na máquina de costura o tempo inteiro e nós com ela. Adoro essas muitas lembranças. Sei fazer bordado e aprendi tricô para a novela – o que também é uma delícia, já virou um vício. É difícil, mas depois que você pega, é uma loucura, não quer largar! [risos].

Você costura à máquina?

Aprendi a costurar à máquina com a minha mãe. A máquina que usamos na novela não era a que a minha mãe usava. Essa é a de pedal, na qual também aprendi [a trabalhar]. Esse é o maravilhos­o de ser ator, né? A gente tem acesso e aprende tantas coisas... Quando fiz

O Tempo e o Vento, aprendi a fiar.

O papel também é uma homenagem à sua mãe?

Com certeza! À minha mãe e à minha avó, Deolinda, que está aqui comigo, com a pulseira que era dela. [mostra o adorno]. Ela era mãe do meu pai e muito amiga da minha mãe. Elas tinham essa sororidade dos tempos modernos naquela época.

Elas costuravam por gosto?

A minha mãe por gosto. Ela adorava fazer coisas novas e criativas para nós. Os meus pais eram engraçados e criativos! Queriam sempre coisas diferentes. Então, estou voltando ao passado com esse trabalho. Cada vez que leio uma cena, alguma coisa me remete a algo que minha mãe, pai ou avó dizia.

Já chegou a chorar com alguma dessas cenas?

O que a Lola mais faz, coitada, é chorar! [risos] Mas não me emocionei por lembrar da minha família em uma cena em si, mas por todo o ambiente e dureza. Se aproximar dos anos

20, estar perto da realidade das pessoas...

Era uma vida dura. E as pessoas, ainda assim, tinham tanta alegria, esperança. Recentemen­te, duas de suas filhas (Cleo e Antonia Morais) deram entrevista ao Conversa com Bial e muita gente, após o programa, elogiou a educação delas...

Imagine como eu fiquei, né? [orgulhosa].

Como é sua relação com elas?

Elas são motivo de orgulho pra mim. A coragem delas, e a autenticid­ade também. Os haters costumam pegar pesado com a Cleo nas redes sociais, inclusive pelo jeito ‘livre’ de ela viver – críticas às quais ela reage com muita elegância. Mas como você, como mãe, lida com isso? Acho a atitude dela perfeita. A Cleo tem que ser feliz. Acho que todo mundo precisa se encontrar. Nunca tive essa expectativ­a, do que os meus filhos iriam ser... Porque acho difícil encontrar o próprio caminho. Eu aplaudo ela, a Antonia, a Ana e o Bento no que escolherem ser. Apoio total a eles. Eu sou filha de ator [risos]... Artista agora está muito melhor. Agora, por exemplo, a gente tem a Interart Brasil, uma associação de gestão coletiva dos artistas do audiovisua­l. Isso não existia. Antigament­e, nem sequer podia assinar a carteira como artista! Éramos como comerciári­o ou prostituta. A gente não tinha a profissão regulament­ada nem reconhecid­a. Então, eu e minha família tivemos uma vida bastante difícil, sim. Mas sempre com esse olhar para a metade da garrafa cheia. Essa maneira de ver a vida com positivida­de e fé. E não só ver, mas fazer! Suar a camisa e ir em busca do objetivo.

Vê isso na Lola?

Sim. Com todas as dificuldad­es que a família dela passa, a incompreen­são do marido, a frustração dele quando não é reconhecid­o pelo patrão... Enfim, ela lida com esses assuntos de uma forma positiva, como eu via na minha casa. A Lola vai sofrer muito, ficar magoada, mas não perderá o olhar para o futuro, não deixará de buscar uma solução. Éramos Seis fala de sonhos, família, união. Qual a importânci­a de se contar uma história assim no atual cenário social, político, econômico do Brasil? A arte tem a capacidade de fazer a gente pensar, se instruir, aprender com outros hábitos, épocas. A novela tem essa emoção, olho no olho, de estar próximo... Você e seu marido, o cantor Orlando Morais, têm quatro filhos. Mas a Cleo e a Antonia já moram fora. Então vocês não são mais seis. Sentem saudade de quando eram os seis juntos em casa? Quando o Bento nasceu, a Cleo já não morava conosco. Eles têm 22 anos de diferença. Então, nunca fomos os seis na mesma casa. Não o tempo todo, ao menos, só nas férias, Natal... Mas, para mim, sempre seremos seis!

Adotaria um filho hoje?

Sim. Acho bonito isso. Ser mãe é um dos seus melhores projetos?

É do que eu mais gosto!

Você mencionou o impacto que a questão da compra da casa tem no dia a dia da família da Lola. Você ou sua família teve essa dificuldad­e no início da vida, de comprar uma casa, manter uma vida estável?

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A família da vida real: (da esq. para a dir.) Antonia, Cleo, Orlando Morais, Gloria, Ana e Bento
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Calloni e os filhos do casal
na trama, os atores (atrás da esq. para a dir.)
Xande Valois, Pedro Sol, Maria Júlia e (sentado)
Davi Oliveira
Família na ficção: a atriz com Antonio Calloni e os filhos do casal na trama, os atores (atrás da esq. para a dir.) Xande Valois, Pedro Sol, Maria Júlia e (sentado) Davi Oliveira

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